quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025
A concessionária não pode cobrar a taxa de esgoto caso o esgoto coletado seja despejado nas galerias pluviais sem passar por qualquer tratamento
RELEMBRANDO O QUE O STJ DECIDIU NO TEMA 565
Imagine a seguinte situação:
A concessionária presta o serviço de
esgotamento sanitário no Município “X”.
Ocorre que a concessionária realiza a
coleta e o transporte dos dejetos, mas não o tratamento final dos efluentes
(resíduos).
Pode
a concessionária cobrar a “tarifa de esgotamento sanitário” mesmo realizando
apenas a coleta e o transporte dos dejetos, sem promover o seu tratamento
final?
SIM. Para o STJ, a cobrança da tarifa
não pressupõe a prestação integral do serviço de esgotamento sanitário, sendo
lícita quando realizada a coleta, a conexão e o escoamento dos dejetos, ainda
que sem tratamento final.
O art. 3º, I, b, da Lei nº 11.445/2007 trata sobre o serviço
de esgotamento sanitário:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei,
considera-se:
I - saneamento básico: conjunto de
serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de:
(...)
b) esgotamento sanitário: constituído
pelas atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de coleta,
transporte, tratamento e disposição final adequados dos esgotos sanitários,
desde as ligações prediais até o seu lançamento final no meio ambiente;
O art. 3º, I, b, da Lei nº 11.445/2007 deixa claro que o serviço de esgotamento
sanitário é constituído por diversas atividades, dentre as quais a coleta, o
transporte e o tratamento final dos dejetos, mas não exigiu que somente exista
o serviço público de esgotamento sanitário na hipótese em que todas as etapas
estejam presentes, nem proibiu a cobrança de tarifa pela só prestação de uma ou
algumas dessas atividades.
Assim, não pode o usuário do serviço,
sob a alegação de que não há tratamento dos efluentes, querer deixar de pagar a
tarifa.
Além do mais, o art. 9º do Decreto
7.217/2010, que regulamenta a referida legislação, confirma a ideia de que o
serviço de esgotamento sanitário é formado por um complexo de atividades,
explicitando que qualquer uma delas é suficiente para, autonomamente, permitir a
cobrança da respectiva tarifa.
A efetivação de alguma das etapas em
que se desdobra o serviço de esgotamento sanitário representa dispêndio que
deve ser devidamente ressarcido, pois, na prática, entender de forma diferente
inviabilizaria a prestação do serviço pela concessionária, prejudicando toda a
população que se beneficia com a coleta e escoamento dos dejetos, já que a
finalidade da cobrança da tarifa é manter o equilíbrio financeiro do contrato,
possibilitando a prestação contínua do serviço público.
A concessionária de água e esgoto pode cobrar “tarifa de
esgotamento sanitário” mesmo na hipótese em que realiza apenas a coleta e o
transporte dos dejetos sanitários, sem fazer o tratamento final dos efluentes.
Assim, é legal a cobrança de tarifa de esgoto na hipótese em que
a concessionária realize apenas uma – e não todas – das quatro etapas em que se
desdobra o serviço de esgotamento sanitário (a coleta, o transporte, o
tratamento e a disposição final de dejetos).
STJ.
1ª Seção. REsp 1.339.313-RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 12/6/2013
(Recurso Repetitivo – Tema 565).
O STJ AFIRMOU QUE NÃO SE PODE APLICAR O TEMA 565 SE O ESGOTO
NÃO É COLETADO OU SE É DESPEJADO IN NATURA NAS GALERIAS PLUVIAIS, SEM QUALQUER
TRATAMENTO
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João mora em um bairro da Zona
Oeste do Rio de Janeiro e percebeu que, todo mês, em sua conta de água, vinha
sendo cobrada uma taxa de esgoto pela CEDAE (Companhia Estadual de Águas e
Esgotos).
Após investigar a situação, ele
descobriu que o esgoto de sua residência não recebia qualquer tipo de
tratamento - na verdade, era simplesmente coletado e despejado in natura
(sem tratamento) em um valão que ficava a cerca de 500 metros de sua casa, o
qual desaguava diretamente em um rio da região.
Indignado com a situação, João
ingressou com ação contra a CEDAE e a FAB Zona Oeste S.A. (empresa também
responsável pelo serviço de saneamento na região), questionando a cobrança da
taxa de esgoto, já que o serviço não estava sendo efetivamente prestado -
afinal, apenas coletar o esgoto e despejá-lo sem tratamento em um valão não
configura prestação de serviço de esgotamento sanitário, mas sim poluição
ambiental.
Durante o processo, um perito
judicial confirmou que, embora o esgoto seja coletado, ele não é tratado antes
de ser descartado no meio ambiente, o que caracteriza uma grave violação das
normas ambientais e de direito do consumidor.
Diante disso, o juiz julgou o
pedido procedente, determinando que a CEDAE não pode cobrar pelo serviço de
esgoto enquanto ele não for efetivamente prestado. A sentença foi mantida pelo
Tribunal de Justiça.
A CEDAE interpôs recurso especial,
alegando que, de acordo com entendimento do STJ em casos anteriores, seria possível
cobrar a tarifa de esgoto mesmo que apenas algumas etapas do serviço sejam
realizadas, como a coleta e o transporte.
O STJ concordou com os
argumentos da CEDAE? É lícita (é válida) a cobrança pela concessionária de
tarifa por esgoto não coletado ou despejado in natura nas galerias pluviais,
sem qualquer tratamento?
NÃO.
O caso aqui julgado é diferente
daquilo que foi definido pelo STJ no Tema 565.
Na situação aqui tratada, os
dejetos da residência do autor eram encaminhados para um valão próximo à
residência, sem qualquer tratamento.
A coleta e o despejo in natura
do esgoto em galerias pluviais não são considerados serviços de esgotamento
sanitário, mas sim uma prática de poluição pura e simples. Essa conduta
infringe o Direito Ambiental, Direito Sanitário e o Direito do Consumidor.
Logo, é ilegal cobrar tarifa de
esgoto em situações nas quais o serviço não é efetivamente prestado, pois
configuraria enriquecimento sem causa (art. 884 do Código Civil).
O julgamento do REsp 1.339.313/RJ
(Tema 565) não autoriza a cobrança de tarifa quando o esgoto é lançado
diretamente no ambiente sem qualquer tratamento.
No precedente do Tema 565, era
admitida a cobrança em situações nas quais pelo menos uma etapa do serviço de
saneamento (coleta e transporte) foi realizada. No entanto, no caso em análise,
o lançamento in natura em valão configura um ato antissanitário,
inviabilizando a cobrança.
A utilização de galerias pluviais
para descarte de esgoto é admissível apenas quando os efluentes são previamente
tratados. Caso contrário, configura-se poluição ambiental.
Em suma:
Não é lícita a cobrança pela concessionária de tarifa
por esgoto não coletado ou despejado in natura nas galerias pluviais, sem
qualquer tratamento.
STJ. 2ª
Turma. AgInt no REsp 2.115.320-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura,
julgado em 14/10/2024 (Info 22 - Edição Extraordinária).
No mesmo sentido:
Não é legítima a cobrança de tarifa de esgoto quando há o
despejo de esgoto in natura em galerias pluviais, configurando poluição
ambiental.
O uso de galerias pluviais para esgotamento sanitário só se
justifica quando os efluentes nelas lançados estão devidamente tratados, sendo
etapa essencial do saneamento básico.
Não foi intuito do Recurso Repetitivo (REsp 1.339.313/RJ)
transformar o inadmissível ato antissanitário e antiambiental em ilícito impune
e, pior, remunerado, pois, de fato e de direito, não se equivalem, de um lado,
uso das galerias pluviais para escoamento de esgoto tratado e, do outro,
poluição das galerias pluviais, dos rios e do mar com efluentes sem qualquer
forma de tratamento, nem mesmo primário.
STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 2.068.061/RJ, Rel. Min. Herman
Benjamin, julgado em 24/6/2024.
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