Dizer o Direito

terça-feira, 25 de junho de 2024

Menor de 18 anos pode fazer supletivo para antecipar a conclusão do ensino médio?

Imagine a seguinte situação hipotética:

Douglas, 16 anos de idade, foi aprovado no vestibular para cursar Direito na Universidade Federal.

O problema é que ainda está cursando o primeiro ano do ensino médio.

Diante disso, ele solicitou ao Coordenador do Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA) que pudesse fazer um exame supletivo com o conteúdo do ensino médio e que, se fosse aprovado, recebesse o certificado de conclusão do ensino médico.

O Coordenador negou o requerimento sob a justificativa de que o pedido não atendia aos requisitos legais previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/96), especialmente em razão da idade do requerente.

 

O que é o CEJA?

O Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA) é um estabelecimento de ensino destinado a oferecer educação básica para jovens e adultos que não tiveram acesso ou não completaram os estudos durante a idade escolar regular.

Os CEJAs oferecem cursos que correspondem aos níveis do ensino fundamental e médio, e são estruturados para atender às necessidades específicas de seu público-alvo, levando em conta a flexibilidade de horários e metodologias adaptadas para adultos.

Essas instituições fazem parte do sistema público de educação, ou seja, são oferecidas pelo governo.

 

O que entende por “educação básica”?

A educação básica é dividida em três etapas: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio.

 

Douglas impetrou mandado de segurança contra o ato do Coordenador do CEJA. Pediu que a autoridade coatora fosse obrigada a lhe aplicar o exame de proficiência (supletivo) e, no caso de aprovação, que lhe fosse concedido o certificado de conclusão do ensino médio.

Em 2022, a liminar foi deferida e a segurança foi concedida. O juiz afirmou que:

É desarrazoado impedir o impetrante de submeter-se ao exame de conclusão do ensino médio elaborado pelo Centro de Educação dos Jovens e Adultos-CEJA, pelo simples fato de não ter alcançado o limite etário exigido, desprestigiando o esforço intelectual do aluno simplesmente, em face do requisito etário infraconstitucional exigido para emissão do Certificado de Conclusão do Ensino Médio.

Por essa razão, a meu sentir, resta devidamente comprovada a alta capacidade intelectiva exigida para o ingresso no Ensino Superior, cuja construção se opera no decorrer do Ensino Médio, evidenciando ter o Impetrante assimilado o conhecimento exigido para o avanço. (...)

A vista do exposto, CONCEDO a segurança e confirmo a liminar para determinar que autoridade coatora submeta o impetrante ao exame supletivo em questão e, caso seja aprovada, emita o respectivo certificado.

 

Douglas fez a prova do supletivo e foi aprovado.

O Tribunal de Justiça manteve a sentença.

O Estado-membro interpôs recurso especial.

 

O pedido de Douglas está de acordo com a jurisprudência atual do STJ?

NÃO. O STJ firmou a tese de que:

Não é possível menor de 18 (dezoito) anos que não tenha concluído a educação básica se submeter ao sistema de avaliação diferenciado de jovens e adultos, normalmente oferecido pelos Centros de Jovens e Adultos - CEJAs, visando a aquisição de diploma de conclusão de ensino médio para fins de matrícula em curso de ensino superior. 

STJ. 1ª Seção. REsps 1.945.851-CE e 1.945.879-CE, Rel. Min.  Afrânio Vilela, julgado em 22/5/2024 (Recurso Repetitivo – Tema 1127) (Info 813).

 

O art. 38, § 1º, da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) prevê idades mínimas para que o interessado possa fazer o exame supletivo. Para a conclusão do ensino médio, exige-se a idade mínima de 18 anos:

Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular.

§ 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:

I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos;

II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos.

(...)

 

Essa prova supletiva faz parte da chamada do sistema de educação de jovens e adultos (EJA), que tem por finalidade viabilizar o acesso ao ensino a quem não teve possibilidade de ingresso na idade própria e recuperar o tempo perdido.

A EJA não foi idealizada para permitir que jovens com idade abaixo de 18 anos possam ingressar em instituição de ensino superior.

Não se pode perder de vista que existe todo um planejamento acadêmico, científico e econômico, o qual, além do aprendizado, busca equalizar e distribuir os recursos na educação. Essa estrutura construída mediante o preenchimento das diversas etapas do sistema educacional deve ser preservada, de modo a manter a integridade do processo de formação escolar. Tentar cursar a série que bem entender, iria contra toda a estrutura acadêmica desenvolvida, em frontal burla ao sistema

Além disso, a lei é clara ao estabelecer idades mínimas. Devem ser respeitadas as opções constitucionalmente existentes, dentre as diversas do Legislativo e do Executivo. Não cabe ao Judiciário ignorar e desconsiderar o debate feito pelos órgãos legítimos e impor sua opinião com base em razoabilidade, desrespeitando a separação das funções do Estado e o próprio Estado Democrático de Direito.

O jovem menor de 18 anos, que tenha condições postas no art. 24 da Lei nº 9.394/96, poderá evoluir e ultrapassar séries, sob aferição da escola, e não antecipando o exame que o colocará no ensino superior.

Portanto, não é possível menor de 18 (dezoito) anos que não tenha concluído a educação básica se submeter ao sistema de avaliação diferenciado de jovens e adultos, normalmente oferecidos pelos Centros de Jovens e Adultos - CEJAs, visando a aquisição de diploma de conclusão de ensino médio para fins de matrícula em curso de ensino de educação superior.

 

No caso hipotético, Douglas, antes dessa decisão do STJ, já havia conseguido decisões favoráveis à realização do supletivo. Ele será prejudicado com esse entendimento do STJ?

NÃO. Isso porque o STJ decidiu modular os efeitos do julgado para manter a consequência das decisões judiciais que autorizaram menor de 18 anos que não tenha concluído a educação básica se submeter ao sistema de avaliação diferenciado de jovens e adultos proferidas até a data da publicação do acórdão.


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