Dizer o Direito

domingo, 27 de abril de 2025

Na multa civil por ato de improbidade administrativa, a correção monetária e os juros de mora incidem a partir da data do ato ímprobo

Imagine a seguinte situação hipotética:

João praticou um ato de improbidade administrativa em 02/02/2022.

O Ministério Público ajuizou ação de improbidade contra ele.

Em 03/03/2023, o juiz prolatou sentença condenando o réu por improbidade.

Na sentença, o magistrado impôs diversas sanções, dentre eles, o pagamento de multa civil, no valor de R$ 250 mil, nos termos do art. 12, I, da Lei nº 8.429/92.

Vale lembrar que a multa civil constitui uma das sanções a que está sujeito o responsável pela prática de ato de improbidade administrativa.

João recorreu, mas a sentença foi mantida e transitou em julgado em 04/04/2025.

 

Durante a fase de cumprimento da sentença, surgiu a seguinte discussão: a partir de qual data deve incidir a correção monetária e os juros de mora sobre essa multa civil? Desde a data do ato de improbidade (02/02/2022)? Desde a condenação (03/03/2023)? Ou desde o trânsito em julgado (04/04/2025)?

O marco é a data em que o ato de improbidade foi praticado:

Na multa civil prevista na Lei 8.429/1992, a correção monetária e os juros de mora devem incidir a partir da data do ato ímprobo, nos termos das Súmulas 43 e 54/STJ.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.942.196-PR, REsp 1.953.046-PR e REsp 1.958.567-PR, Rel. Min. Afrânio Vilela, julgados em 12/3/2025 (Recurso Repetitivo - Tema 1128) (Info 843).

 

Correção monetária

A correção monetária tem como finalidade preservar o poder aquisitivo da moeda ao longo do tempo. Por isso, ela não representa, por si só, qualquer acréscimo (plus) ou decréscimo (minus) no valor da obrigação. Corrigir monetariamente um valor nominal significa, portanto, garantir que ele mantenha seu poder de compra original até o momento do pagamento.

A multa civil possui natureza punitiva. Ela consiste no pagamento de determinada quantia à pessoa jurídica lesada e não se confunde com a reparação do dano ou com a devolução de bens ou valores obtidos ilicitamente pelo agente ímprobo.

Apesar de seu caráter punitivo, a multa civil tem como base de cálculo o proveito econômico auferido, o dano causado ao erário ou ainda o valor da remuneração percebida pelo agente. Em qualquer desses casos, o critério legal para a fixação da multa remete à data da prática do ato de improbidade.

Nesse cenário, é legítimo concluir que a multa civil deve ser corrigida monetariamente desde a data do ato ímprobo. Isso porque, ainda que o valor da multa só seja fixado ao final da ação judicial, aplicar a correção monetária apenas a partir da fixação judicial ou do trânsito em julgado desvirtuaria sua base de cálculo, tornando-a dissociada do dano, do proveito econômico ou da remuneração, todos vinculados à data do ilícito.

Assim, aplica-se à hipótese a Súmula 43 do STJ, que dispõe: “Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo.”

 

Juros de mora

As sanções e o ressarcimento do dano previstos na Lei nº 8.429/1992 inserem-se no âmbito da responsabilidade extracontratual por ato ilícito.

Nos casos de responsabilidade extracontratual, o art. 398 do Código Civil estabelece que:

Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.

 

Por sua vez, o art. 240 do CPC dispõe que:

Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil) .

 

Desse modo, quanto ao pagamento de valores devidos a título de multa civil, aplica-se a Súmula 54 do STJ, segundo a qual: "Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual."

É importante frisar que a alegação de que o devedor não poderia estar em mora antes da fixação judicial do valor devido não afasta a incidência dos juros desde o evento danoso.

Nesse sentido, o STJ firmou entendimento consolidado ao julgar casos relativos a juros de mora sobre indenizações por dano moral, destacando que:

O acertamento do direito à indenização por dano moral e sua quantificação pela via judicial não elide o fato de que a obrigação de indenizar nasce com o dano decorrente da prática do ilícito, momento em que a reparação torna-se exigível. Inteligência dos arts. 186, 927 e 398, todos do Código Civil.

STJ. Corte Especial. EREsp 494.183/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 16/10/2013.


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