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segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Comentários à Súmula 676 do STJ

(Im)possibilidade de conversão da prisão em flagrante em preventiva (ou temporária) de ofício pelo juiz

Antes da Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), a jurisprudência entendia que o juiz poderia, de ofício, decretar a prisão do investigado ou do réu.

Ocorre que a Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) revogou os trechos do CPP que previam a possibilidade de decretação da prisão preventiva ex officio. Veja:

Antes da Lei 13.964/2019

ATUALMENTE

Art. 282. (...)

§ 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público.

Art. 282. (...)

§ 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público.

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

 

ý (Defensor DPEPR 2024 Fundatec incorreta, pois o CPP não permite a decretação de prisão preventiva de ofício) Michele é presa em flagrante por roubo no dia 20/03/2024. Apesar da gravidade em abstrato do crime, o Ministério Público se manifesta pela liberdade provisória da investigada. A juíza plantonista decreta a prisão preventiva de Michele. Sobre o caso, analise as asserções abaixo: Apesar de previsão legal expressa permitir a decretação da prisão preventiva de ofício, o entendimento jurisprudencial pacífico é pela impossibilidade de decretação da prisão preventiva sem provocação.

 

Depois das alterações promovidas pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019), permanece a possibilidade de o juiz converter de ofício, a prisão em flagrante em prisão preventiva?

NÃO. Com a Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), está proibida qualquer prisão decretada de ofício pelo magistrado.

Nesse sentido:

Após o advento da Lei nº 13.964/2019, não é mais possível a conversão da prisão em flagrante em preventiva sem provocação por parte ou da autoridade policial, do querelante, do assistente, ou do Ministério Público, mesmo nas situações em que não ocorre audiência de custódia.

A Lei nº 13.964/2019, ao suprimir a expressão “de ofício” que constava do art. 282, § 2º, e do art. 311, ambos do CPP, vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem o prévio requerimento das partes ou representação da autoridade policial.

Logo, não é mais possível, com base no ordenamento jurídico vigente, a atuação ‘ex officio’ do Juízo processante em tema de privação cautelar da liberdade.

STJ. 3ª Seção. RHC 131.263, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 24/02/2021 (Info 686).

STF. 2ª Turma. HC 188.888/MG, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 6/10/2020 (Info 994).

 

Com efeito, nos termos do art. 311 do CPP, "Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial".

No caso, embora o representante ministerial tenha postulado a aplicação de outras cautelares mais brandas, o Juízo decretou a prisão preventiva, caracterizando uma atuação de ofício.

STJ. 5ª Turma.  AgRg nos EDcl no RHC 196.080/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 18/6/2024.

 

O Supremo Tribunal Federal, ao analisar a matéria, no Habeas Corpus n. 188.888, entendeu que "a Lei nº 13.964/2019, ao suprimir a expressão 'de ofício' que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, e do art. 311, todos do Código de Processo Penal, vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem o prévio 'requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público', não mais sendo lícita, portanto, com base no ordenamento jurídico vigente, a atuação 'ex officio' do Juízo processante em tema de privação cautelar da liberdade".

STJ. 6ª Turma. AgRg no RHC 195.540/PA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 10/6/2024.

 

þ (Defensor DPEPR 2024 Fundatec correta, pois, se o MP opinou somente pela concessão da liberdade provisória, não é possível decretar prisão preventiva de ofício pelo juiz) Michele é presa em flagrante por roubo no dia 20/03/2024. Apesar da gravidade em abstrato do crime, o Ministério Público se manifesta pela liberdade provisória da investigada. A juíza plantonista decreta a prisão preventiva de Michele. Sobre o caso, analise as asserções abaixo: A decisão da magistrada está equivocada.

 

O inciso II do art. 310 do CPP poderia ser invocado como sendo um dispositivo que autorizaria a decretação de ofício da prisão preventiva?

NÃO. A interpretação do art. 310, II, do CPP deve ser realizada à luz dos arts. 282, §§ 2º e 4º, e 311, todos do CPP. Com isso, o juiz pode sim converter a prisão em flagrante em preventiva, desde que, além de presentes as hipóteses do art. 312 e ausente a possibilidade de substituir por cautelares outras, haja o pedido expresso por parte ou do Ministério Público, ou da autoridade policial, ou do assistente ou do querelante. Nesse sentido:

A interpretação do art. 310, II, do CPP deve ser realizada à luz dos arts. 282, §§ 2º e 4º, e 311, do mesmo estatuto processual penal, a significar que se tornou inviável, mesmo no contexto da audiência de custódia, a conversão, de ofício, da prisão em flagrante de qualquer pessoa em prisão preventiva, sendo necessária, por isso mesmo, para tal efeito, anterior e formal provocação do Ministério Público, da autoridade policial ou, quando for o caso, do querelante ou do assistente do MP.

STJ. 3ª Seção. RHC 131.263/GO, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 24/2/2021.

STJ. 6ª Turma. AgRg no RHC 167.672/BA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 29/4/2024.

 

Com o objetivo de cristalizar esse entendimento jurisprudencial, o STJ editou o enunciado:

Súmula 676-STJ: Em razão da Lei n. 13.964/2019, não é mais possível ao juiz, de ofício, decretar ou converter prisão em flagrante em prisão preventiva.

STJ. 3ª Seção. Aprovada em 11/12/2024, DJe de 17/12/2024 (Info 837).


 

DOD Plus - aprofundando:

 

Se o Ministério Público pediu a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, o juiz está autorizado a decretar a prisão sob o argumento de que se trata de uma espécie de medida cautelar?

O STJ está dividido.

Existem decisões afirmando que SIM:

O STJ tem entendimento de que a manifestação do parquet pela aplicação de medidas alternativas diversas ao cárcere, permite ao juiz avaliar a pertinência das referidas cautelares e, nessa condição, impor a mais adequada e suficiente ao caso, inclusive a mais grave, qual seja, a prisão preventiva, sem se falar em prisão cautelar de ofício.

STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 900.602/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 20/5/2024.

 

A determinação do magistrado pela cautelar máxima, em sentido diverso do requerido pelo Ministério Público, pela autoridade policial ou pelo ofendido, não pode ser considerada como atuação ex officio.

STJ. 6ª Turma. RHC 145.225-RO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 15/02/2022 (Info 725).

 

A 1ª Turma do STF também já decidiu que SIM:

Apesar da discordância de entendimento entre o Promotor de Justiça e o Magistrado de origem acerca da espécie de medida cautelar a ser adotada, houve pronunciamento do órgão de acusação para que outras cautelares alternativas fossem fixadas, situação bem distinta de quando o julgador age sponte sua.

No caso, depois de ouvir o Ministério Público e a defesa, o Juízo de custódia homologou a prisão em flagrante e entendeu que a medida mais adequada, na espécie, era a conversão do flagrante em prisão preventiva.

Nessas circunstâncias, a autoridade judiciária não excedeu os limites de sua atuação e nem tampouco agiu de ofício, de modo que a prisão preventiva do recorrente é compatível com a nova legislação de regência, além de proporcional e adequada ao caso concreto.

STF. 1ª Turma. RHC 234974 AgR, Rel. Min. Cristiano Zanin, julgado em 19/12/2023.

 

Por outro lado, também existem decisões do STJ e da 2ª Turma do STF sustentando que NÃO:

Nos termos do art. 311 do CPP, “Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial”.

No caso, embora o representante ministerial tenha postulado a aplicação de outras cautelares mais brandas, o Juízo decretou a prisão preventiva, caracterizando uma atuação de ofício.

STJ. 5ª Turma. AgRg nos EDcl no RHC 196.080/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 18/6/2024.

 

A determinação do magistrado pela cautelar máxima, em sentido diverso do requerido pelo Ministério Público, pela autoridade policial ou pelo ofendido, não pode ser considerada como atuação ex officio.

STJ. 6ª Turma. RHC 145.225-RO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 15/02/2022 (Info 725).

 

É ilegal a conversão em preventiva da prisão em flagrante quando o Ministério Público requer a concessão da liberdade provisória, salvo se houver representação da autoridade policial, o que não é o caso dos autos.

STF. 2ª Turma. HC 193592 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/02/2022.

 

Treine o assunto estudado:

Banca: Fundação Getúlio Vargas - FGV - Prova: FGV - TJ SC - Juiz Substituto - 2024

O Ministério Público ofereceu denúncia contra Robério em razão da prática do crime de homicídio culposo e requereu a prisão preventiva do acusado, pelo fato de ostentar outras condenações por delitos culposos em sua folha de antecedentes criminais, bem como por não possuir ele residência fixa na comarca.

Analisando o pleito ministerial, é correto afirmar que o juiz:

Não poderá decretar a prisão preventiva do acusado, que não é cabível, mas poderá decretar medida cautelar diversa da prisão. (Correto)


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