Imagine a seguinte situação
hipotética:
João praticou o crime de dano qualificado, delito previsto
no art. 163, parágrafo único, III, do Código Penal:
Art. 163. Destruir, inutilizar ou
deteriorar coisa alheia:
(...)
Dano qualificado
Parágrafo único. Se o crime é
cometido:
(...)
III - contra o patrimônio da
União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia, fundação
pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária
de serviços públicos;
(...)
Pena - detenção, de seis meses a
três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
O Ministério Público do Estado,
constatando a presença dos requisitos do art. 28-A do CPP, ofereceu proposta de
acordo de não persecução penal (ANPP), que foi aceito por João.
Uma das condições estabelecidas
no ANPP foi a de que João deveria pagar prestação pecuniária no valor de um
salário-mínimo, a ser destinado à Fundação Bem Viver.
O juiz não homologou o ANPP
sob o argumento de que no acordo não deve constar o nome da entidade
destinatária da prestação pecuniária, considerando que isso deve ser decidido
pelo Juízo da Execução Penal, nos termos do inciso IV do art. 28-A do CPP:
Art. 28-A. (...)
IV - pagar prestação pecuniária,
a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse
social, a ser indicada pelo juízo da execução, que
tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou
semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou
O Ministério Público não
concordou interpôs recurso em sentido estrito.
O
Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso e confirmou a decisão que
deixou de homologar o ANPP.
Ainda inconformado, o Ministério
Público interpôs recurso especial.
Argumentou que não caberia ao
Poder Judiciário negar a homologação do ANPP livremente pactuado entre o
Ministério Público e o investigado, cerceando a escolha realizada por estes.
O STJ deu provimento ao
recurso do Ministério Público?
NÃO.
Segundo o art. 28-A, IV, do CPP o
ANPP pode envolver o pagamento de prestação pecuniária, cujo destino será
determinado pelo juízo da execução penal, preferencialmente a uma entidade
pública ou de interesse social que proteja bens jurídicos semelhantes aos
lesados pelo delito.
A literalidade da norma de
regência indica que, embora caiba ao Ministério Público a propositura do ANPP,
a partir da ponderação da discricionariedade do Parquet como titular da ação
penal, compete ao Juízo da Execução a escolha da instituição beneficiária dos
valores.
Vale ressaltar que, recentemente,
o STF declarou a constitucionalidade do art. 28-A, do CPP, inclusive deste
inciso IV (STF. Plenário. ADI 6.305/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em
24/08/2023. Info 1106).
Portanto, não há dúvidas de que
esse dispositivo legal deverá ser cumprido.
Em suma:
Compete ao Juízo da Execução Penal a escolha da
instituição beneficiária dos valores da prestação pecuniária ajustada no acordo
de não persecução penal.
STJ. 5ª Turma. AREsp 2.419.790-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em
6/2/2024 (Info 800).