Imagine a seguinte situação adaptada:
Em Lagoa de Itaenga, Município do
interior de Pernambuco, policiais militares realizavam rondas quando avistaram
dois homens em uma motocicleta, fazendo uso de capacete.
Segundo argumentaram os
policiais, utilizar capacete nesse Município, é uma prática incomum e seria
mais comumente adotado por delinquentes, que buscam evitar a identificação
pessoal.
Diante disso, a guarnição
policial considerou a utilização do capacete como atitude suspeita, motivo pelo
qual realizou a abordagem.
Durante a revista, os policiais
encontraram drogas em posse de João, garupa da moto.
João foi preso em flagrante e,
posteriormente, denunciado e condenado por tráfico de drogas (art. 33, caput,
da Lei nº 11.343/2006).
O condenado interpôs apelação,
mas o Tribunal de Justiça manteve a sentença.
Habeas corpus
A defesa impetrou, então, habeas
corpus dirigido ao STJ sustentando a nulidade da busca pessoal.
Argumentou que a busca pessoal
depende de “fundada suspeita” e que o simples fato de o paciente estar sem
capacete não pode ser considerado como “fundada suspeita”.
Logo, para a defesa, a revista
pessoal foi ilícita e, portanto, nula. Da mesma forma, são nulos todas as
provas decorrentes dessa revista pessoal.
O STJ concordou com os
argumentos da defesa? Foi tudo anulado?
SIM.
A busca
pessoal, à qual se equipara a busca veicular, é regida pelo art. 244 do CPP:
Art. 244. A busca pessoal independerá de mandado, no
caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na
posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito,
ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.
A partir da leitura desse
dispositivo, é possível extrair três hipóteses de busca pessoal sem mandado.
Hipóteses de busca pessoal
sem mandado
A busca pessoal sem mandado
judicial pode ser decretada nas seguintes hipóteses:
a) no caso de prisão (ex: o
indivíduo é preso em flagrante, o que autoriza a realização de busca pessoal);
b) quando houver fundada suspeita
de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que
constituam corpo de delito; ou
c) quando a medida for
determinada no curso de busca domiciliar.
A situação em tela se
enquadraria, segundo a narrativa dos policiais, na hipótese da letra “b”.
Exige-se, neste caso, a fundada
suspeita de que a pessoa abordada esteja na posse de arma proibida ou de
objetos ou papeis que constituam corpo de delito.
Uso de capacete, por si só,
não pode ser considerado como fundada suspeita
O uso de capacete possui previsão
expressa
O Tribunal de Justiça entendeu
que a fundada suspeita para a abordagem se deu pelo uso dos capacetes, algo
incomum na região, e pelo nervosismo do paciente.
Contudo, art. 244 do Código de
Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997) prevê o uso obrigatório do capacete, sendo
infração gravíssima andar em motocicleta sem ele.
Em suma:
Embora não usar capacete seja praxe no local da
abordagem, não se pode extrair do uso do equipamento, exclusivamente, a
existência de fundada suspeita para justificar busca pessoal.
STJ. 5ª
Turma. AgRg no AgRg no HC 889.619-PE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,
julgado em 10/6/2024 (Info 823).