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sexta-feira, 4 de outubro de 2024

A ausência de vagas no sistema penitenciário, por si só, não justifica a substituição do regime fechado pelo regime aberto no cumprimento da prisão civil por dívida de pensão alimentícia

Imagine a seguinte situação hipotética:

Suzana e Pedro eram casados e tiveram um filho chamado de Tiago.

O casal se divorciou e ficou ajustado, na sentença, que:

- Tiago ficaria morando com Suzana; e que

- Pedro (o pai) pagaria pensão alimentícia em favor do filho (50% do salário-mínimo).

 

Pedro tornou-se inadimplente e Tiago, representado por sua mãe, ingressou com cumprimento de sentença.

O juiz decretou a prisão civil de Pedro.

 

Quando o devedor de alimentos é preso, ele fica em uma unidade prisional como se estivesse em regime fechado?

Sim, no entanto, deverá ficar separado dos presos comuns.

É o que afirma expressamente o § 4º do art. 528 do CPC:

Art. 528 (...)

§ 4º A prisão será cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.

 

Juiz determinou que Pedro deveria ficar em regime aberto

Como vimos acima, o juiz determinou a prisão civil de Pedro pelo prazo de 90 dias. No entanto, ele estabeleceu que a prisão fosse cumprida em regime aberto, permitindo que Pedro saísse para trabalhar durante o dia e retornasse à noite para dormir em casa de albergado.

A justificativa do magistrado foi a de que não havia vagas no sistema prisional da comarca. Além disso, afirmou que, se Pedro ficasse preso em regime fechado, não poderia trabalhar e, consequentemente, não teria como pagar a pensão atrasada.

 

Recurso de Tiago

Tiago recorreu contra a decisão, mas o Tribunal de Justiça negou provimento ao agravo de instrumento.

Ainda inconformado, Tiago interpôs recurso especial ao STJ pedindo que a prisão civil de Pedro fosse cumprida em regime fechado, conforme previsto no art. 528, § 4º do CPC.

 

Para o STJ, agiu corretamente o juiz? É possível a substituição do regime fechado pelo regime aberto no cumprimento da prisão civil decretada com base no art. 528 do CPC/2015, ante a ausência de vagas no sistema penitenciário?

NÃO.

O art. 528, § 4º, do CPC/2015 estabelece que a prisão do devedor será cumprida em regime fechado, devendo este ficar separado dos presos comuns, já que não se trata de uma prisão de natureza penal. Por isso, não se aplicam regras típicas do direito penal, como a progressão de regime ou a substituição da pena por outras formas.

O STJ consolidou o entendimento de que a prisão civil deve ocorrer em regime fechado, exceto em situações excepcionalíssimas, como a idade avançada do devedor ou problemas de saúde que demandem cuidados especiais.

A simples falta de vagas no sistema prisional não justifica a mudança de regime, sob pena de esvaziar a norma do art. 528, § 4º, do CPC/2015. Caso contrário, a prisão civil deixaria de ser efetiva, considerando que a maioria das unidades prisionais no Brasil sofre com superlotação.

A responsabilidade de lidar com a falta de vagas no sistema penitenciário cabe à autoridade judicial local, que, em cooperação com os demais Poderes, deve buscar soluções adequadas à realidade social. Ao fazer isso, é necessário manter o foco na função principal da prisão civil: coagir o devedor a pagar os alimentos essenciais à sobrevivência digna do alimentado, conforme recomendação do CNJ no Manual da Central de Regulação de Vagas.

O argumento de que a proibição de saída para atividades laborativas levaria inevitavelmente ao inadimplemento da obrigação alimentícia não deve prevalecer. A condição de presidiário não isenta o devedor do pagamento de alimentos, uma vez que ele ainda pode exercer atividades remuneradas, mesmo que de forma mais restrita, dentro ou fora do presídio.

 

Em suma:

A ausência de vagas no sistema penitenciário, por si só, não justifica a substituição do regime fechado pelo regime aberto no cumprimento da prisão civil decretada com base no art. 528 do CPC/2015. 

STJ. 3ª Turma. REsp 2.104.738-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 3/9/2024 (Info 824).


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