Dizer o Direito

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

O Dia do Advogado (11 de agosto) é considerado feriado local para fins de comprovação da tempestividade recursal?

Imagine a seguinte situação hipotética:

João ajuizou ação contra Pedro, tendo o pedido sido julgado improcedente.

O autor interpôs apelação, mas o Tribunal de Justiça manteve a sentença.

Ainda inconformado, João interpôs recurso especial contra o acórdão do TJ.

O prazo para interpor recurso especial é de 15 dias úteis.

João interpôs o recurso especial no último dia do prazo.

Na conferência para verificar se João interpôs o recurso tempestivamente, pode-se cair em uma armadilha e achar que ele perdeu o prazo. Isso porque no período entre a intimação do acórdão e a interposição do recurso, um dos dias foi 11 de agosto (Dia do Advogado), que é um feriado na Justiça (ou seja, dia não útil).

Assim, se a pessoa que está conferindo a tempestividade não desconsiderar esse dia, achará que João perdeu o prazo e que interpôs o REsp no 16º dia útil. No entanto, conforme expliquei, um desses dias era feriado (Dia do Advogado) e, dessa forma, esse dia tem que ser excluído da contagem do prazo.

Repetindo: tirando sábados e domingos, João interpôs o recurso no 16º dia. Ocorre que um desses dias foi feriado de 11 de agosto. Logo, esse dia tem que ser excluído da contagem (porque não é dia útil). Isso significa que João interpôs o recurso no 15º dia útil e, portanto, o REsp é tempestivo.

 

O que aconteceu, no caso concreto?

A Presidência do STJ entendeu que o recurso especial seria intempestivo.

O problema foi justamente o feriado.

O Ministro afirmou que João não comprovou, de maneira adequada, no momento de interposição, a ocorrência do feriado de 11 de agosto. O Ministro utilizou, como fundamento, para a sua decisão, o art. 1.003, § 6º do CPC, que exige que o recorrente comprove, no ato de interposição do recurso, a ocorrência de feriado local.

João não se conformou e interpôs agravo interno invocando o seguinte argumento: o Dia do Advogado (11 de agosto) não é um feriado local, mas sim nacional considerando que em todos os Estados não é dia útil no sistema de justiça. O art. 1.003, § 6º somente exige a comprovação dos feriados locais.

 

O argumento de João foi acolhido pelo STJ?

NÃO.

No que diz respeito, especificamente, ao Dia do Advogado, a jurisprudência do STJ afirma que tal data é considerada feriado local para fins de comprovação da tempestividade recursal. Logo, exige-se que a parte demonstre, no ato da interposição do recurso direcionado ao STJ, a inexistência de expediente forense no Tribunal de origem:

O Dia do Advogado (11 de agosto) é considerado feriado local para fins de comprovação da tempestividade recursal. 

STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 2.507.420-RO, Rel. Min. Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), julgado em 11/6/2024 (Info 21 – Edição Extraordinária).

 

Se o feriado local não foi comprovado no momento da interposição do recurso, o STF/STJ irá obrigatoriamente reconhecer a intempestividade?

Antes da Lei nº 14.939/2024: SIM.

O STJ entendia que a redação do § 6º do art. 1.003 do CPC era categórica e exigia a demonstração do feriado local exclusivamente no momento da interposição. Assim, não era possível aplicar o art. 932, parágrafo único nem o art. 1.029, § 3º para sanar esse vício:

Art. 932 (...)

Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível.

 

Art. 1.029 (...)

§ 3º O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave.

 

De acordo com o art. 1.003, § 6º, do CPC, “o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso”, de forma que não é possível essa demonstração em momento posterior à apresentação da insurgência, em virtude da preclusão consumativa e da ocorrência da coisa julgada.

STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 2.504.785/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 12/8/2024.

 

A interpretação literal da norma expressa no § 6º do art. 1.003 do CPC/2015, de caráter especial, sobrepõe-se a qualquer interpretação mais ampla que se possa conferir às disposições de âmbito geral insertas nos arts. 932, parágrafo único, e 1.029, § 3º, do referido diploma legal.

STJ. 3ª Turma. EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp 1611603/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 15/06/2021.

 

Depois da Lei nº 14.939/2024: NÃO.

A Lei nº 14.939/2024 alterou a redação do § 6º do art. 1.003 do CPC e previu que:

• o Tribunal deverá determinar a correção desse vício formal, ou seja, deverá determinar que a parte recorrente junte a comprovação do feriado local mesmo após a interposição do recurso; ou

• o Tribunal deverá considerar que o recurso foi tempestivo mesmo sem que a parte recorrente tenha juntado essa comprovação do feriado local se houver, no processo eletrônico, essa informação.

 

Redação anterior:

Art. 1.003 (...)

§ 6º O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso.

 

Redação atual:

Art. 1.003 (...)

§ 6º O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso, e, se não o fizer, o tribunal determinará a correção do vício formal, ou poderá desconsiderá-lo caso a informação já conste do processo eletrônico. (Redação dada pela Lei nº 14.939, de 2024)


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