Imagine a seguinte situação hipotética:
João, um madeireiro residente no
município de Papanduva, Santa Catarina, foi flagrado pelo batalhão ambiental da
Polícia Militar enquanto derrubava diversas árvores de Araucaria angustifolia,
popularmente conhecida como pinheiro-brasileiro. Essa árvore está na Lista
Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, conforme a Portaria MMA nº
300/2022.
João não tinha licença da
autoridade ambiental competente para derrubar as árvores.
A Polícia Ambiental lavrou um auto de infração e encaminhou
o caso ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MP-SC), que ofereceu
denúncia contra João, perante a Justiça Estadual, imputando-lhe a prática do
crime previsto no art. 38-A c/c. o art. 53, II, “c”, ambos da Lei nº 9.605/1998:
Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou
secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata
Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três)
anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida
à metade.
Art. 53. Nos crimes previstos nesta
Seção, a pena é aumentada de um sexto a um terço se:
(...)
II - o crime é cometido:
(...)
c) contra espécies raras ou ameaçadas
de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no local da infração;
O juízo estadual se declarou incompetente para julgar o
crime sob o argumento de que a espécie atingida consta em lista federal de
espécies ameaçadas. Logo, haveria interesse direto e específico da União, o que
atrai a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, IV, da CF/88:
Art. 109. Aos juízes federais compete
processar e julgar:
(...)
IV - os crimes políticos e as
infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da
União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as
contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
Agiu corretamente o juízo
estadual? De quem é a competência para julgar essa conduta: Justiça Estadual ou
Justiça Federal?
SIM. A competência para julgar o
crime é da Justiça Federal.
No presente caso, o crime
ambiental atingiu espécie de flora que consta na Lista Nacional de Espécies
Ameaçadas de Extinção (Araucariaangustifolia), nos termos da Portaria MMA nº
300/2022 do Ministério do Meio Ambiente.
O STJ já pacificou o entendimento
no sentido de que há interesse da União no julgamento de crimes ambientais que
configurem agressão a espécies de fauna e flora constantes na Lista Nacional de
Espécies Ameaçadas de Extinção. Nesse sentido:
A proteção ao meio ambiente constitui matéria de competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, motivo pelo
qual, para se afirmar ser o delito contra a fauna de competência da Justiça
Federal, é necessário que se revele evidente interesse da União, a teor do
disposto no art. 109, inciso IV, da Constituição Federal.
STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 154.855/SP, Rel. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, julgado em 13/12/2017.
O interesse da União nos crimes de agressão à fauna depende do
envolvimento de animais constantes da Lista Nacional de Espécies da Fauna
Brasileira Ameaçada de Extinção.
STJ. 3ª Seção. CC 159.976/SP, Rel. Min. Antonio Saldanha
Palheiro, DJe de 16/4/2019.
Em suma:
A competência da Justiça Federal para julgar crimes
ambientais é atraída quando a conduta envolve espécies constantes na Lista
Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, configurando interesse da
União.
STJ. 3ª Seção.
AgRg no CC 208.449-SC, Rel. Min. Messod Azulay Neto, julgado em 11/12/2024 (Info
24 - Edição Extraordinária).