Imagine a seguinte situação
hipotética:
A empresa Alfa Ltda paga, desde
2011, uma taxa (tributo) cobrada pela União.
Em 2018, o STF reconheceu que
essa taxa é inconstitucional.
Com fundamento nesse julgado, a
empresa impetrou mandado de segurança pedindo:
a) para que seja declarado que a
impetrante não tem obrigação jurídica de recolher a referida taxa; e
b) que seja reconhecido seu
direito de obter a restituição administrativa dos valores indevidamente pagos
nos últimos cinco anos.
O juiz federal concedeu a
segurança nos termos pleiteados, sendo essa decisão confirmada pelo TRF3.
O TRF3 reconheceu a possibilidade
de restituição administrativa de indébito tributário reconhecido judicialmente,
consignando que a hipótese não representa ofensa ao art. 100, da CF/88, por não
se tratar de sentença de repetição/restituição de indébito, nem de execução por
título judicial.
A União não concordou e interpôs recurso
extraordinário. A Fazenda Nacional sustentou que a restituição administrativa
dos valores pagos viola frontalmente o art. 100 da Constituição Federal, que
trata do regime de precatórios.
A União explicou que as causas de
restituição de indébito tributário envolvem, não raras vezes, milhões de reais
e que eventual determinação para restituição administrativa desses valores
comprometeria o planejamento orçamentário da Fazenda Pública, desrespeitaria o
regime cronológico de preferências fixadas pela Constituição Federal, além de
afastar o tratamento igualitário entre os cidadãos.
Além disso, ao inaugurar novas
exceções ao regime de precatórios, como o caso presente, estar-se-ia criando um
perigoso precedente que poderia comprometer a ordem orçamentária dos Estados,
Distrito Federal e dos Municípios.
O STF concordou com os
argumentos da União?
SIM.
Ao reconhecer o direito do impetrante à restituição
administrativa do indébito tributário nos autos do mandado de segurança, o
acórdão do TRF divergiu da firme jurisprudência do STF que se orienta no
sentido de que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de
pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de
precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação,
nos termos do art. 100 da Constituição da República:
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas
Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de
sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de
apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a
designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos
adicionais abertos para este fim.
Nesse sentido:
(...) 1. O Tribunal de Origem, em sede de mandado de segurança,
assentou ter a impetrante direito à restituição administrativa do indébito
tributário reconhecido judicialmente na demanda, sem a observância do regime de
precatórios.
2. Ao assim decidir, a Corte a Quo divergiu da orientação da
Suprema Corte de que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas em razão de
decisão judicial devem se dar mediante a expedição de precatório ou de
requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do art.
100 da Constituição Federal. Precedentes.
3. Agravo regimental e recurso extraordinário providos,
assentando-se que a restituição do pagamento indevido, decorrente de decisão em
sede de mandado de segurança, se dê mediante a expedição de precatório ou de
requisição de pequeno valor, conforme o caso.
STF. 1ª Turma. ARE 1.387.512-AgR/RS, Red. p/ acórdão Min. Dias
Toffoli, DJe 08/11/2022.
Em suma:
A restituição de indébito
tributário reconhecido na via judicial não pode ser efetivada
administrativamente, eis que deve plena observância ao regime constitucional de
precatórios (art. 100, da CF/88).
Os pagamentos devidos pela
Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser
realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno
valor, conforme o valor da condenação.
Tese fixada pelo STF:
Não
se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na
via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios,
nos termos do art. 100 da Constituição Federal.
STF. Plenário. RE
1.420.691/SP, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 21/8/2023 (Repercussão Geral -
Tema 1262) (Info 1108).
DOD Plus –
entendimento do STJ está superado
O STJ possuía decisões em sentido
contrário ao que foi explicado acima:
É possível assegurar, na via administrativa, o direito à
restituição do indébito tributário reconhecido por decisão judicial em mandado
de segurança.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.951.855-SC, Rel. Min. Manoel Erhardt
(Desembargador convocado do TRF da 5ª Região), julgado em 08/11/2022 (Info
756).
Vale
ressaltar, contudo, que o STJ já se adaptou e passou a seguir a orientação do
STF fixada no Tema 1.262.