Dizer o Direito

domingo, 30 de junho de 2024

Fazenda Pública quer obter indenização de um particular. Qual é o prazo prescricional?

Imagine a seguinte situação hipotética:

Em 11 de novembro de 2013, João, empregado da Alfa Ltda, sofreu um grave acidente de trabalho.

Em razão do acidente, em 27/11/2013, João passou a receber auxílio-doença (atualmente chamada de auxílio por invalidez temporária), custeado pelo INSS.

Ocorre que o auditor-fiscal do trabalho constatou que o acidente havia sido causado por inobservância de normas básicas de segurança no trabalho por parte da Alfa Ltda, tendo autuado a empresa em razão das falhas detectadas e que foram determinantes para o acidente que vitimou João.

Em 01 de julho de 2018, o INSS, de posse desse auto de infração, ajuizou ação regressiva acidentária contra a Alfa Ltda, buscando o ressarcimento dos valores gastos com o pagamento do auxílio-doença a João.

 

Qual é o fundamento jurídico para essa ação proposta pelo INSS?

O art. 120 da Lei nº 8.213/91, sob o argumento de que a empresa foi negligente nos padrões de segurança, o que ocasionou o acidente. Confira:

Art. 120. A Previdência Social ajuizará ação regressiva contra os responsáveis nos casos de:

I - negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva;

II - violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.

 

Essa demanda do INSS será proposta na Justiça do Trabalho ou Justiça Comum?

Justiça federal comum.

Compete à Justiça comum processar e julgar ação proposta pelo INSS objetivando o ressarcimento dos valores despendidos com o pagamento de pecúlio e pensão por morte acidentária, em razão de acidente de trabalho ocorrido nas dependências da empresa ré, por culpa desta. O litígio não tem por objeto a relação de trabalho em si, mas sim o direito regressivo da autarquia previdenciária, que é regido pela legislação civil.

STJ. 2ª Seção. CC 59.970/RS, Rel. Min. Castro Filho, julgado em 13/09/2006.

 

Trata-se de competência da justiça federal porque o INSS é uma autarquia federal (art. 109, I, da CF/88).

 

Em sua defesa, a empresa alegou que paga regularmente a contribuição para o SAT (Seguro de Acidente de Trabalho), destinada a custear benefícios do INSS oriundos de acidente de trabalho ou doença ocupacional. Logo, o INSS não poderia cobrar dela o ressarcimento pelos valores pagos da pensão por morte, considerando que isso já estaria coberto pelo SAT. Tal tese é aceita pela jurisprudência?

NÃO. Segundo o STJ, a contribuição ao SAT não exime o empregador da sua responsabilização por culpa em acidente de trabalho, conforme art. 120 da Lei nº 8.213/1991 (STJ. 2ª Turma. AgRg no AREsp 294.560/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 27/03/2014).

 

Qual é o prazo prescricional dessa ação proposta pelo INSS contra a empresa?

5 anos.

O prazo prescricional das ações propostas contra a Fazenda Pública é de 5 anos, com base no art. 1º do Decreto 20.910/1932:

Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

 

Mas o art. 1º do Decreto fala em ação proposta contra a Fazenda Pública. No exemplo dado, a ação foi proposta pelo INSS contra o particular...

Mesmo assim, deve-se aplicar o art. 1º do Decreto 20.910/1932. Isso com base no princípio da isonomia.

Ora, se a demanda indenizatória ajuizada contra a Fazenda Pública está sujeita ao prazo de 5 anos, esse mesmo prazo deve ser aplicado para a demanda proposta pela Fazenda Pública contra o particular.

 

Qual é o termo inicial do prazo prescricional: o dia do acidente (11/11/2013) ou a data da concessão do benefício (27/11/2013)?

A data da concessão do benefício.

Em nosso exemplo acima, como o auxílio-doença foi concedido em 27/11/2013 e ação foi proposta 01 de julho de 2018, conclui-se que não se passaram mais de cinco anos, razão pela qual a pretensão não está prescrita.

 

Em suma:

Em respeito ao princípio da isonomia, o lapso prescricional da demanda indenizatória ajuizada pelo ente estatal deverá obedecer ao mesmo prazo quinquenal do art. 1º do Decreto n. 20.910/1932, previsto para as ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública. 

STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 2.100.988-PE, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 8/4/2024 (Info 814).


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