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quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Comentários à Súmula 669 do STJ

Súmula 669-STJ: O fornecimento de bebida alcóolica a criança ou adolescente, após o advento da Lei n. 13.106, de 17 de março de 2015, configura o crime previsto no art. 243 do ECA.

STJ. 3ª Seção. Aprovada em 12/06/2024, DJe 17/06/2024 (Info 817).

 

A Lei nº 13.106/2015 promoveu três mudanças no ordenamento jurídico:

1) alterou a redação do crime previsto no art. 243 do ECA;

2) revogou o inciso I do art. 63 da Lei das Contravenções Penais;

3) incluiu mais uma medida infração administrativa no ECA (art. 258-C).

 

Vejamos a alteração promovida no crime do art. 243 do ECA:

 

ECA

Antes da Lei 13.106/2015

Depois da Lei 13.106/2015

Art. 243. Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida:

 

Pena — detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.

Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica:

 

Pena — detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.

 

Antes da Lei nº 13.106/2015, quem fornecia bebida alcoólica a criança ou adolescente cometia crime do art. 243 do ECA?

Havia duas correntes sobre o tema:

1ª corrente: sustentava que sim. Isso porque a bebida alcóolica seria uma espécie de produto “cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica”. Logo, mesmo antes da Lei nº 13.106/2015, essa conduta já configuraria o crime do art. 243 do ECA.

2ª corrente: NÃO. O STJ entende que o art. 243 do ECA, ao mencionar “produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica”, não abrangia as bebidas alcoólicas. Isso porque o ECA, quando quis se referir às bebidas alcoólicas, o fez expressamente, como no caso do art. 81, II e III, que prevê punições administrativas para essa venda:

Art. 81. É proibida a venda à criança ou ao adolescente de:

II — bebidas alcoólicas;

III — produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida;

 

E o agente ficava sem nenhuma punição penal? Antes da Lei nº 13.106/2015, quem fornecia bebida alcoólica a criança ou adolescente possuía algum tipo de responsabilização penal?

O sujeito que “servia” bebida alcoólica para crianças e adolescentes não cometia crime, mas respondia pela contravenção penal que era prevista no art. 63, I do Decreto-lei nº 3.688/41:

Art. 63. Servir bebidas alcoólicas:

I — a menor de dezoito anos;

(...)

Pena — prisão simples, de dois meses a um ano, ou multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis.

 

Assim, a conduta de fornecer bebidas alcoólicas para crianças e adolescentes, apesar de gravíssima, não era crime. O agente respondia apenas por contravenção penal.

Veja um julgado do STJ espelhando esse entendimento:

(...) A entrega a consumo de bebida alcoólica a menores é comportamento deveras reprovável. No entanto, é imperioso, para o escorreito enquadramento típico, que se respeite a pedra angular do Direito Penal, o princípio da legalidade. Nesse cenário, em prestígio à interpretação sistemática, levando em conta os arts. 243 e 81 do ECA, e o art. 63 da Lei de Contravenções Penais, de rigor é o reconhecimento de que neste último comando enquadra-se o comportamento em foco. (...)

(STJ. 6ª Turma. HC 167.659/MS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 07/02/2013)

 

O que fez a Lei nº 13.106/2015?

• Passou a prever, expressamente, que é crime vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar bebida alcoólica a criança ou a adolescente.

• Revogou a contravenção penal prevista no art. 63, I, considerando que esta conduta agora é punida pelo art. 243 do ECA.


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