Dizer o Direito

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Comentários à Súmula 673 do STJ

Qual é a natureza jurídica dos Conselhos Profissionais (exs.: CREA, CRM, COREN, CRO etc.)?

Os Conselhos Profissionais possuem natureza jurídica de autarquias federais.

Exceção: a OAB que, segundo a concepção majoritária, é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro.

 

Anuidades

Os Conselhos podem cobrar um valor todos os anos dos profissionais que integram a sua categoria. A isso se dá o nome de anuidade (art. 4º, II, da Lei nº 12.514/2011).

 

Qual é a natureza jurídica dessas anuidades?

Conforme jurisprudência do STF (ADI 4697/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 06/10/2016), a anuidade devida aos conselhos profissionais são tributos da espécie contribuições de interesse das categorias profissionais (art. 149, CF/88):

O entendimento iterativo do STF é na direção de as anuidades cobradas pelos conselhos profissionais caracterizarem-se como tributos da espécie “contribuições de interesse das categorias profissionais”, nos termos do art. 149 da Constituição da República.

STF. Plenário. ADI 4697, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 06/10/2016.

 

Essa é também a posição do STJ:

As anuidades devidas aos conselhos profissionais constituem contribuições de interesse das categorias profissionais e estão sujeitas a lançamento de ofício, o qual apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte para efetuar o pagamento do tributo e o esgotamento das instâncias administrativas, em caso de recurso, sendo necessária a comprovação da remessa da intimação.

STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 1689783/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 26/10/2020.

 

Fato gerador

O fato gerador das anuidades é a existência de inscrição no conselho, ainda que por tempo limitado, ao longo do exercício (art. 5º da Lei nº 12.514/2011).

 

Lançamento

As anuidades devidas aos conselhos profissionais estão sujeitas a lançamento de ofício.

Após o Conselho realizar o lançamento, ele precisa comunicar que fez isso ao sujeito passivo (profissional) para que este possa pagar a contribuição ou impugná-la, caso não concorde com o que está sendo cobrado.

 

Forma de notificação do profissional

A legislação não prevê a forma como o profissional deverá ser notificado de que houve o lançamento de ofício e de que ele deverá pagar a contribuição.

 

Execução fiscal

Como a anuidade é um tributo e os Conselhos profissionais são autarquias, em caso de inadimplemento, o valor devido é cobrado por meio de uma execução fiscal.

 

Competência

A execução fiscal, nesse caso, é de competência da Justiça Federal, tendo em vista que os Conselhos são autarquias federais (Súmula 66 do STJ).

 

Feitos esses esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética:

João é profissional inscrito no Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo.

Ele ficou em débito com as anuidades devidas ao Conselho nos exercícios de 2012 a 2014.

Em razão da inadimplência, o Conselho realizou o lançamento de ofício das anuidades atrasadas e propôs execução fiscal para cobrança do débito.

O Juiz Federal determinou que o exequente, no prazo de 15 dias, comprovasse que fez a notificação do executado acerca das anuidades cobradas.

O exequente não comprovou, razão pela qual o juízo de primeiro grau julgou extinta a execução fiscal devido à falta de notificação do executado sobre as anuidades cobradas. Desse modo, considerou que a Certidão de Dívida Ativa não preenchia os requisitos de liquidez e certeza do título executivo.

A sentença foi mantida pelo TRF da 3ª Região.

Ainda inconformado, o Conselho interpôs recurso especial.

 

A sentença e o acórdão do TRF foram mantidos pelo STJ?

SIM.

Essas decisões estão em conformidade com a orientação consolidada no STJ, segundo a qual as:

Anuidades devidas aos conselhos profissionais constituem contribuições de interesse das categorias profissionais e estão sujeitas a lançamento de ofício, que apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte para efetuar o pagamento do tributo e o esgotamento das instâncias administrativas, em caso de recurso, sendo necessária a comprovação da remessa da comunicação.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.788.488/RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 8/4/2019.

 

As anuidades devidas aos conselhos profissionais estão sujeitas a lançamento de ofício, que apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte para efetuar o pagamento do tributo e o esgotamento das instâncias administrativas, em caso de recurso, sendo necessária a comprovação da remessa da comunicação. 

STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 2.133.371-SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 17/6/2024 (Info 19 – Edição Extraordinária).

 

Esse entendimento reiterado do STJ foi consolidado em uma súmula:

Súmula 673-STJ: A comprovação da regular notificação do executado para o pagamento da dívida de anuidade de conselhos de classe ou, em caso de recurso, o esgotamento das instâncias administrativas são requisitos indispensáveis à constituição e execução do crédito.

STJ. 1ª Seção. Aprovada em 11/9/2024 (Info 825).

 

Resumo dos principais fundamentos dos acórdãos que deram origem ao enunciado:

• As anuidades devidas aos conselhos profissionais (como o Conselho Regional de Farmácia) são consideradas contribuições de interesse das categorias profissionais.

• Essas contribuições possuem natureza tributária, ou seja, são tratadas como um tributo.

• Como tributo, o crédito das anuidades está sujeito a lançamento de ofício. O lançamento de ofício é um procedimento administrativo em que a administração fiscal realiza a constituição do crédito tributário sem a participação direta do contribuinte.

• O lançamento tributário, para ser considerado válido, apenas se aperfeiçoa com a notificação do contribuinte.

• A notificação serve para que o contribuinte seja formalmente informado sobre a obrigação de pagamento do tributo.

• Essa notificação é essencial para que o contribuinte tenha a oportunidade de:

i) Pagar o tributo; ou

ii) Apresentar defesa ou recurso na esfera administrativa, caso discorde do valor ou da obrigação.

 

• O esgotamento das instâncias administrativas, no caso de recurso, é condição para que o crédito seja constituído definitivamente e possa ser cobrado judicialmente.

• É necessária, portanto, a comprovação da remessa da comunicação ao contribuinte. Vale ressaltar que a simples alegação de que houve notificação não é suficiente. Deve haver prova documental de que o contribuinte foi efetivamente comunicado.

• A Certidão de Dívida Ativa (CDA), que é o documento utilizado para cobrar judicialmente o tributo não pago, goza de uma presunção de certeza, liquidez e exigibilidade. No entanto, essa presunção somente se mantém se o crédito foi regularmente constituído, o que implica, entre outras coisas, a notificação válida do contribuinte. A ausência de uma notificação válida afasta a presunção de certeza e liquidez da CDA. Assim, se não houver comprovação de que a notificação foi enviada ao contribuinte, o título executivo se torna inválido e não pode ser utilizado para a execução fiscal.


Dizer o Direito!