Dizer o Direito

terça-feira, 1 de outubro de 2024

O fato de a alimentanda ter atingido a maioridade civil e estar recebendo bolsa auxílio no estágio não são motivos, por si só, para eliminar a obrigação do pai de continuar pagando a pensão alimentícia

Imagine a seguinte situação hipotética:

João, pai de Larissa, combinou o pagamento de pensão alimentícia em favor da filha, no valor de 30% do salário-mínimo. Na época, Larissa tinha 16 anos.

Larissa agora está com 20 anos e se encontra cursando a faculdade. Além disso, ela está em um estágio remunerado.

João deixou de pagar a pensão alimentícia.

Larissa ingressou, então, com execução de alimentos.

O executado foi citado, mas não pagou os valores em atraso.

Diante disso, o juiz decretou a prisão civil do devedor.

João impetrou habeas corpus alegando que Larissa já adquiriu a maioridade civil. Além disso, argumentou que ela tem a possibilidade de promover seu próprio sustento por meio do estágio remunerado.

Pediu, portanto, para que fosse reconhecido que não há mais obrigação alimentar.

 

O pedido de João foi acolhido pelo STJ?

NÃO.

O STJ entende que:

A maioridade civil e a capacidade, em tese, de promoção ao próprio sustento, por si só, não são capazes de desconstituir a obrigação alimentar, devendo haver prova pré-constituída da ausência de necessidade dos alimentos.

STJ. 3ª Turma. HC 871.593/MG, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 5/3/2024.

 

A exoneração do alimentante sujeita-se a decisão judicial, mediante o contraditório, conforme entendimento sumulado do STJ:

Súmula 358-STJ: O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos.

 

No caso concreto, o alimentante (João) alegou que a alimentanda (Larissa) é maior de idade e tem emprego fixo. Porém, a alegada capacidade econômica foi analisada apenas com base nas alegações e documentos unilateralmente produzidos pelo impetrante, à míngua do necessário contraditório.

Vale ressaltar, ainda, que o “salário” (bolsa estágio) recebido pela alimentada sequer alcança o piso nacional.

Importante ainda esclarecer que João, quando foi citado na execução para efetuar o pagamento ou justificar a impossibilidade de fazê-lo, quedou-se inerte, sem prestar qualquer tipo de esclarecimento sobre o inadimplemento da pensão alimentícia.

Conclui-se, portanto, que o não pagamento e o acúmulo das parcelas ocorreram devido à recalcitrância do devedor, que teve várias chances de quitar sua dívida antes da ordem de prisão.

Além disso, o simples fato de João ter ingressado com ação exoneratória de alimentos não elimina a obrigação de pagar, especialmente as parcelas pretéritas.

 

Em suma:

A maioridade civil e a capacidade, em tese, de promoção ao próprio sustento, por si só, não são capazes de desconstituir a obrigação alimentar, devendo haver prova pré-constituída da ausência de necessidade dos alimentos. 

STJ. 4ª Turma. HC 908.346-PR, Rel. Min. Raul Araújo, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/8/2024 (Info 822).


Print Friendly and PDF