Dizer o Direito

terça-feira, 4 de março de 2025

A Justiça Federal é competente para julgar crimes ambientais contra espécies ameaçadas de extinção

Imagine a seguinte situação hipotética:

João, um madeireiro residente no município de Papanduva, Santa Catarina, foi flagrado pelo batalhão ambiental da Polícia Militar enquanto derrubava diversas árvores de Araucaria angustifolia, popularmente conhecida como pinheiro-brasileiro. Essa árvore está na Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, conforme a Portaria MMA nº 300/2022.

João não tinha licença da autoridade ambiental competente para derrubar as árvores.

A Polícia Ambiental lavrou um auto de infração e encaminhou o caso ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MP-SC), que ofereceu denúncia contra João, perante a Justiça Estadual, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 38-A c/c. o art. 53, II, “c”, ambos da Lei nº 9.605/1998:

Art. 38-A.  Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Parágrafo único.  Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.

 

Art. 53. Nos crimes previstos nesta Seção, a pena é aumentada de um sexto a um terço se:

(...)

II - o crime é cometido:

(...)

c) contra espécies raras ou ameaçadas de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no local da infração;

 

O juízo estadual se declarou incompetente para julgar o crime sob o argumento de que a espécie atingida consta em lista federal de espécies ameaçadas. Logo, haveria interesse direto e específico da União, o que atrai a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, IV, da CF/88:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

(...)

IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

 

Agiu corretamente o juízo estadual? De quem é a competência para julgar essa conduta: Justiça Estadual ou Justiça Federal?

SIM. A competência para julgar o crime é da Justiça Federal.

No presente caso, o crime ambiental atingiu espécie de flora que consta na Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção (Araucariaangustifolia), nos termos da Portaria MMA nº 300/2022 do Ministério do Meio Ambiente.

O STJ já pacificou o entendimento no sentido de que há interesse da União no julgamento de crimes ambientais que configurem agressão a espécies de fauna e flora constantes na Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção. Nesse sentido:

A proteção ao meio ambiente constitui matéria de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, motivo pelo qual, para se afirmar ser o delito contra a fauna de competência da Justiça Federal, é necessário que se revele evidente interesse da União, a teor do disposto no art. 109, inciso IV, da Constituição Federal.

STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 154.855/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 13/12/2017.

 

O interesse da União nos crimes de agressão à fauna depende do envolvimento de animais constantes da Lista Nacional de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção.

STJ. 3ª Seção. CC 159.976/SP, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, DJe de 16/4/2019.

 

Em suma:

A competência da Justiça Federal para julgar crimes ambientais é atraída quando a conduta envolve espécies constantes na Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, configurando interesse da União. 

STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 208.449-SC, Rel. Min. Messod Azulay Neto, julgado em 11/12/2024 (Info 24 - Edição Extraordinária).


Dizer o Direito!