Dizer o Direito

terça-feira, 3 de outubro de 2023

O fato de o reeducando ser assistido pela Defensoria Pública não gera a presunção de sua hipossuficiência em arcar com a pena de multa

Imagine a seguinte situação hipotética:

João foi condenado, pelo crime de roubo, a pena de reclusão cumulada com multa.

O condenado encontra-se atualmente cumprindo pena no regime semiaberto.

João, assistido pela Defensoria Pública, apresentou pedido de progressão para o regime aberto.

O Ministério Público exarou parecer dizendo que o apenado, para ter direito à progressão, deveria pagar a multa imposta na sentença ou comprovar que não tem condições de arcar com esse pagamento.

 

O entendimento manifestado no parecer do Ministério Público encontra-se em consonância com a jurisprudência?

SIM.

Como regra, o inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional. Em outras palavras, a pessoa só poderá progredir se pagar a pena de multa.

Exceção: mesmo sem ter pago, pode ser permitida a progressão de regime se ficar comprovada a absoluta impossibilidade econômica do apenado em quitar a multa, ainda que parceladamente.

STF. Plenário. EP 16 ProgReg-AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 1º/7/2016 (Info 832).

 

O juiz concedeu a progressão argumentando o seguinte:

- realmente o reeducando não quitou a multa nem comprovou a impossibilidade de pagar;

- no entanto, existe uma presunção de que ele é hipossuficiente considerando que está assistido pela Defensoria Pública.

 

Para o STJ, agiu corretamente o juiz?

NÃO.

Na forma do art. 50, caput, do Código Penal, admite-se que, a requerimento do condenado e conforme as circunstâncias do caso concreto, seja deferido o pagamento da multa em parcelas mensais:

Pagamento da multa

Art. 50. A multa deve ser paga dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença. A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais.

 

Assim, nas hipóteses de inadimplemento da pena de multa, a fim de que não se imponha ao reeducando uma barreira intransponível, a ponto de violar o princípio da ressocialização da pena, nem se frustre, por outro lado, a finalidade da execução penal, o Juízo da Execução Criminal deve, antes de obstar ou deferir a progressão de regime ao apenado, verificar o valor da multa fixada e analisar, a partir de elementos fáticos, a respectiva capacidade econômica do sentenciado, com vistas a viabilizar, de algum modo, ainda que de forma parcelada, o pagamento da multa.

No caso, foi deferida a progressão de regime ao fundamento de que, “Muito embora o reeducando não tenha comprovado a impossibilidade de saldar a pena de multa, sua hipossuficiência econômica se revela das circunstâncias dos autos, pois se encontra assistido pela Defensoria Pública, sendo, portanto, presumidamente hipossuficiente”.

Conforme ponderou o Min. Rogerio Schietti Cruz, no julgamento do HC n. 672.632, DJe 15/6/2021, “nem todos os processados criminalmente, patrocinados pela Defensoria Pública, são hipossuficientes. [...]. Assim, é ônus do sentenciado, durante a execução, justificar o descumprimento da sentença, também no ponto relacionado à multa. Isso deve ser feito, primeiramente, ao Juiz da VEC, com oportunidade de oitiva do Ministério Público”, afastando-se, portanto, a mera presunção de sua incapacidade econômica para o pagamento da sanção pecuniária.

Desse modo, constatado o inadimplemento da pena de multa aplicada cumulativamente à privativa de liberdade, o Juízo da Execução Criminal deverá, antes de deliberar acerca da progressão de regime, intimar o reeducando para efetuar o pagamento, ressaltando a possibilidade de parcelamento, a pedido e conforme as circunstâncias do caso concreto (art. 50, caput, do CP), bem como oportunizando ao condenado comprovar, se for o caso, a absoluta impossibilidade econômica de arcar com seu valor sem prejuízo do mínimo vital para a sua subsistência e de seus familiares.

 

Em suma:

O fato de o reeducando ser assistido pela Defensoria Pública não gera a presunção de sua hipossuficiência em arcar com a pena de multa. 

STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 2.039.364-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/4/2023 (Info 13 – Edição Extraordinária).


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