Dizer o Direito

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

INFORMATIVO Comentado 821 STJ (completo e resumido)

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Confira abaixo o índice. Bons estudos.

ÍNDICE DO INFORMATIVO 821 DO STJ


DIREITO ADMINISTRATIVO

AGÊNCIAS REGULADORAS

§  É ilegal Resolução da ANVISA que, contrariando regras da Lei nº 9.294/1996, imponham obrigações e condicionantes às peças publicitárias de medicamentos.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TUTELAS PROVISÓRIAS

§  A contestação tem força de impedir a estabilização da tutela antecipada antecedente (art. 303 do CPC) ou somente a interposição de recurso, conforme prevê a redação do art. 304?

 

AÇÃO RESCISÓRIA

§  O depósito prévio deve ser revertido em favor do réu quando a ação rescisória é extinta sem julgamento de mérito. Exceção: se a rescisória foi extinta porque o juízo prolator da sentença voltou atrás, o depósito será devolvido ao autor.

 

PROCESSO COLETIVO

§  A extinção do cumprimento de sentença coletivo proposto pelo legitimado extraordinário, por prescrição intercorrente, não impede a execução individual do mesmo título.

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL

ANPP

§  Não cabe acordo de não persecução penal nos crimes raciais o que inclui as condutas resultantes de atos homofóbicos.

 

PROVAS

§  É legítima a prova encontrada no lixo descartado na rua por pessoa apontada como integrante de grupo criminoso sob investigação e recolhido pela polícia sem autorização judicial, sem que isso configure pesca probatória (fishing expedition) ou violação da intimidade.

 

EXECUÇÃO PENAL

§  A decisão que concede progressão é declaratória; a data-base para a concessão da progressão subsequente é data em que o último requisito é cumprido, seja ele objetivo ou subjetivo.

 

DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE RENDA

§  Incide IRRF na transferência de quotas de fundo de investimento por sucessão causa mortis?

 

ICMS

§  O contribuinte não precisa comprovar que assumiu o encargo financeiro para pedir a restituição de valores pagos a mais a título de ICMS no regime de substituição tributária para frente.

 

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA

§  Descontos no salário não afetam base de cálculo da contribuição previdenciária patronal.

 

OUTROS TEMAS

§  Para efeito de adequação dos benefícios previdenciários concedidos antes da CF/88 aos tetos das ECs 20/98 e 41/02, no cálculo devem ser aplicados os limitadores vigentes à época de sua concessão - menor e maior valor teto.


domingo, 15 de setembro de 2024

INFORMATIVO Comentado 1145 STF (completo e resumido)

Olá, amigas e amigos do Dizer o Direito,

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Confira abaixo o índice. Bons estudos.

ÍNDICE DO INFORMATIVO 1145 DO STF


Direito Constitucional

COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS

§  Lei estadual não pode obrigar planos de saúde a custearem exames laboratoriais pedidos por nutricionistas.

§  São inconstitucionais as normas de lei estadual que estabelecem idade máxima para a inscrição de voluntários na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros, bem como aquelas que permitam que esses voluntários exerçam atividades de guarda e policiamento.

 

PODER JUDICIÁRIO

§  É inconstitucional emenda constitucional estadual, de iniciativa parlamentar, que trate sobre a eleição dos órgãos diretivos do Tribunal de Justiça.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PRECATÓRIOS

§  Quando não houver o pagamento das parcelas do precatório, podem incidir juros de mora durante o prazo de parcelamento estabelecido no art. 78 do ADCT, excluindo-se o período de graça constitucional.


sábado, 14 de setembro de 2024

Na aplicação do art. 24-A do Estatuto da Advocacia, se não houver indícios de fraude na fixação dos honorários advocatícios, deve-se liberar integralmente o valor acordado, desde que não exceda 20% do patrimônio bloqueado

Imagine a seguinte situação hipotética:

João é um empresário que está sendo investigado em inquérito policial por supostos crimes financeiros.

O juiz, a requerimento da autoridade policial, determinou o bloqueio universal dos bens do investigado, totalizando cerca de R$ 10 milhões.

O escritório de advocacia responsável pela defesa do investigado peticionou ao juiz requerendo a liberação de R$ 2 milhões do numerário apreendido para o pagamento de honorários advocatícios e para o reembolso de despesas com a defesa do investigado.

O escritório fundamentou seu pedido no art. 24-A do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94), incluído pela Lei nº 14.365/2022:

Art. 24-A. No caso de bloqueio universal do patrimônio do cliente por decisão judicial, garantir-se-á ao advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens bloqueados para fins de recebimento de honorários e reembolso de gastos com a defesa, ressalvadas as causas relacionadas aos crimes previstos na Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas), e observado o disposto no parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal.

§ 1º O pedido de desbloqueio de bens será feito em autos apartados, que permanecerão em sigilo, mediante a apresentação do respectivo contrato.

§ 2º O desbloqueio de bens observará, preferencialmente, a ordem estabelecida no art. 835 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

§ 3º Quando se tratar de dinheiro em espécie, de depósito ou de aplicação em instituição financeira, os valores serão transferidos diretamente para a conta do advogado ou do escritório de advocacia responsável pela defesa.

§ 4º Nos demais casos, o advogado poderá optar pela adjudicação do próprio bem ou por sua venda em hasta pública para satisfação dos honorários devidos, nos termos do art. 879 e seguintes da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

§ 5º O valor excedente deverá ser depositado em conta vinculada ao processo judicial.

 

O juiz deferiu o pleito em parte e liberou apenas R$ 500 mil.

O magistrado argumentou que o art. 24-A acima transcrito permite que ele, discricionariamente, libere até 20% dos bens bloqueados. Isso significa que ele pode liberar um percentual menor.

No caso, é devido o levantamento apenas parcial dos honorários advocatícios considerando que o momento embrionário das investigações não recomendaria a sua liberação integral.

A decisão do juiz foi mantida pelo Tribunal de Justiça.

Inconformado, o escritório de advocacia recorreu ao STJ.

 

O STJ concordou com a liberação integral do valor dos honorários até o limite de 20%?

SIM.

A questão central é determinar se, quando há bloqueio total dos bens do investigado, o juiz tem a liberdade de decidir quanto dos valores bloqueados pode ser liberado para pagar honorários advocatícios, ou se, ao contrário, é obrigatório liberar o valor total dos honorários acordados entre as partes, desde que não ultrapasse o limite legal de 20% do patrimônio bloqueado.

No caso analisado, as instâncias inferiores decidiram permitir a liberação apenas parcial dos honorários advocatícios. Essa decisão foi baseada no fato de que as investigações ainda estavam no início, o que não justificaria a liberação completa dos honorários. Além disso, interpretaram que a expressão “até 20% dos bens bloqueados”, presente no art. 24-A da Lei nº 8.906/1994, dava ao juiz a liberdade para liberar uma porcentagem menor, se julgasse apropriado.

O STJ não concordou com o entendimento do juiz e do Tribunal de Justiça porque reduz excessivamente a autonomia privada das partes — ou seja, o contrato entre cliente e advogado — conferindo ao magistrado o poder de decidir o que seria razoável e proporcional em relação aos serviços prestados.

Assim, se o contrato firmado entre as partes estipula que o pagamento dos honorários deve ser integralmente realizado no início da persecução penal, não há razão para alegar que o estágio preliminar das investigações afastaria a possibilidade de liberação desses honorários. Esse aspecto é plenamente decidido pelas partes envolvidas no contrato.

O direito à defesa e a importância da advocacia no Estado Democrático de Direito justificam uma interpretação do art. 24-A do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (EAOB) que valorize a relação contratual entre advogado e cliente, desde que lícita e sem indícios de fraude. Essa relação deve ser respeitada tanto quanto ao valor dos honorários quanto à forma de pagamento (como data de vencimento, parcelamento, entre outros aspectos).

A única limitação imposta pelo legislador é que a liberação dos valores para pagamento dos honorários não pode exceder 20% de todo o patrimônio bloqueado. Isso significa que os honorários advocatícios podem ser inferiores a 20% dos valores bloqueados; nesses casos, o valor liberado deve ser integral, pois não alcança o teto legal. Se os honorários ultrapassarem 20% do patrimônio bloqueado, a liberação será limitada a essa porcentagem, para assegurar que os bens bloqueados também possam ser utilizados para garantir outros interesses, como a reparação da vítima e a restituição de bens obtidos de forma ilícita.

Portanto, não cabe ao magistrado avaliar se o estágio inicial da persecução penal justifica o pagamento integral dos honorários, se isso foi acordado em contrato firmado entre as partes.

Por fim, se houver indícios concretos de fraude, como uma possível combinação entre o cliente e o advogado para estabelecer honorários fictícios com o objetivo de contornar o bloqueio de bens, o magistrado poderá, de forma fundamentada, aplicar uma exceção à regra e determinar a liberação de um valor inferior ao estipulado artificialmente.

 

Em suma:

Em caso de bloqueio universal dos bens do investigado, inexistindo indícios de fraude para estabelecer os honorários em montante fictício, há obrigatoriedade de se liberar o valor integral dos honorários advocatícios acordados entre as partes, desde que não ultrapassado o limite legal de 20% do patrimônio bloqueado. 

STJ. 5ª Turma. RMS 71.903-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 6/8/2024 (Info 820).


sexta-feira, 13 de setembro de 2024

É possível autorizar o aborto em caso de feto com Síndrome de Edwards utilizando-se, por analogia, do entendimento do STF a respeito dos fetos anencéfalos?

Imagine a seguinte situação adaptada:

Regina, na 27ª semana de gravidez, descobriu que o feto é portador da Síndrome de Edwards (trissonomia do cromossomo 18) e possui cardiopatia grave, com ínfima probabilidade de vida extrauterina. De acordo com o laudo médico:

“Essa síndrome é considerada grave, onde a maioria dos fetos vão à óbito intra-útero ou logo após o nascimento. Nesse caso, a condição do feto é ainda mais grave, em função da cardiopatia que o mesmo apresenta (resultado de alteração genética).

Os dados acima, nos mostram que o feto um prognóstico reservado, muito provavelmente letal.

(...)

Calcula-se que 95% dos fetos com trissomia 18 sejam abortados espontaneamente, durante a gravidez. Muitos nascem prematuros e 40% dos bebês morrem durante o parto. Entre os recém-nascidos que sobrevivem, estima-se que metade não chegue a completar um ano de vida. A sobrevida média para a síndrome de Edwards varia entre 3 dias e 14 dias. Os 5 a 10% dos pacientes com síndrome de Edwards que sobrevivem além do primeiro ano de vida apresentam severa deficiência mental.”

 

Regina contratou uma advogada que impetrou habeas corpus preventivo em favor de sua cliente.

A impetrante argumentou que as condições clínicas do nascituro eliminavam qualquer possibilidade de vida após o parto e que o presente caso deveria ser enquadrado, por analogia, ao entendimento firmado na ADPF nº 54, na qual o STF decidiu que a interrupção da gravidez de fetos anencefálicos não configura crime de aborto:

Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.

STF. Plenário. ADPF 54, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/04/2012.

 

Além disso, a impetrante defendeu que o dano psicológico à paciente e à sua família deveria ser presumido, uma vez que seriam forçados a continuar com uma gestação sem chances de sucesso.

Diante disso, a impetrante requereu autorização para a interrupção da gravidez, com a concessão de salvo-conduto em favor da paciente (Regina) e de toda a equipe médica envolvida no procedimento, para que suas ações (aborto do feto) não fossem enquadradas nos tipos penais descritos nos arts. 124 e 126 do Código Penal.

 

A discussão chegou até o STJ. Foi concedida autorização para que Regina pudesse realizar a interrupção da gravidez?

NÃO.

Na ADPF 54, proposta com o objetivo de que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo não fosse considerada crime, o STF conferiu interpretação conforme à Constituição. A Corte decidiu que é inconstitucional interpretar que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo constitui crime de aborto (STF. Plenário. ADPF 54, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/04/2012).

No voto condutor, o Ministro Marco Aurélio esclareceu que a questão em análise não tratava da descriminalização do aborto de forma ampla, mas especificamente da interrupção da gravidez em casos de fetos anencéfalos.

A anencefalia é uma condição congênita letal, caracterizada pela ausência parcial ou total do cérebro, sem possibilidade de cura ou desenvolvimento posterior do tecido encefálico.

O crime de aborto visa proteger a vida, mas, no caso da anencefalia, o crime não se configura, pois o feto anencéfalo não possui potencialidade de vida. Não havendo essa potencialidade, não há razão para a proteção jurídico-penal.

O Ministro Marco Aurélio também afirmou que “o feto anencéfalo, mesmo que biologicamente vivo, porque feito de células e tecidos vivos, é juridicamente morto, não gozando de proteção jurídica e (...) principalmente de proteção jurídico-penal. Nesse contexto, a interrupção da gestação de feto anencefálico não configura crime contra a vida - revela-se conduta atípica.”

Dessa forma, a interrupção da gestação de feto anencefálico não constitui crime contra a vida, sendo considerada uma conduta atípica.

A interpretação do STF baseia-se, assim, na inviabilidade da vida extrauterina nesses casos.

Com essa premissa teórica estabelecida, torna-se impossível aplicar o entendimento ao caso em análise, uma vez que, embora o feto tenha uma condição genética grave, com alta probabilidade de letalidade, a documentação médica não confirma a impossibilidade de vida fora do útero. Portanto, não é possível aplicar por analogia a interpretação conforme a Constituição fixada pela ADPF 54 do STF.

Além disso, no caso em questão, não foram identificados elementos objetivos que indicassem risco para a gestante caso a gravidez prosseguisse, o que poderia, em tese, justificar a aplicação da excludente prevista no art. 128, I, do Código Penal:

Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário

I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

(...)

 

Em suma:

Não é possível a concessão de salvo-conduto autorizando a realização de procedimento de interrupção da gravidez, em aplicação, por analogia, do entendimento firmado no julgamento da ADPF n. 54/STF, quando, embora o feto esteja acometido de condição genética com prognóstico grave (Síndrome de Edwards e cardiopatia grave), com alta probabilidade de letalidade, não for possível extrair da documentação médica a impossibilidade de vida fora do útero. 

STJ. 5ª Turma. HC 932.495-SC, Rel. Min. Messod Azulay Neto, julgado em 6/8/2024 (Info 820).


quinta-feira, 12 de setembro de 2024

A parte interpôs um recurso inexistente. Por esse motivo, o recurso não foi conhecido. A parte poderá interpor o recurso correto se ainda estiver dentro do prazo?

Imagine a seguinte situação hipotética:

João ajuizou ação contra Pedro e Paulo.

Paulo, em contestação, alegou a sua ilegitimidade passiva.

Em 30/01/2017, o juiz, em decisão interlocutória, acolheu esse argumento e Paulo foi excluído da lide.

Em 02/02/2017, João interpôs agravo retido contra essa decisão interlocutória.

Em 06/02/2017, o juiz não conheceu do agravo retido proferindo a seguinte decisão:

O autor interpôs agravo retido, recurso que foi extinto pelo novo Código de Processo Civil de 2015, não estando previsto no art. 994. Assim, deixo de conhecer do pedido de fls. 213/215 por se tratar de recurso inexistente. Mantenho a decisão proferida às fls. 203/206 por seus próprios fundamentos.

 

Em 08/02/2017, ou seja, ainda dentro do prazo legal, o autor interpôs agravo de instrumento contra a decisão que reconheceu a ilegitimidade passiva.

Em contrarrazões, Paulo alegou, preliminarmente, ter havido preclusão consumativa, considerando que o autor já havia recorrido da decisão ao interpor o agravo retido.

Argumentou que, em casos de duplicidade recursal, prevalece o primeiro recurso e, assim, o segundo recurso interposto pelo autor não poderia ser conhecido.

 

Os argumentos de Paulo foram acolhidos pelo STJ? Houve preclusão consumativa neste caso?

NÃO.

 

Princípio da taxatividade recursal

De acordo com o princípio da taxatividade recursal, só são considerados recursos aqueles que a lei prevê expressamente. Assim, se não houver previsão legal, a impugnação recursal não existe juridicamente e, por isso, não tem capacidade de produzir efeitos legais.

 

Princípio da unicidade ou unirrecorribilidade

No sistema recursal brasileiro, prevalece o princípio da unicidade ou unirrecorribilidade recursal. Esse princípio determina que, se uma parte apresentar dois recursos contra a mesma decisão, apenas o primeiro será analisado, e o segundo será rejeitado por preclusão consumativa. Isso significa que, uma vez usado o direito de recorrer, ele se esgota, impedindo a análise de recursos apresentados posteriormente.

 

Agravo retido deixou de existir com o CPC/2015

Com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, houve algumas mudanças em relação aos recursos cabíveis. Uma delas foi a eliminação do agravo retido.

No CPC/2015, as decisões interlocutórias devem ser impugnadas por meio de agravo de instrumento, nas situações previstas no art. 1.015 do CPC/2015, ou como preliminar de apelação, nas outras situações.

 

Agravo retido deve ser considerado inexistente

Portanto, se for apresentado um agravo retido contra uma decisão interlocutória, ele deve ser considerado inexistente, em respeito ao princípio da taxatividade recursal.

A preclusão consumativa pressupõe o exercício de uma faculdade ou poder processual.

Como um recurso inexistente não representa validamente a prática de nenhuma faculdade processual, não se pode falar em preclusão consumativa ao apresentá-lo.

Assim, a interposição de um recurso inexistente (agravo retido) não impede que se apresente o recurso válido e cabível (agravo de instrumento) contra a mesma decisão interlocutória, desde que obviamente seja feito no prazo legal. Não houve preclusão consumativa com a interposição do recurso inexistente.

 

Em suma:

A interposição de um recurso inexistente não gera preclusão consumativa, sendo cabível a subsequente interposição do recurso previsto na legislação. 

STJ. 4ª Turma. REsp 2.141.420-MT, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 6/8/2024 (Info 820).


quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Nos contratos de TV por assinatura e internet, são nulas as cláusulas que preveem a responsabilidade do consumidor em indenizar dano, perda, furto, roubo, extravio de quaisquer equipamentos entregues em comodato ou locação pela prestadora de serviço

Imagine a seguinte situação adaptada:

João contratou os serviços de TV por assinatura e internet da NET SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO.

Nos contratos, havia duas cláusulas prevendo que o consumidor deveria indenizar a empresa em caso de dano, perda, furto, roubo ou extravio dos equipamentos entregues pela prestadora de serviços (modem, decodificador, controle remoto etc.).

 

Cláusula 12.01.07 do contrato de prestação de serviço de TV por assinatura: previa que, se houver qualquer dano, perda, furto, roubo ou extravio dos equipamentos, o assinante será responsabilizado e terá que pagar o valor correspondente à operadora.

A cláusula estava assim redigida:

Cláusula 12.01.07: No caso do(s) equipamento(s) ser cedido em regime de comodato ou de locação, o ASSINANTE ficará responsável pelo bem assumindo inteira responsabilidade, na qualidade de fiel depositário, pela guarda e integridade do equipamento, na forma dos artigos 579 a 585 e 565 a 576 do Código Civil Brasileiro, respectivamente, devendo restitui-los à OPERADORA, mediante visita desta previamente agendada com o ASSINANTE, caso haja rescisão do presente contrato, respondendo ainda nas hipóteses de dano, perda, furto, roubo e/ou extravio do aludido equipamento, que, em qualquer dos casos, gerarão a cobrança do valor do equipamento pela OPERADORA ao ASSINANTE.

 

Cláusula 10.01.07 do contrato Net Vírtua: esta cláusula é similar à anterior, mas se refere especificamente ao equipamento cable modem. O assinante também é responsável pela guarda e integridade do cable modem e deve devolvê-lo à operadora caso o contrato seja encerrado. Em casos de dano, perda, furto, roubo ou extravio, o assinante será responsabilizado e precisará pagar pelo equipamento.

Cláusula 10.01.07: No caso do equipamento cable modem ser cedido em regime de comodato ou de locação, o ASSINANTE ficará responsável pelo bem assumindo inteira responsabilidade, na qualidade de fiel depositário, pela guarda e integridade do cable modem, na forma dos artigos 579 a 585 e 565 a 576 do Código Civil Brasileiro, respectivamente, devendo restitui-los à OPERADORA, mediante visita desta previamente agendada com o ASSINANTE, caso haja rescisão do presente contrato, respondendo ainda nas hipóteses de dano, perda, furto, roubo e/ou extravio do aludido equipamento, que, em qualquer dos casos, gerarão a cobrança do valor do equipamento pela OPERADORA ao ASSINANTE.

 

Ocorre que, alguns meses depois de assinados os contratos de TV e internet, João foi vítima de um furto em sua residência. Um ladrão entrou na residência e, dentre outros bens, subtraiu os dois decodificadores da NET.

O consumidor constatou que aquele bairro havia se tornado muito perigoso e decidiu encerrar o contrato de locação do imóvel onde residia. Como consequência, solicitou também o cancelamento dos contratos de serviços firmados com a NET.

A empresa, no entanto, exigiu o pagamento do valor dos equipamentos furtados, cobrando a quantia de R$ 895,00 como ressarcimento pelos decodificadores digitais e dois smart cards subtraídos.

O consumidor explicou à empresa o que ocorreu, além de ter apresentado o boletim de ocorrência referente ao crime do qual foi vítima. Mesmo assim, a NET manteve a cobrança e incluiu o nome do consumidor no cadastro de inadimplentes.

 

Ação civil pública

Após tomar conhecimento de diversas ações semelhantes à de João, o Ministério Público de São Paulo ajuizou ação civil pública em face da NET SERVIÇOS, com a finalidade de declarar nula toda e qualquer cláusula que preveja a responsabilidade do consumidor em indenizar as hipóteses de dano, perda, furto, roubo ou extravio de qualquer equipamento entregue a ele em comodato ou locação.

O Parquet alegou que a cláusula é nula, pois envolve renúncia de direitos e transfere ao consumidor o risco da atividade do fornecedor. Também afirmou que essa prática configura venda casada, já que o comodato ou locação dos equipamentos é imposto aos assinantes como condição para o serviço.

Por fim, apontou que a cláusula cria uma desvantagem excessiva para o consumidor, que só pode adquirir o produto diretamente da empresa, por um preço definido unilateralmente.

O juiz julgou os pedidos procedentes, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao recurso da NET e reformou a sentença por entender que as cláusulas não violaram o Código de Defesa do Consumidor.

Diante disso, o Ministério Público interpôs recurso especial insistindo na tese da abusividade dessas cláusulas.

 

O STJ concordou com os argumentos do MP?

SIM.

Nos contratos de TV por assinatura e internet, o consumidor pode escolher a prestadora, mas não tem liberdade para escolher com quem vai fazer o contrato de comodato ou locação dos equipamentos necessários para usar o serviço.

Normalmente, locação e comodato são contratos principais no direito privado. Porém, no contexto do consumo, eles são contratos acessórios que vêm obrigatoriamente junto com a contratação dos serviços de TV por assinatura e internet.

Assim, se o consumidor não tem a opção de comprar os equipamentos e é obrigado a aceitar o comodato ou a locação impostos pela operadora, é abusiva a cláusula que responsabiliza o consumidor pela perda ou dano dos equipamentos, mesmo em situações de caso fortuito ou força maior.

Manter cláusulas que transferem todo o risco para o consumidor em contratos de adesão, feitos unilateralmente pelo fornecedor, é uma prática abusiva que gera um desequilíbrio contratual, colocando o consumidor em desvantagem.

Por outro lado, retirar essa cláusula não prejudica o fornecedor, pois, se o consumidor alegar caso fortuito ou força maior (como um roubo), ele terá que provar que o evento realmente aconteceu.

 

Em suma:

Nos contratos de prestação de serviços de TV por assinatura e internet, são nulas as cláusulas que preveem a responsabilidade do consumidor em indenizar dano, perda, furto, roubo, extravio de quaisquer equipamentos entregues em comodato ou locação pela prestadora de serviço. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.852.362-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 6/8/2024 (Info 820).


segunda-feira, 9 de setembro de 2024

INFORMATIVO Comentado 820 STJ (completo e resumido)

Olá, amigas e amigos do Dizer o Direito,

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Confira abaixo o índice. Bons estudos.

ÍNDICE DO INFORMATIVO 820 DO STJ


DIREITO CONSTITUCIONAL

TRIBUNAL DE CONTAS

§  Os Tribunais de Contas possuem competência para julgar atos praticados por prefeitos na condição de ordenadores de despesas, podendo aplicar sanções.

 

DIREITO ADMINISTRATIVO

TEMAS DIVERSOS

§  É lícito ao Poder Judiciário determinar que o Poder Público realize estudo para identificar núcleos urbanos informais consolidados, áreas de risco e áreas de relevante interesse ecológico, no caso de omissão estatal.

 

AÇÃO POPULAR

§  A ação popular tem por objetivo a tutela de direitos transindividuais não servindo para a mera tutela patrimonial dos cofres estatais, nem para a contraposição pura e simples da atividade administrativa, tampouco para a defesa de interesses do cidadão figurante no polo ativo.

 

DIREITO CIVIL

CONDOMÍNIO EDILÍCIO

§  A vedação à alienação de vaga de garagem com matrícula própria para terceiro estranho ao condomínio, sem autorização expressa na convenção condominial, prevalece mesmo no caso de alienação judicial por hasta pública.

 

DIREITO DO CONSUMIDOR

PRÁTICAS COMERCIAIS

§  Nos contratos de TV por assinatura e internet, são nulas as cláusulas que preveem a responsabilidade do consumidor em indenizar dano, perda, furto, roubo, extravio de quaisquer equipamentos entregues em comodato ou locação pela prestadora de serviço.

 

DIREITO EMPRESARIAL

PROPRIEDADE INDUSTRIAL

§  A divulgação de novidade estética de desenho industrial que não possui registro perante o INPI resulta imediata incorporação ao estado da arte, possibilitando sua utilização por terceiros, independentemente de autorização.

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

RECURSOS

§  A interposição de um recurso inexistente não gera preclusão consumativa, sendo cabível a subsequente interposição do recurso previsto na legislação.

  

DIREITO PENAL

ABORTO

§  Não é possível autorizar o aborto em caso de feto com Síndrome de Edwards; essa condição não se equipara ao feto anencéfalo.

 

ESTUPRO DE VULNERÁVEL

§  Não houve estupro de vulnerável em caso de homem de 29 anos que se relacionou com uma adolescente de 13 anos, tendo havido consentimento da família, manutenção do relacionamento até os dias atuais e nascimento de um filho fruto da relação.

 

DIREITO PROCESSUAL PENAL

INCIDENTES E MEDIDAS CAUTELARES

§  Na aplicação do art. 24-A do Estatuto da Advocacia, se não houver indícios de fraude na fixação dos honorários advocatícios, deve-se liberar integralmente o valor acordado, desde que não exceda 20% do patrimônio bloqueado.

 

PROVAS

§  É nulo o reconhecimento fotográfico realizado através da apresentação informal de foto via aplicativo de mensagens.

 

DIREITO TRIBUTÁRIO

TEMAS DIVERSOS

§  A invalidação, pelo Judiciário, de ato do CARF lesivo ao patrimônio público, seja ele favorável ou contrário ao Fisco, somente é possível quando eivado de manifesta ilegalidade, contrário a sedimentados precedentes jurisdicionais ou incorrido em desvio ou abuso de poder.

 

DIREITO INTERNACIONAL

CONVENÇÃO DE HAIA

§  É competente a Justiça estrangeira para determinar a expedição de passaportes e para as demais questões relacionadas à saída de crianças de país no exterior quando este for o local de domicílio delas e de seus genitores.


sábado, 7 de setembro de 2024

A partir da vigência do CPC/2015, é cabível ação autônoma para cobrança e definição de honorários advocatícios quando a decisão transitada em julgado for omissa

Imagine a seguinte situação hipotética:

Eduardo e Wilson ajuizaram ação contra a empresa Alfa Ltda.

A ré, assistida pelo advogado Rafael, arguiu, na contestação, a ilegitimidade de Eduardo para figurar no polo ativo da ação.

O juiz, em decisão interlocutória, acolheu o argumento e determinou a exclusão de Eduardo do polo ativo.

Vale ressaltar que, nessa decisão interlocutória, o magistrado não condenou Eduardo a pagar honorários advocatícios sucumbenciais.

Nem Eduardo nem a empresa Alfa recorreram contra essa decisão.

Assim, o processo seguiu envolvendo unicamente entre Wilson e Alfa.

Em outubro de 2019, a empresa Alfa foi condenada. A sentença transitou em julgado.

 

Ação autônoma cobrando honorários advocatícios

Em janeiro de 2020, Dr. Rafael, o advogado, ajuizou, contra Eduardo, de forma autônoma, ação pedindo a estipulação e o pagamento de honorários advocatícios.

Rafael argumentou que, na decisão interlocutória, o juiz deixou de condenar Eduardo ao pagamento dos honorários mesmo sendo eles devidos.

 

É cabível essa ação?

SIM.

Sob a égide do Código de Processo Civil (CPC/1973), editou-se a Súmula nº 453/STJ, cujo enunciado estabelece que:

Súmula 453-STJ: Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria.

Aprovada em 18/08/2010, DJe 24/08/2010.

 

Assim, vigorava no CPC/1973, o entendimento de que, quando ausente condenação em honorários advocatícios na decisão judicial, a parte deveria opor embargos de declaração a fim de sanar tal omissão.

Se já tivesse havido o trânsito em julgado da decisão, caberia somente ação rescisória por violação literal do art. 20 do CPC/1973, sendo descabida a cobrança de honorários em execução ou ação autônoma.

Vale ressaltar, contudo, que a matéria foi significativamente alterada pelo CPC/2015, o qual estabeleceu em seu art. 85, §18, o cabimento de ação autônoma para definição e cobrança de honorários quando a decisão transitada em julgado for omissa:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

(...)

§ 18. Caso a decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários ou ao seu valor, é cabível ação autônoma para sua definição e cobrança.

 

Em razão da alteração legislativa, a doutrina leciona que houve a superação parcial da Súmula nº 453/STJ, apenas no tocante à (im)possibilidade de ajuizamento de ação autônoma:

“(Des)necessidade de embargos de declaração. Segundo o STJ, ‘os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria’ (Súmula 453). O CPC/2015 modifica esse entendimento, e possibilita, de forma expressa, a propositura de ação autônoma para definição e cobrança dos honorários advocatícios não fixados em sentença omissa transitada em julgado independentemente da interposição de embargos de declaração (§ 18). A Súmula 453 do STJ está, portanto, superada” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil Comentado, 3ª edição. Disponível em: STJ Minha Biblioteca, Grupo GEN, 2018).

 

Em suma:

A partir da vigência do CPC/2015, é cabível ação autônoma para cobrança e definição de honorários advocatícios quando a decisão transitada em julgado for omissa. 

STJ. 3ª Turma. REsp 2.098.934-RO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 5/3/2024 (Info 819).

 

Cabia honorários advocatícios na época? Cabem honorários advocatícios da decisão interlocutória que determina a exclusão de litisconsorte?

SIM. Na hipótese de exclusão de litisconsorte, os honorários devem ser arbitrados de maneira proporcional à parcela do pedido efetivamente apreciada, sendo que o Juiz não está obrigado a fixar, em

benefício do advogado da parte excluída, honorários advocatícios sucumbenciais mínimos de 10% sobre o valor da causa. Nesse sentido:

A teor do Enunciado nº 5 da I Jornada de Direito Processual Civil, ao proferir decisão parcial de mérito ou decisão parcial fundada no art. 485 do CPC, condenar-se-á proporcionalmente o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, nos termos do art. 85 do CPC.

Isso significa que o juiz, ao reconhecer a ilegitimidade ad causam de um dos litisconsorte passivos e excluí-lo da lide, não está obrigado a fixar, em seu benefício, honorários advocatícios sucumbenciais mínimos de 10% sobre o valor da causa.

O art. 85, § 2º, do NCPC, ao estabelecer honorários advocatícios mínimos de 10% sobre o valor da causa, teve em vista decisões judiciais que apreciassem a causa por completo, ou seja, decisões que, com ou sem julgamento de mérito, abrangessem a totalidade das questões submetidas a juízo. Tratando-se de julgamento parcial da lide, os honorários devem ser arbitrados de forma proporcional a parcela do pedido efetivamente apreciada.

STJ. 3ª Turma. REsp n. 1.760.538/RS, Min. Rel. Nancy Andrighi, DJe de 26/5/2022.


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