NOÇÕES GERAIS SOBRE A MULTA
Sanção penal é a resposta dada
pelo Estado à pessoa que praticou uma infração penal.
Existem duas espécies de sanção
penal:
1) Pena.
2) Medida de segurança.
Multa
Multa é uma espécie de pena, por meio da qual o condenado fica obrigado
a pagar uma quantia em dinheiro que será revertida em favor do Fundo
Penitenciário.
Pagamento da multa. A pena de multa é fixada na própria sentença
condenatória. Depois que a sentença transitar em julgado, o condenado terá um
prazo máximo de 10 dias para pagar a multa imposta (art. 50 do CP). O Código
prevê a possibilidade de o condenado requerer o parcelamento da multa em
prestações mensais, iguais e sucessivas, podendo o juiz autorizar, desde que as
circunstâncias justifiquem (ex.: réu muito pobre, multa elevadíssima etc.). O
parcelamento deverá ser feito antes de esgotado o prazo de 10 dias. O Juiz,
antes de decidir, poderá determinar diligências para verificar a real situação
econômica do condenado e, ouvido o Ministério Público, fixará o número de
prestações (art. 169, § 1º da LEP). Se o condenado for impontual ou se melhorar
de situação econômica, o Juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério
Público, poderá revogar o benefício (art. 169, § 2º da LEP).
O que acontece caso o condenado não
pague nem parcele a multa no prazo de 10 dias?
• Antes da Lei nº 9.268/96: se o
condenado, deliberadamente, deixasse de pagar a pena de multa, ela deveria ser
convertida em pena de detenção. Em outras palavras, a multa era transformada em
pena privativa de liberdade.
• Atualmente: a Lei nº 9.268/96 alterou
o art. 51 do CP e previu que, se a multa não for paga, ela será considerada dívida de valor e
deverá ser exigida por meio de execução (não se permite mais a conversão
da pena de multa em detenção).
Antes
da Lei 9.268/96 |
Depois
da Lei 9.268/96 (ATUALMENTE) |
Art. 51. A multa converte-se em pena
de detenção, quando o condenado solvente deixa de paga-lá ou frustra a sua
execução. |
Art. 51. Transitada em julgado a
sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor,
aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda
Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da
prescrição. |
Multa permaneceu com caráter penal
Importante
esclarecer que, mesmo com essa mudança feita pela Lei nº 9.268/96, a multa
continua tendo caráter de sanção criminal, ou seja, permanece sendo uma
pena, por força do art. 5º, XLVI, “c”, da CF/88:
Art. 5º
(...)
XLVI - a
lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
c) multa;
Assim, a única coisa que a Lei nº
9.268/96 fez foi mudar a forma de cobrança da multa não paga: antes, ela virava
pena de detenção; agora, deve ser cobrada por meio de execução.
Quem
executa a pena de multa?
STJ: Fazenda Pública |
STF: Prioritariamente: o
Ministério Público Subsidiariamente: a
Fazenda Pública |
O STJ sempre sustentou que, como se
trata de dívida de valor, a pena de multa deveria ser executada pela Fazenda
Pública por meio de execução fiscal que tramita na vara de execuções fiscais.
O rito a ser aplicado seria o da Lei
nº 6.830/80. A execução da pena de multa ocorreria
como se estivesse sendo cobrada uma multa tributária. Não se aplica a Lei nº 7.210/84
(LEP). Esse era o entendimento pacífico do
STJ, tanto que foi editada uma súmula nesse sentido. Súmula 521-STJ: A legitimidade para a
execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença
condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública. |
A Lei nº
9.268/96, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não retirou dela
o caráter de sanção criminal. Diante de tal constatação, não há
como retirar do MP a competência para a execução da multa penal, considerado
o teor do art. 129 da CF/88, segundo o qual é função institucional do MP
promover privativamente a ação penal pública, na forma da lei. Promover a ação
penal significa conduzi-la ao longo do processo de conhecimento e de
execução, ou seja, buscar a condenação e, uma vez obtida esta, executá-la.
Caso contrário, haveria uma interrupção na função do titular da ação penal. Ademais, o art. 164 da LEP é expresso
ao reconhecer essa competência do MP. Esse dispositivo não foi revogado
expressamente pela Lei nº 9.268/96. Vale ressaltar, entretanto que, se o
titular da ação penal, mesmo intimado, não propuser a execução da multa no
prazo de 90 dias, o juiz da execução criminal deverá dar ciência do feito ao
órgão competente da Fazenda Pública (federal ou estadual, conforme o caso)
para a respectiva cobrança na própria vara de execução fiscal, com a
observância do rito da Lei 6.830/80. |
Quem executa: Fazenda Pública. Juízo: vara de execuções fiscais. Legislação: Lei nº 6.830/80. |
Quem executa: • Prioritariamente: o Ministério
Público, na vara de execução penal, aplicando-se a LEP. • Caso o MP se mantenha inerte por
mais de 90 dias após ser devidamente intimada: a Fazenda Pública irá
executar, na vara de execuções fiscais, aplicando-se a Lei nº 6.830/80. |
Foi o que decidiu o STF:
STF. Plenário. ADI 3150/DF, Rel. para acórdão Min. Roberto Barroso,
julgado em 12 e 13/12/2018 (Info 927).
STF. Plenário. AP
470/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 12 e 13/12/2018 (Info 927).
Exemplo:
João foi sentenciado por roubo e o juiz
de direito (Justiça Estadual) o condenou a 4 anos de reclusão e mais 10
dias-multa no valor de meio salário mínimo cada.
Depois do trânsito em julgado, o
condenado foi intimado para pagar a pena de multa no prazo de 10 dias, mas não
o fez.
Diante disso, o escrivão da vara irá
fazer uma certidão na qual constarão as informações sobre a condenação e o
valor da multa.
• Para o STJ, o magistrado deveria
remeter a certidão para Procuradoria Geral do Estado e um dos Procuradores do
Estado iria ajuizar, em nome do Estado, uma execução fiscal que tramitaria na
vara de execuções fiscais (não era na vara de execuções penais).
• Agora, com a decisão do STF, o
magistrado deverá intimar o Ministério Público e o Parquet irá propor a
execução da multa na vara de execução penal. Caso o MP, devidamente intimado,
não proponha a execução da multa no prazo de 90 dias, o juiz da execução
criminal deverá dar ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública
(federal ou estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria
vara de execução fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/80.
Obs: se João tivesse sido condenado
pela Justiça Federal, quem iria ingressar com a execução seria prioritariamente
o MPF e, apenas subsidiariamente, a União, por intermédio da Procuradoria da
Fazenda Nacional (PFN).
O que acontece com o entendimento do
STJ manifestado na Súmula 521?
Está superado e a súmula deve ser
cancelada. Isso porque a decisão do STF foi proferida em ação direta de
inconstitucionalidade possuindo, portanto, eficácia erga omnes e efeito vinculante (art. 102, § 2º, da CF/88).
Onde
tramita a execução da pena de multa?
No
juízo da execução penal.
O
art. 51 do Código Penal foi alterado para deixar expressa essa competência:
CÓDIGO PENAL |
|
Antes da Lei 13.964/2019 |
ATUALMENTE |
Art. 51. Transitada em julgado
a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor,
aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda
Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da
prescrição. |
Art. 51. Transitada em julgado
a sentença condenatória, a multa será executada perante o juiz da execução penal e será
considerada dívida de valor, aplicáveis as normas relativas à dívida ativa da
Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e
suspensivas da prescrição. |
Com a Lei nº 13.964/2019
(Pacote Anticrime), a Fazenda Pública ainda detém legitimidade subsidiária para
executar a pena de multa (legitimidade para executar depois de 90 dias)? Esse
entendimento do STF (ADI 3150/DF) ainda persiste?
SIM.
A Fazenda Pública mantém a competência subsidiária para execução
da multa criminal, mesmo após a nova redação do art. 51 do Código Penal dada
pela Lei n. 13.964/2019.
STJ. 5ª Turma. AgRg no RMS n. 71.735/RS, Rel. Min. Messod Azulay
Neto, julgado em 26/9/2023.
Quanto à execução da pena de multa, o STJ possui orientação no
sentido de que, mesmo após a alteração decorrente da nova redação do art. 51 do
Código Penal pela Lei 13.964/2019, a Fazenda Pública mantém a competência
subsidiária para execução dos respectivos valores.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 2.096.590/PR, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, julgado em 15/8/2023.
INADIMPLEMENTO DA MULTA E EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João foi condenado a 3 anos de
reclusão (pena privativa de liberdade) e a 200 dias-multa.
Após cumprir integralmente a pena
privativa de liberdade, João foi solto e a defesa peticionou ao juízo
requerendo a extinção da punibilidade.
O juiz extinguiu a pena privativa
de liberdade pelo seu integral cumprimento; todavia, determinou que fosse
oficiada a Procuradoria da Fazenda Pública para a cobrança da pena de multa e
afirmou que a extinção da punibilidade só poderia ser decretada quando houvesse
o pagamento do valor.
Agiu corretamente o magistrado?
De acordo com o STJ, o inadimplemento
da pena de multa impede a extinção da punibilidade mesmo que já tenha sido
cumprida a pena privativa de liberdade ou a pena restritiva de direitos?
O STJ tratou desse assunto no Tema
931 dos recursos repetitivos.
A jurisprudência do STJ passou por três etapas históricas a
respeito do tema.
1ª etapa:
O STJ entendia que era possível a
extinção da punibilidade mesmo sem o adimplemento da pena de multa.
Foi fixada a seguinte tese no
Tema 931:
Nos casos em que haja condenação a pena privativa de liberdade e
multa, cumprida a primeira (ou a restritiva de direitos que eventualmente a
tenha substituído), o inadimplemento da sanção pecuniária não obsta o
reconhecimento da extinção da punibilidade.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.519.777/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti
Cruz, julgado em 26/8/2015 (Recurso Repetitivo – Tema 931).
O principal argumento era o de
que a pena de multa era considerada dívida de valor e, portanto, possuía
caráter extrapenal, de modo que sua execução seria de competência exclusiva da
Procuradoria da Fazenda Pública.
2ª etapa:
O inadimplemento da pena de multa
impede a extinção da punibilidade mesmo que já tenha sido cumprida a pena
privativa de liberdade ou a pena restritiva de direitos?
• Regra: SIM.
Se o indivíduo for condenado a
pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária
obsta (impede) o reconhecimento da extinção da punibilidade. Em outras
palavras, somente haverá a extinção da punibilidade se, além do cumprimento da
pena privativa de liberdade, houver o pagamento da multa.
• Exceção: se o condenado
comprovar que não tem como pagar a multa.
Se o condenado comprovar a
impossibilidade de pagar a sanção pecuniária, neste caso, será possível a
extinção da punibilidade mesmo sem a quitação da multa. Bastará cumprir a pena
privativa de liberdade e comprovar que não tem condições de pagar a multa.
A tese para o Tema 931 foi,
então, alterada:
Na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de
liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária, pelo condenado que
comprovar impossibilidade de fazê-lo, não obsta o reconhecimento da extinção da
punibilidade.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.785.383-SP e REsp 1.785.861/SP, Rel. Min.
Rogerio Schietti Cruz, julgados em 24/11/2021 (Recurso Repetitivo - Tema 931)
(Info 720).
Por que o STJ mudou de
entendimento?
Porque o STF, em dezembro de
2018, ao julgar a ADI 3150/DF, declarou que, à luz do preceito estabelecido
pelo art. 5º, XLVI, da Constituição Federal, a multa, ao lado da privação de
liberdade e de outras restrições – perda de bens, prestação social alternativa
e suspensão ou interdição de direitos –, é espécie de pena aplicável em
retribuição e em prevenção à prática de crimes, não perdendo ela sua natureza
de sanção penal.
Logo, em regra, não se pode
declarar a extinção da punibilidade pelo cumprimento integral da pena privativa
de liberdade quando pendente o pagamento da multa criminal.
E a exceção criada?
O STJ, ao interpretar a decisão
proferida pelo STF na ADI 3.150/DF, afirmou que ela se destina prioritariamente
àqueles condenados por delitos relativos à criminalidade econômica, que possuem
condições econômicas de adimplir com a satisfação da pena pecuniária, de modo
que o seu não pagamento constitui deliberado descumprimento de decisão judicial
e implica sensação de impunidade.
Em sentido diametralmente oposto
está a situação dos condenados que são social e economicamente
hipossuficientes.
Se os condenados que são pobres
não puderem ter extinta a punibilidade pelo fato de não pagarem a multa, isso
fará com que eles fiquem privados dos direitos políticos e sem acesso ao gozo
de benefícios sociais. Em casos como esse, condicionar a extinção da
punibilidade ao adimplemento da pena de multa significar agravar a situação de
penúria e indigência dos apenados hipossuficientes e das pessoas próximas a
ele, impondo a todo o seu grupo familiar privações decorrentes de sua
impossibilitada reabilitação social.
3ª etapa:
É o entendimento atual. É
parecido com a posição adotada em novembro de 2021. A diferença está no ônus da
prova da impossibilidade de pagar a multa.
• Tese fixada em novembro de
2021: o ônus de comprovar a impossibilidade de pagar a multa era do apenado.
• Tese fixada fevereiro de 2024: basta
que o apenado alegue a hipossuficiência, não precisando que ele (condenado)
comprove a impossibilidade de pagar.
Veja a nova tese fixada para o
Tema 931 (tese atual):
O inadimplemento da pena de multa, mesmo após o
cumprimento da pena de prisão ou da pena restritiva de direitos, não impede a
extinção da punibilidade, desde que o condenado alegue hipossuficiência, salvo
se o juiz competente, em decisão devidamente fundamentada, entenda de forma
diferente, indicando especificamente a capacidade de pagamento da penalidade
pecuniária.
STJ. 3ª Seção.
REsp 2.090.454-SP e REsp 2.024.901-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado
em 28/02/2024 (Recurso Repetitivo – Tema 931) (Info 803).
Vejamos abaixo os principais
argumentos do Min. Rogério Schietti:
Segundo a tese fixada em novembro
de 2021 cabia ao condenado a comprovação da impossibilidade de adimplemento da
sanção pecuniária (multa), para ver reconhecida a extinção da punibilidade.
Essa jurisprudência acabou por
impor um ônus excessivo a quem, notoriamente, não possui recursos financeiros
para quitar sua dívida, exigindo que faça prova nesse sentido.
A não extinção da punibilidade
traz uma série de prejuízos ao condenado.
Um dos malefícios oriundos do não
reconhecimento da extinção da punibilidade, quando pendente apenas o pagamento
da pena de multa, está no art. 64, I, do Código Penal, que prevê: “para efeito de reincidência: [...] não
prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da
pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5
(cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento
condicional, se não ocorrer revogação”.
Isso implica afirmar que o
apenado que expiou, por anos, a privação de sua liberdade poderá permanecer
ainda por outros longos anos sem a possibilidade de readquirir o status de
pessoa não reincidente, e sem possibilidade concreta de reinserção no mercado
de trabalho e na vida civil, diante da circunstância de não ter sido capaz de
quitar a dívida pecuniária.
O panorama, quando encarado em
perspectiva com a análise de idade e raça dos grupos de indivíduos
encarcerados, notabiliza a situação de desproteção a que eles estão submetidos,
mormente os jovens negros. A já acentuada disparidade socioeconômica existente
entre eles e a população branca correspondente é intensamente exacerbada em
decorrência dos efeitos deletérios do encarceramento, a retardar sua reinserção
social.
A barreira ao reconhecimento da
extinção da punibilidade dos condenados notoriamente pobres frustra
fundamentalmente os fins a que se prestam a imposição e a execução das
reprimendas penais, e contradiz a inferência lógica do princípio isonômico
(art. 5º, caput da CF/88), segundo o qual desiguais devem ser tratados de forma
desigual. Ainda nesse sentido, citou o art. 1º, da LEP, que menciona que “a execução penal tem por objetivo efetivar
as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a
harmônica integração social do condenado e do internado”.
Nesse cenário, não se mostraria,
portanto, compatível com os objetivos e fundamentos do Estado Democrático de
Direito - destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais,
a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça (Preâmbulo da Constituição da República) - que se perpetue uma situação
de sobrepunição dos condenados notoriamente incapacitados a, já cumprida a pena
privativa de liberdade ou restritiva de direitos, solver uma dívida que, a
despeito de legalmente imposta - com a incidência formal do Direito Penal - não
se apresenta, no momento de sua execução, compatível com os objetivos da lei
penal e da própria ideia de punição estatal.
Desse modo, a eficiente atuação
do MP na cobrança da multa poderia se tornar iníqua ao não se diferenciarem
situações, nas quais, por óbvio, não possuir o encarcerado que acaba de cumprir
sua pena privativa de Liberdade as mínimas condições de pagar seu encargo, sem
prejuízo de sua própria subsistência e de seus familiares.
O Ministro Schietti afirmou que, do
total de 644.305 presos no país, somente 1.798 (menos de 0,5% deles) cumprem
pena pelos crimes de peculato, concussão, excesso de exação, corrupção passiva
e corrupção ativa. Desse número, ainda que somemos a estes também os condenados
por outros crimes de colarinho branco (lavagem de dinheiro, evasão de divisas,
gestão fraudulenta etc), não se tem certamente mais do que 1% de todo o sistema
penitenciário com pessoas condenadas por ilícitos penais com alguma chance de
serem melhor situadas financeiramente. Na visão do relator, “para estes, sim, deve voltar-se todo o
esforço do Ministério Público para executar as penas de multas devidas, e não
para quem, notoriamente, após anos de prisão, volta ao convívio social
absolutamente carente de recursos financeiros e sequer com uma mínima
perspectiva de amealhar recursos para pagar a dívida com o Estado”.
Do ônus da prova da condição de pobreza do condenado
Segundo o acórdão, a comprovação
da situação de hipossuficiência do condenado poderia se dar por mera declaração
de pobreza (art. 99, §3º, do CPC), que goza de presunção relativa de
veracidade.
Assim, de acordo com o relator, ante
a alegada hipossuficiência do condenado, extinguir a punibilidade, salvo se
diversamente entender o juiz competente, em decisão suficientemente motivada e
apoiada em prova constante dos autos, a indicar a possibilidade de pagamento da
sanção pecuniária.
Evidentemente, poderá o
Ministério Público desincumbir-se do ônus de ilidir a presunção de pobreza do
condenado, trazendo aos autos prova de que possui ele recursos financeiros que
lhe capacitam pagar a multa pendente.
Em suma, o que prevalece atualmente na jurisprudência do STJ é o
seguinte:
O inadimplemento da pena de multa
impede a extinção da punibilidade mesmo que já tenha sido cumprida a pena
privativa de liberdade ou a pena restritiva de direitos?
• Regra: SIM
Se o indivíduo for condenado a
pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da pena de multa impede a
extinção da punibilidade. Em outras palavras, somente haverá a extinção da
punibilidade se, além do cumprimento da pena privativa de liberdade (ou
restritiva de direitos), houver o pagamento da multa.
• Exceção: se o condenado alegar
que não tem como pagar a multa a punibilidade será extinta, salvo se o Estado conseguir
demonstrar que ele tem condições financeiras.
O inadimplemento da pena de multa, mesmo após o
cumprimento da pena de prisão ou da pena restritiva de direitos, não impede a
extinção da punibilidade, desde que o condenado alegue hipossuficiência, salvo
se o juiz competente, em decisão devidamente fundamentada, entenda de forma
diferente, indicando especificamente a capacidade de pagamento da penalidade
pecuniária.
STJ. 3ª Seção.
REsp 2.090.454-SP e REsp 2.024.901-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado
em 28/02/2024 (Recurso Repetitivo – Tema 931) (Info 803).