sábado, 30 de novembro de 2024
A operadora do plano de saúde não é obrigada a custear exame realizado no exterior, salvo se ela se comprometeu mediante cláusula contratual expressa
Imagine a seguinte situação
hipotética:
Regina, residente no Brasil, foi
diagnosticada com câncer de mama em estágio inicial.
Durante o tratamento, seus
médicos recomendaram a realização de um exame chamado “MammaPrint”, que analisa
os genes do tumor para prever o risco de recorrência do câncer e personalizar o
tratamento. Este exame, no entanto, só está disponível nos Estados Unidos.
O MammaPrint é
um teste genético que analisa a expressão de 70 genes em tumores de mama para
avaliar o risco de recorrência do câncer nos próximos 10 anos. Seu principal
objetivo é auxiliar na decisão sobre a necessidade de tratamentos adicionais,
como quimioterapia, após a cirurgia inicial. Ao determinar se o tumor apresenta
baixo ou alto risco de recidiva, o MammaPrint permite que pacientes com baixo
risco possam ser poupadas de tratamentos mais agressivos, evitando efeitos
colaterais desnecessários.
Este exame é
indicado para pacientes com câncer de mama invasivo em estágio inicial, com
tumores de até 5 cm e que não tenham se disseminado para mais de três
linfonodos.
Regina tem um plano de saúde
nacional contratado com a operadora Unimed.
Ela solicitou à operadora o
custeio do exame (MammaPrint), mas a Unimed negou a cobertura, argumentando que
não há cláusula contratual que permita cobertura de procedimentos realizados no
exterior. Ao contrário. Existe uma cláusula no contrato que limita a cobertura
do plano a procedimentos realizados no Brasil.
Inconformada, Regina ingressou
com ação contra o plano de saúde alegando que essa cláusula seria abusiva.
A questão chegou ao STJ.
Regina teve direito de realizar o MammaPrint custeado pelo plano de saúde?
NÃO.
O art. 10 da Lei nº 9.656/1998
prevê que os planos de saúde são obrigados a oferecer “cobertura assistencial
médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos realizados exclusivamente no Brasil.”
O art. 16, X, da mesma lei,
determina que os contratos e regulamentos dos planos de saúde devem especificar
claramente a área geográfica de cobertura.
De acordo com o art. 1º, § 1º, I,
da Resolução Normativa 566/2022 da ANS, essa área corresponde ao espaço onde a
operadora deve assegurar todas as coberturas contratadas pelo beneficiário,
podendo ser nacional, estadual, regional, municipal ou de um grupo de
municípios.
A interpretação conjunta do art.
10 da Lei nº 9.656/1998 e do art. 1º, § 1º, I, da Resolução Normativa 566/2022
conduz à conclusão de que a área de abrangência das coberturas é limitada ao território nacional.
Dessa forma, salvo previsão expressa em cláusula contratual,
a lei exclui a obrigação da operadora de garantir tratamentos ou procedimentos
no exterior, sendo inaplicável, nesse caso, a regra do § 13 do art. 10 da Lei
9.656/1998:
Art. 10 (...)
§ 13. Em caso de tratamento ou
procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam
previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser
autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que:
I - exista comprovação da
eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e
plano terapêutico; ou
II - existam recomendações pela
Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde
(Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de
tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas
também para seus nacionais.
Em suma:
A área geográfica de abrangência em que a operadora
fica obrigada a garantir todas as coberturas de assistência à saúde contratadas
pelo beneficiário é limitada ao território nacional, salvo se houver previsão
contratual em sentido contrário.
STJ. 3ª
Turma. REsp 2.167.934-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/10/2024 (Info
831).