sexta-feira, 6 de outubro de 2023
Layouts Argumentativos com o ChatGPT: como apresentar suas ideias com facilidade, clareza e eficiência
Layouts
Argumentativos com o ChatGPT: como apresentar suas ideias com facilidade,
clareza e eficiência
Por George Marmelstein
Você é capaz de transferir uma ideia da sua mente para a
mente de outra pessoa usando apenas palavras? Quanto tempo você leva para
organizar pensamentos fragmentados que vagueiam pelo seu cérebro? E, quando
escreve suas ideias, consegue prender a atenção do leitor do começo ao fim,
como se o texto fizesse parte de uma narrativa lógica, ordenada e sequencial?
Organizar pensamentos não é uma tarefa fácil. A mente humana
recebe estímulos do mundo de modo desordenado e precisa de um esforço cognitivo
considerável para dar sentido ao que recebe. Por isso, a maioria das pessoas
não sabe transmitir as ideias com eficiência. Escrevem de modo confuso,
desorganizado e truncado. A impressão é que possuem apenas uma consciência
nebulosa do assunto e lutam para formular um pensamento coerente.
O objetivo deste artigo é mostrar como organizar e
apresentar seus argumentos de forma eficaz, usando layouts argumentativos e a
camada de estilo do ChatGPT para tornar as ideias mais acessíveis, claras e
impactantes.
Para começar, conheça o FIRAC, o modelo de apresentação de
casos jurídicos mais prático, objetivo e simples de usar.
FIRAC é um acrônimo para FATOS, QUESTÃO (ISSUE), REGRAS
(RULES), APLICAÇÃO e CONCLUSÃO.
A organização linear e lógica que o FIRAC utiliza facilita
não apenas a elaboração do argumento, mas também sua compreensão por parte de
terceiros. Isso significa que você não apenas será capaz de transmitir suas
ideias de forma mais eficiente, mas também tornará mais provável que seus
argumentos sejam aceitos e entendidos por outros.
Mas o que exatamente cada componente deste acrônimo
representa?
O primeiro é o FATO: esta é a base factual e contextual
sobre a qual todo o seu argumento será construído. O segundo é a QUESTÃO
(ISSUE): aqui você deve explicitar o problema ou a pergunta central que precisa
ser resolvida. Qual é a essência da controvérsia? O terceiro é o direito
aplicável ou REGRAS (RULES): mostre quais são os princípios e regras do caso,
indicando qual é a base normativa da disputa. Em seguida, passe para a
APLICAÇÃO: é o momento em que se deve demonstrar como as normas, leis ou
princípios se relacionam com os fatos apresentados. Em outras palavras, é a
interpretação dos fatos à luz das regras definidas. Por fim, a CONCLUSÃO: é uma
síntese elaborada para resolver a questão apresentada.
Veja na prática como seria um caso apresentado no formato
FIRAC, elaborado com a ajuda do ChatGPT:
FATOS: Gerald Thomas, um renomado diretor de teatro no
Brasil, realizou a apresentação de uma adaptação da obra "Tristão e
Isolda" no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em resposta a vaias do
público, Thomas respondeu com atos polêmicos, incluindo simulação de
masturbação e exposição das nádegas. O episódio foi amplamente divulgado pela
mídia, e Thomas foi subsequentemente acusado de praticar "ato
obsceno" sob o art. 233 do Código Penal brasileiro.
QUESTÃO: A questão central se refere à legalidade do ato
de Gerald Thomas, ponderando se a conduta configura de fato "ato
obsceno" ou se encontra amparada pela liberdade de expressão e liberdade
artística, direitos fundamentais resguardados pela Constituição.
REGRAS: O art. 233 do Código Penal brasileiro define como
crime a prática de "ato obsceno em lugar público ou aberto ou exposto ao
público", com pena de detenção de três meses a um ano ou multa. No
entanto, o conceito de liberdade de expressão é um direito fundamental
assegurado pela Constituição Federal.
APLICAÇÃO: O STF, em análise do caso, ponderou que o ato
realizado por Gerald Thomas não foi isolado, mas sim inserido em um contexto de
liberdade artística e de expressão. Segundo o voto condutor do Min. Gilmar
Mendes, o ato polêmico, embora "inadequado e deseducado", serviu como
um protesto e estava alinhado ao contexto da peça, que já tinha elementos
provocativos. Destacou-se também que o evento ocorreu em horário noturno e
voltado para um público adulto.
CONCLUSÃO: O Supremo Tribunal Federal, em decisão
empatada, concedeu habeas corpus a Gerald Thomas, interpretando que seu ato
estava protegido pela liberdade de expressão, mesmo que considerado de mau
gosto ou inadequado. A decisão levou em conta a necessidade de interpretar a
lei penal à luz dos direitos fundamentais, utilizando-se do princípio da
filtragem constitucional.
O FIRAC é um modelo que adota um tom mais objetivo e, por
isso, é útil para análises jurídicas que exigem um rigor analítico mais
apurado, como pareceres, sentenças ou memoriais. Para textos mais persuasivos, a
preferência é por modelos que começam forte e terminam forte, como o AIDA ou o
CRARC.
O AIDA é um acrônimo para ATENÇÃO, INTERESSE, DESEJO E AÇÃO,
e está na base de muitos textos publicitários. Em contexto jurídico, o CRARC, inspirado
nos layouts de argumentos e categorias desenvolvidas por Stephen Toulmin,
costuma ser mais adequado.
CRARC é o acrônimo para CONCLUSÃO, REGRA, APLICAÇÃO,
REFUTAÇÃO E CONCLUSÃO. Vejamos como ficaria a defesa de Gerald Thomas usando o
modelo CRARC com a ajuda do ChatGPT:
CONCLUSÃO INICIAL: Gerald Thomas, um renomado diretor de
teatro, não deve ser penalizado por "ato obsceno" sob o art. 233 do
Código Penal brasileiro, pois suas ações são protegidas pela liberdade de
expressão e liberdade artística, direitos fundamentais consagrados pela
Constituição Federal do Brasil.
REGRA: O art. 233 do Código Penal define a prática de
"ato obsceno em lugar público ou aberto ou exposto ao público" como
crime, passível de detenção de três meses a um ano ou multa. Contudo, a
Constituição Federal protege o direito à liberdade de expressão e liberdade
artística como direitos fundamentais, que podem prevalecer em situações onde a
manifestação tem caráter expressivo ou artístico.
APLICAÇÃO: No caso de Gerald Thomas, o ato ocorreu durante
e em resposta a uma apresentação artística que ele dirigiu. A peça já possuía
elementos de natureza provocativa e o ato foi uma extensão dessa expressão
artística. Além disso, foi uma forma de protesto contra as vaias do público, e
não uma ação isolada ou gratuita. O evento ocorreu em um teatro, diante de um
público adulto, em horário noturno, elementos que contextualizam ainda mais a
natureza expressiva do ato.
REFUTAÇÃO (REBUTAL): Embora possa ser argumentado que o
ato foi de "extremo mau gosto" e "inadequado", tais
qualificações são subjetivas e inseridas dentro de um contexto cultural e
social. O que pode ser considerado "mau gosto" ou
"inadequado" para alguns pode ser uma forma legítima de expressão
para outros, e o papel da liberdade de expressão é justamente proteger essa
pluralidade. Adicionalmente, ao limitar a liberdade de expressão com base em
normas subjetivas de decoro, corre-se o risco de criar um precedente perigoso
que pode ser usado para justificar outras formas de censura.
CONCLUSÃO FINAL: Portanto, considerando o contexto
artístico, o horário e o público alvo, as ações de Gerald Thomas devem ser
entendidas como uma forma de expressão artística e de protesto, protegidas
pelos direitos fundamentais à liberdade de expressão e liberdade artística.
Assim, não deve ser penalizado com base no art. 233 do Código Penal brasileiro.
O caso em questão destaca a importância de sempre interpretar as leis penais à
luz dos direitos fundamentais, a fim de preservar as liberdades individuais em
uma sociedade democrática.
Veja que o modelo
CRARC é mais adversarial e tem o propósito de justificar um ponto de vista e
convencer o receptor da mensagem de que o seu ponto de vista merece ser
acolhido. É como se fosse uma lógica aristotélica invertida.
O MODELO ROGERIANO, por sua vez, é mais adequado para
contextos menos adversariais, em que o propósito da mensagem é gerar
pacificação, engajamento e conciliação em contextos emocionalmente carregados.
Esse método foi desenvolvido pelo psicólogo Carl Rogers e
prioriza a construção de um terreno comum antes de abordar os pontos
divergentes. A estratégia começa com o RECONHECIMENTO do ponto de vista do
outro. Isso estabelece a base para um diálogo mais construtivo. Em seguida, o modelo
destaca a importância de identificar INTERESSES E VALORES COMPARTILHADOS,
criando uma plataforma estável para a discussão. O terceiro componente é a
APRESENTAÇÃO do seu próprio argumento, feita de forma empática para ressaltar
suas vantagens sem desmerecer a outra parte. O objetivo final é o CONSENSO ou
RESOLUÇÃO, que busca incorporar aspectos de ambos os lados na solução.
Outro formato muito utilizado no direito, sobretudo para a
descrição DOS FATOS, é a ESTRUTURA DE NARRATIVA (SETUP/ORDEM, CONFRONTO/CAOS,
RESOLUÇÃO/REDORDEM). Esse modelo é uma versão simplificada da jornada do herói,
muito utilizada no storytelling, que funciona muito bem para gerar impacto
emocional, mudar atitudes e convencer.
A estrutura de narrativa amplia a conexão com o leitor,
tornando assuntos complexos mais compreensíveis e memoráveis. Ela também
aproveita a propensão natural do cérebro para processar informações em forma de
história, aumentando a eficiência e a permanência da mensagem. Adicionalmente,
a natureza emocional das histórias intensifica a persuasão, incentivando o
leitor a aceitar o ponto de vista apresentado.
Com o ChatGPT, essa tarefa tornou-se relativamente fácil,
sobretudo se você dominar corretamente a camada de estilo para evitar que os
excessos da escrita criativa desvirtuam a natureza do texto jurídico. Um texto
jurídico, mesmo usando técnicas de storytelling, precisa ser conciso,
preciso e objetivo. Não pode conter “licenças poéticas” típicas de um romance
de ficção. Por isso, a estrutura narrativa deve ser usada com cautela.
Veja a seguir um uso básico da estrutura narrativa em três
atos (ORDEM – CASOS – REORDEM) para explicar os fatos do caso Gerald Thomas,
com a ajuda do ChatGPT, usando um comando específico com prompts negativos
e direcionamentos de estilo:
DOS FATOS
Gerald Thomas, um renomado diretor de teatro brasileiro,
conhecido por suas peças que frequentemente geram polêmica, apresentou uma
adaptação da obra "Tristão e Isolda" no Teatro Municipal do Rio de
Janeiro. A performance ocorreu na madrugada do dia 17 de agosto de 2003, às
duas horas. A expectativa era de que, como de costume, a peça fosse recebida
com aplausos e elogios por parte do público.
No entanto, a recepção foi exatamente o oposto. Em vez dos
esperados aplausos, o público vaiou a peça e expressou seu desagrado. Em
resposta às vaias, Gerald Thomas reagiu de maneira inusitada e polêmica.
Primeiro, ele simulou uma masturbação no palco. Depois, virou de costas para a
plateia, abaixou suas calças até o joelho e mostrou suas nádegas para os
espectadores presentes. A cena foi filmada e amplamente divulgada, causando
grande repercussão nacional. Como resultado, o caso foi levado à polícia e
Gerald Thomas foi acusado de cometer "ato obsceno," conforme descrito
no artigo 233 do Código Penal brasileiro.
Diante disso, digno julgador, a solução justa do caso está em
suas mãos. Vossa Excelência, com seu aguçado senso de justiça, tem o
poder de restaurar o direito e mostrar que os valores que fundamentam o sistema
jurídico brasileiro devem prevalecer.
Como se vê, dominar os layouts argumentativos e o uso
correto do ChatGPT é algo que pode mudar o jogo para você, não apenas em
contextos jurídicos, mas em qualquer situação que exija persuasão e clareza.
Todos queremos ser mais influentes e eficazes na
comunicação. Todos queremos ser capazes de organizar nossos pensamentos e
expressá-los para que qualquer pessoa possa entender. Mais ainda, todos
queremos escrever textos que não sejam apenas compreensíveis, mas também
envolventes e impactantes. Com os layouts argumentativos, essa tarefa se torna
muito mais fácil. Esses modelos estruturam suas ideias de maneira lógica,
levando o leitor numa jornada do início ao fim de seu argumento. Eles são como
uma estrutura de andaime, fornecendo a você uma base sólida para construir seus
argumentos de forma metódica e com o propósito desejado.
Quando você integra o ChatGPT ao processo, o avanço é
notável, especialmente se souber utilizar a ferramenta de forma correta. O
ChatGPT pode funcionar como uma extensão de sua mente, auxiliando na
organização das suas ideias em conformidade com layouts argumentativos
pré-estabelecidos. Isso simplifica a construção de argumentos sólidos,
permitindo que você foque no conteúdo, enquanto o ChatGPT gerencia aspectos
como estrutura, coerência e estilo.
Mas para alcançar bons resultados, não basta digitar alguns
comandos e esperar que a máquina faça tudo sozinha. Hoje, mais do que nunca, o
ser humano ocupa um papel central na produção do conhecimento, porque cabe ao
usuário fornecer os inputs corretos para que a inteligência artificial construa
respostas satisfatórias. Saber usar o ChatGPT e dominar os fundamentos da
escrita, da persuasão e da argumentação racional são hoje as principais
habilidades que farão você se destacar em um mundo cada vez mais competitivo,
dinâmico e interconectado.
A tecnologia é uma ferramenta poderosa, mas ela é apenas
isso: uma ferramenta. Quem fornece a direção, o raciocínio e a essência do
conteúdo ainda é você.
PS: As ideias acima foram extraídas das Aulas
33, 51 e 52, do Curso de Escrita
Jurídica com o ChatGPT, onde explico em detalhes vários outros layouts
argumentativos para serem usados em contextos jurídicos e não-jurídicos e
mostro como dominar a camada de estilo do ChatGPT.