A ação de alimentos pode ser proposta mesmo sem advogado
A Lei nº 5.478/1968 dispõe sobre a ação de alimentos.
Os arts. 2º e 3º da Lei de Alimentos possibilita que a
pessoa que pede alimentos possa ingressar com a ação mesmo sem advogado.
As normas impugnadas possibilitam ao credor que se dirija
ao juiz, pessoalmente ou por advogado, e exponha os fatos e fundamentos que
lastreiam seu pedido de alimentos. Assim, com base nesses dispositivos, é
dispensável a assistência de advogado na audiência inicial do procedimento
especial da ação de alimentos regido pela Lei nº 5.478/1968.
Vale
ressaltar que, logo depois, o juiz deverá designar um advogado ou Defensor
Público para fazer a assistência jurídica do credor. Veja:
Art. 2º O credor, pessoalmente, ou por intermédio
de advogado, dirigir-se-á ao juiz competente, qualificando-se, e exporá suas
necessidades, provando, apenas o parentesco ou a obrigação de alimentar do
devedor, indicando seu nome e sobrenome, residência ou local de trabalho,
profissão e naturalidade, quanto ganha aproximadamente ou os recursos de que
dispõe.
(...)
§ 3º Se o credor comparecer pessoalmente e não indicar profissional que
haja concordado em assisti-lo, o juiz designará desde logo quem o deva
fazer.
Art. 3º O pedido será
apresentado por escrito, em 3 (três) vias, e deverá conter a indicação do juiz
a quem for dirigido, os elementos referidos no artigo anterior e um histórico
sumário dos fatos.
§ 1º Se houver sido designado pelo juiz defensor para assistir o
solicitante, na forma prevista no art. 2º, formulará o designado, dentro de 24
(vinte e quatro) horas da nomeação, o pedido, por escrito, podendo, se achar
conveniente, indicar seja a solicitação verbal reduzida a termo.
§ 2º O termo previsto no parágrafo anterior será em 3 (três) vias,
datadas e assinadas pelo escrivão, observado, no que couber, o disposto no
"caput" do presente artigo.
ADPF
O Conselho Federal da OAB ajuizou ADPF pedindo para que a
expressão “pessoalmente, ou” e todo o art. 3º fossem declarados como não
recepcionados pela CF/88.
A OAB alegou que essa previsão seria incompatível com os seguintes
princípios constitucionais:
· isonomia (art. 5º, caput)
· devido processo legal (art. 5º, LIV),
· ampla defesa e contraditório (art. 5º,
LV),
· acesso à justiça (art. 5º XXXV),
· razoável duração do processo (art. 5º,
LXXVIII) e
· direito à defesa técnica (arts. 133 e
134 da CF/88.
Nas exatas
palavras da petição inicial:
“O direito à defesa técnica é garantia
constitucional fundamental do processo, inscrita no art. 133 da Constituição Federal,
que prevê a indispensabilidade do advogado para a administração da justiça, e
complementada pelo art. 134, que estende esse direito aos hipossuficientes,
mediante a criação da Defensoria Pública da União, dos Estados e do Distrito
Federal.
(...)
A representação por profissional
capacitado é mecanismo necessário para assegurar o equilíbrio da relação
processual e a efetividade do princípio da isonomia (art. 5º, caput) em juízo.
Sem a adequada representação por
advogado ou defensor público, a parte corre graves riscos: seja pelo
desconhecimento do direito, seja pela incapacidade de verter os fatos em
argumentos jurídicos, seja pelo desequilíbrio de armas em relação à parte adversa,
diversos são os elementos aptos a comprovar que a ausência de defesa técnica
leva a um acirramento das distâncias que separam a verdade material da verdade
em juízo.”
Esses argumentos foram acolhidos pelo STF? Essa previsão
da Lei de Alimentos é incompatível com a CF/88?
NÃO.
Embora seja reconhecido que o advogado desempenha um
papel essencial na administração da justiça, o STF reafirmou que, em
determinados procedimentos especiais previstos em lei, a representação por
advogado pode ser dispensada, com base no princípio do acesso à Justiça (art.
5º, XXXV, CF/88) e visando dar maior celeridade a certos ritos processuais.
Esse mesmo princípio fundamenta a dispensa de advogado na
Justiça do Trabalho (art. 791 c/c art. 839, CLT) e, na esfera criminal, nos
casos de habeas corpus e revisão criminal (art. 623, CPP).
Nesse contexto, o estabelecimento de um rito especial
para ações de alimentos reforça a necessidade de assegurar o acesso à Justiça e
concretizar o direito constitucional à prestação de alimentos, que se baseia no
princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88) e no direito à
vida (art. 5º, caput, CF/88).
A possibilidade de dispensar o advogado no momento
específico da petição inicial em ações de alimentos tem caráter cautelar,
buscando resguardar a integridade do alimentando. Essa etapa é prévia à
formação do litígio e se justifica pela urgência da demanda, sendo que, nesse
momento, ainda não há um conflito formal entre as partes.
Além disso, se o credor comparecer ao juízo sem estar
representado por um advogado, o juiz poderá imediatamente nomear um
profissional para assisti-lo.
Em suma:
É compatível com a Constituição
Federal de 1988 a norma da Lei nº 5.478/1968 que dispensa a assistência de
advogado na audiência inicial do procedimento especial da ação de alimentos.
STF. Plenário. ADPF 591/DF, Rel. Min. Cristiano
Zanin, julgado em 19/08/2024 (Info 1146).