Curador especial
O CPC prevê que, em determinadas
situações, o juiz terá que nomear um curador especial que irá defender, no
processo civil, os interesses do réu.
O curador especial também é
chamado de curador à lide.
Hipóteses em que será
nomeado curador especial:
Estão previstas no art. 72 do
CPC/2015. São quatro situações:
a) Quando o réu for incapaz e não
tiver representante legal;
b) Quando o réu for incapaz e
tiver representante legal, mas os interesses deste (representante) colidirem
com os interesses daquele (incapaz);
c) Em caso de réu preso revel,
enquanto não for constituído advogado.
d) Quando o réu tiver sido citado
por edital ou com hora certa e não tiver apresentado resposta no prazo legal
(ou seja, tiver sido revel), enquanto não for constituído advogado.
Veja a redação legal:
Art. 72. O juiz nomeará curador
especial ao:
I - incapaz, se não tiver
representante legal ou se os interesses deste colidirem com os daquele,
enquanto durar a incapacidade;
II - réu preso revel, bem como ao réu
revel citado por edital ou com hora certa, enquanto não for constituído
advogado.
Quais são os poderes do
curador especial? O que ele faz no processo?
O curador especial exerce um
múnus público.
Sua função é a de defender o réu
em juízo naquele processo.
Possui os mesmos poderes
processuais que uma “parte”, podendo oferecer as diversas defesas (contestação,
exceção, impugnação etc.), produzir provas e interpor recursos.
Obviamente, o curador especial
não pode dispor do direito do réu (não pode, por exemplo, reconhecer a
procedência do pedido), sendo nulo qualquer ato nesse sentido.
Vale ressaltar que, ao fazer a
defesa do réu, o curador especial pode apresentar uma defesa geral
(“contestação por negação geral”), não se aplicando a ele o ônus da impugnação
especificada dos fatos (parágrafo único do art. 341 do CPC/2015).
Desse modo, o curador especial
não tem o ônus de impugnar pontualmente (de forma individualizada) cada fato
alegado pelo autor.
Este art. 72 do CPC/2015 é
aplicável apenas ao processo (fase) de conhecimento?
NÃO. Deve ser aplicado em
qualquer processo, como no caso da execução.
Súmula 196-STJ: Ao executado que, citado por edital ou por hora
certa, permanecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para
apresentação de embargos.
O que essa função de
curador especial tem a ver com a Defensoria Pública?
A Lei Orgânica da Defensoria Pública (LC 80/94) estabelece o
seguinte:
Art. 4º São funções institucionais da
Defensoria Pública, dentre outras:
XVI – exercer a curadoria especial nos
casos previstos em lei;
De igual forma, o parágrafo único do art. 72 do CPC/2015 preconiza:
Art. 72 (...)
Parágrafo único. A curatela especial
será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei.
Desse modo, o múnus público de
curador especial de que trata o art. 72 do CPC deve ser exercido pelo Defensor
Público.
Importante: a atuação da
Defensoria Pública como curadora especial não exige que o réu seja
hipossuficiente economicamente. Nesses casos do art. 72 entende-se que o réu
ostenta hipossuficiência jurídica, sendo, portanto, necessária a atuação da
Defensoria Pública.
Imagine agora a seguinte
situação hipotética:
O Banco do Brasil ingressou com
execução de título extrajudicial em face de João.
Como o devedor não foi
localizado, ele foi citado por edital.
O executado não apresentou defesa
no prazo legal (ou seja, foi revel).
Por essa razão, a Defensoria
Pública interveio nos autos no exercício da curadoria especial.
A Defensoria Pública opôs
embargos à execução alegando, entre outras questões, a preliminar de nulidade
da citação por edital.
A magistrada de primeiro grau
rejeitou a preliminar e julgou improcedentes os embargos.
A Defensoria Pública interpôs
apelação insistindo na tese da nulidade da citação por edital em razão do não
esgotamento das tentativas de citar o réu pessoalmente.
O Tribunal de Justiça concordou e
deu provimento ao recurso para anular o processo de execução a partir da
citação por edital, por considerar medida excepcional somente admitida quando
esgotadas as possibilidades de localização do réu.
Por outro lado, o TJ rejeitou o
pedido da Defensoria Pública para condenação do banco ao pagamento de
honorários advocatícios sucumbenciais em favor da instituição. Para o TJ, o
pagamento das verbas sucumbenciais somente poderia ser feito ao final do processo.
Irresignada, a Defensoria Pública interpôs recurso especial alegando, em síntese, a necessidade
de fixação de honorários sucumbenciais nos embargos à execução, pois estes são
ação autônoma, de modo que a declaração de nulidade da citação implicará o
arquivamento dos autos, não havendo falar em continuidade do processo para,
somente ao final, ser definida a sucumbência.
Em contrarrazões, o Banco alegou
que a Defensoria Pública, no exercício da função de curadoria especial, não faz
jus à verba decorrente da condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais
caso o seu assistido sagre-se vencedor na demanda.
A Defensoria Pública, no
exercício da função de curadoria especial, goza de honorários advocatícios
sucumbenciais caso o réu sagre-se vencedor na demanda?
SIM.
A Defensoria Pública, no exercício da função de
curadoria especial, faz jus à verba decorrente da condenação ao pagamento de
honorários sucumbenciais caso o seu assistido sagre-se vencedor na
demanda.
STJ. 3ª
Turma. REsp 1.912.281-AC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em
12/12/2023 (Info 15 – Edição Extraordinária).
A fim de corroborar com esse
entendimento:
A Defensoria Pública, no exercício da função de curador
especial, faz jus à verba decorrente da condenação em honorários sucumbenciais
caso o seu assistido sagre-se vencedor na demanda.
STJ. 1ª Turma. AgInt no REsp 1.991.998/RS, Rel. Min. Sérgio
Kukina, julgado em 5/9/2022.
Além disso, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE
114.005/RJ, com repercussão geral (Tema 1002/STF), fixou a tese de que os
honorários sucumbenciais são devidos à Defensoria Pública quando a parte por
ela representada for vencedora na demanda, ainda que a parte vencida seja o
ente público que ela integra:
Tema n. 1.002/STF:
1. É devido o pagamento de
honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte
vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele
que integra;
2. O valor recebido a título de
honorários sucumbenciais deve ser destinado, exclusivamente, ao aparelhamento
das Defensorias Públicas, vedado o seu rateio entre os membros da instituição.
Em tese, abstraindo o caso concreto, existe direito aos honorários
sucumbenciais nos embargos à execução?
SIM. Isso já foi, inclusive, reconhecido pelo STJ, em recurso
repetitivo, tendo sido fixada a seguinte tese:
Os embargos do devedor são ação de conhecimento incidental à
execução, razão porque os honorários advocatícios podem ser fixados em cada uma
das duas ações, de forma relativamente autônoma, respeitando-se os limites de
repercussão recíproca entre elas, desde que a cumulação da verba honorária não
exceda o limite máximo previsto no § 3º do art. 20 do CPC/1973.
STJ. Corte Especial. REsp 1520710-SC, Rel. Min. Mauro Campbell
Marques, julgado em 18/12/2018 (Recurso Repetitivo – Tema 587) (Info 643).
Os embargos à execução constituem
ação autônoma. Assim, ao ser proferida a sentença, consequentemente, serão
observados os efeitos dela decorrentes, inclusive mediante a fixação de ônus
sucumbenciais quando cabíveis, exatamente por se tratar de uma ação autônoma,
observando-se, contudo, o resultado prático alcançado pelo embargante.
No caso concreto acima narrado, a Defensoria Pública faz jus aos
honorários advocatícios sucumbenciais? O recurso da Defensoria Pública foi
provido?
NÃO.
No caso, os embargos do devedor
foram julgados improcedentes pela Magistrada de primeiro grau, mas a apelação
interposta pela curadoria especial foi provida pelo Tribunal de Justiça para,
acolhendo a preliminar de nulidade de citação, desconstituir a sentença,
reconhecendo a nulidade do processo a partir da determinação da citação por
edital.
A Corte estadual ainda
acrescentou que os ônus sucumbenciais deverão ser vistos ao final do processo,
pois, a despeito da autonomia dos embargos à execução, a sentença foi terminativa, não colocando
fim ao processo executivo, mas apenas reconhecendo uma nulidade processual.
Isso significa, portanto, que o
assistido da Defensoria Pública (João) não pode ser, ainda, considerado o
vencedor na demanda, uma vez que apenas foi reconhecida a nulidade da citação
arguida pela curadoria especial, sendo determinada nova citação da parte
assistida, com o consequente prosseguimento do feito.
Dessa maneira, podemos concluir
que serão devidos honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, atuando como
curadora especial, nos embargos à execução que resultem em algum proveito
econômico ao assistido no pleito executório.
A procedência dos embargos do
devedor apenas para se reconhecer a nulidade de ato processual existente no
processo de execução, determinando a sua renovação, não justifica a condenação
ao pagamento de honorários sucumbenciais, haja vista que o assistido não se
sagrou vencedor, tal como ocorreria se os embargos tivessem sido acolhidos para
julgar improcedente (total ou parcialmente) a execução ou para extingui-la.