COMPETÊNCIA PARA DECLARAR A NULIDADE DO REGISTRO DE MARCA
Imagine a seguinte situação:
A empresa Goiás Refrigerantes S/A registrou, no Instituto
Nacional de Propriedade Industrial (INPI), a marca JOCA COLA.
Ao tomar conhecimento disso, a “The Coca Cola Company”
ajuizou ação contra a empresa Goiás Refrigerantes S/A e contra o INPI pedindo a
nulidade desse registro.
A autora alegou que a marca impugnada JOCA COLA causa
confusão nos consumidores com a marca COCA-COLA, registrada anteriormente.
A competência para julgar essa demanda será da Justiça
Federal.
A competência para examinar
qualquer alegação de nulidade do registro de uma marca é da Justiça Federal.
Isso porque, nessa situação, haverá interesse jurídico do INPI na demanda,
considerando que foi essa autarquia federal que concedeu o registro, incidindo,
portanto, na hipótese do art. 109, I, da CF/88:
Art. 109. Aos juízes federais compete
processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade
autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de
autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes
de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
No mesmo sentido, prevê a Lei nº
9.279/96:
Art. 175. A ação de nulidade do
registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for
autor, intervirá no feito.
Vale ressaltar que a Justiça Estadual não pode
declarar a nulidade do registro da marca nem mesmo incidentalmente em uma ação
na qual dois particulares discutem quem pode usar a marca
Imagine agora outra situação:
A Escola de Educação Infantil Poliedro Ltda. propôs ação
contra o Sistema de Ensino Poliedro Vestibulares Ltda. pedindo que o réu fosse
proibido de utilizar o termo “Poliedro” como marca.
A competência para julgar essa ação é da Justiça Estadual
porque não há interesse direto e específico do INPI, sendo uma disputa entre
particulares.
O réu apresentou reconvenção alegando que ele é quem é o
titular (detentor) da marca “Poliedro”.
A Justiça Estadual, incidentalmente, decidiu que essa
palavra (“Poliedro”) não poderia ter sido registrada como marca. Logo, o
registro seria nulo.
Essa decisão não foi acertada porque a Justiça Estadual não
tem competência para declarar a nulidade do registro de marca, mesmo que
incidentalmente em uma ação de obrigação de não fazer. Nesse sentido:
Não pode o Tribunal de Justiça
Estadual, em ação de abstenção de uso de marca, afastar o pedido da
proprietária da marca declarando a nulidade do registro ou irregularidade da
marca, eis que lhe carece competência.
STJ. 4ª Turma. REsp 1393123-SP, Rel.
Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 18/02/2020 (Info 667).
COMPETÊNCIA PARA DECLARAR A NULIDADE DO REGISTRO DE PATENTE
E DESENHO INDUSTRIAL
Patente
Patente é um título de propriedade temporária concedido pelo
INPI para a pessoa que inventou um novo produto, um novo processo ou para quem
fez aperfeiçoamentos destinados à aplicação industrial. Em outras palavras, a
patente é concedida ao autor de uma invenção ou de um modelo de utilidade.
Desenho industrial
O desenho industrial protege a configuração externa de um
objeto tridimensional ou um padrão ornamental (bidimensional) que possa ser
aplicado a uma superfície ou a um objeto. O desenho industrial insere no
mercado uma inovação estética em objeto comum ou facilmente reproduzível em
escala industrial.
Para que um desenho possa ser registrado como
“desenho industrial”, ele deverá preencher os seguintes requisitos:
a) Novidade (é um conceito difícil de explicar; significa
que o desenho não pode ser nenhum que já existe segundo o estado
atual da técnica);
b) Originalidade (deve ter uma configuração visual diferente
dos outros já existentes);
c) Utilização ou aplicação industrial (deve ser possível
reproduzir este desenho industrialmente).
Obs: tanto a patente como o desenho industrial são
registrados no INPI.
De quem é a competência para julgar ação na qual se
pede a nulidade do registro de patente ou a nulidade de desenho industrial?
Justiça Federal. A ação na qual se pede a nulidade do
registro de patente ou de desenho industrial deve ser proposta contra o INPI e
julgada na Justiça Federal (art. 109, I, da CF/88 e art. 175 da Lei nº
9.279/96).
E se o pedido de nulidade for incidental, será
possível que seja apreciado pela Justiça Estadual?
Imagine a seguinte situação hipotética:
Alan é um inventor. Ele idealiza coisas novas.
Alan registrou, no INPI, uma patente e um desenho
industrial.
Determinado dia, Alan percebeu que uma empresa estava
utilizando, sem a sua autorização, produto que violava a sua patente. Além
disso, a mesma empresa usava, indevidamente, o seu desenho industrial em um
produto.
Diante disso, ele ajuizou ação de infração contra a empresa
pedindo para que a ré se abstenha de fabricar e comercializar qualquer produto
relacionado com a sua patente e com seu desenho industrial.
A empresa se defendeu alegando a nulidade do registro da
patente e a nulidade do registro do desenho industrial.
Essa alegação pode ser feita na Justiça Estadual? O
juiz estadual poderá julgar a ação de infração levando em consideração essa
alegação de nulidade do registro?
SIM.
Em ação de infração de patente e desenho industrial, é possível
a arguição incidental de nulidade de tais direitos de propriedade industrial,
como matéria de defesa, perante a justiça estadual.
STJ. 3ª Turma. REsp
1.843.507-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 06/10/2020 (Info
682).
Quanto à MARCA, vimos acima que o art. 175 da Lei de
Propriedade Industrial exige que a ação de nulidade do registro de marca seja
ajuizada no foro da Justiça Federal, devendo o INPI, quando não for o autor,
necessariamente intervir no feito. Não há, na lei, qualquer exceção a essa
regra.
Quanto à PATENTE e ao DESENHO INDUSTRIAL, a situação é
diferente.
O art. 56, § 1º e o art. 118, da
Lei nº 9.279/96 preveem a possibilidade de arguição da nulidade de patentes e
de desenhos industriais como matéria de defesa em ações de infração, de
competência da Justiça Estadual, dispensando, nesses casos, a participação do INPI. Veja:
Art. 56. A ação de nulidade poderá ser
proposta a qualquer tempo da vigência da patente, pelo INPI ou por qualquer
pessoa com legítimo interesse.
§ 1º A nulidade da patente poderá ser
arguida, a qualquer tempo, como matéria de defesa.
(...)
Art. 118. Aplicam-se à ação de
nulidade de registro de desenho industrial, no que couber, as disposições dos
arts. 56 e 57.
O STJ, ao interpretar
esses dispositivos, entende que, embora, não seja possível o reconhecimento
incidental da nulidade de marcas, o exame incidenter tantum da nulidade
de patentes e de desenhos industriais se mostra perfeitamente possível,
decorrendo essa possibilidade de determinação expressa de lei.
Não haveria aí uma violação à competência da Justiça
Federal?
NÃO. Isso porque a competência federal para julgamento das
ações de nulidade de registro de patente ou de desenho industrial é uma
competência determinada em razão da pessoa (presença do INPI), e não em razão
da matéria.
Não é a Constituição Federal, mas sim a própria Lei nº
9.279/96 quem determina a participação do INPI nas ações de nulidade de marcas,
patentes e desenhos industriais, respectivamente nos arts. 175, 57 e 118.
Não há qualquer óbice, portanto, a que essa mesma lei
preveja uma exceção a essa regra nos arts. 56, § 1º, e 118, ressalvando
expressamente a possibilidade de arguição da nulidade de patentes e de desenhos
industriais como matéria de defesa em ações de infração, de competência da
Justiça Estadual, dispensando, nesses casos, a participação do INPI.
Não faz coisa julgada material
Vale ressaltar, por fim, que o reconhecimento da nulidade de
patentes e de desenhos industriais pelo juízo estadual, por ocorrer apenas incidenter
tantum, não faz coisa julgada e não opera efeitos para fora do processo,
tendo apenas o condão de levar à improcedência do pedido veiculado na ação de
infração.
Embargos de divergência
Ao julgar embargos de divergência, a 2ª Seção decidiu que
deveria prevalecer o entendimento acima explicado e materializado no REsp
1.843.507-SP.
A 2ª Seção do STJ decidiu que:
É possível a arguição de nulidade como matéria de
defesa em ação de infração de desenho industrial.
STJ. 2ª Seção.
EREsp 1.332.417-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/6/2024 (Info 818).