sábado, 5 de outubro de 2024
Administração Pública nomeou um grupo de candidatos aprovados. Poucos dias depois, houve nova convocação para vagas melhores. É possível que um candidato do primeiro grupo fique com uma dessas novas vagas oferecidas?
Imagine a seguinte situação adaptada:
Guilherme foi aprovado em
concurso público para o cargo de Oficial de Justiça, classificando-se em
segundo lugar.
A Administração fez a sua
nomeação e o convocou para assumir uma das comarcas disponíveis.
Guilherme escolheu uma comarca do
interior.
Ocorre que 20 dias depois a
Administração nomeou mais 10 aprovados. Para esse segundo grupo de aprovados
foram oferecidas vagas na capital do Estado.
Guilherme impetrou mandado de
segurança alegando que morava na capital do Estado e que foi obrigado a
escolher uma cidade distante do interior enquanto que candidatos classificados
em posição inferior a dele puderam optar por trabalhar na capital. Isso importou
em violação aos princípios da administração pública.
Requereu a concessão da segurança
para que fosse lotado na capital.
O STJ concordou com os argumentos de Guilherme?
SIM.
Violação de princípios constitucionais
Entre o primeiro ato de nomeação
– após exercida a opção de escolha pela primeira turma de convocados – e a
publicação da segunda convocação par audiência pública, transcorreram apenas 20
(vinte) dias, circunstância que caracteriza inobservância dos princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade.
A convocação dos candidatos
deveria obedecer a estrita ordem de classificação no concurso, de modo que o
ato de priorizar candidatos aprovados em posição inferior configuraria, também,
ofensa aos princípios da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório.
Embora a Administração Pública
detenha a prerrogativa de escolha quanto ao momento apropriado para nomeação
dos aprovados dentro do número de vagas em concurso público, durante a validade
do certame, uma vez constatada a existência de preterição arbitrária,
evidencia-se o direito líquido e certo à nomeação, sob pena de ofensa ao inciso
IV, do art. 37, da CF/88.
Prévia existência das vagas
O fracionamento das nomeações em
brevíssimo espaço de tempo (apenas 20 dias) demonstra que, já na primeira
nomeação, havia a necessidade de provimento dos cargos, bem como a existência
de vagas, motivo pelo qual deve ser assegurada aos candidatos com melhor
classificação a preferência na escolha dos locais de votação.
O STJ citou o Tema 784/STF no
qual a Suprema Corte decidiu que “o Estado Democrático de Direito republicano
impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada
não apenas pela sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e
oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais e demais
normas constitucionais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade”.
Ordem de vacância e exiguidade entre as convocações
A exiguidade do prazo entre as
convocações, embora possível, deve observar, necessariamente, a ordem de
vacância e classificação no concurso para oferta e preenchimento das vagas, o
que não ocorreu no caso. A intermitência entre as convocações, portanto, só se
justifica quando o surgimento das novas vagas ocorre posteriormente à primeira
convocação.
Em suma:
A convocação fracionada de aprovados em concurso
público para o provimento das vagas previstas no edital não pode implicar em
restrição artificial da preferência na escolha da lotação segundo a ordem de
classificação.
STJ. 2ª
Turma. RMS 71.656-RO, Rel. Min. Francisco Falcão, Rel. para acórdão Min.
Teodoro Silva Santos, julgado em 8/8/2024 (Info 823).
No caso concreto, o STJ deu
provimento ao recurso para reconhecer ao autor/recorrente o direito de escolher
a vaga de sua preferência entre as disponíveis na primeira e na segunda
convocações, observada a ordem classificatória do concurso.