Formas de contatação de gás
residencial pelos condomínios
No fornecimento de gás a
condomínios residenciais, as empresas distribuidoras de GLP (gás liquefeito de
petróleo = “gás de cozinha”) disponibilizam duas formas de contratação:
No fornecimento de gás a
condomínios residenciais são disponibilizadas duas formas de contratação:
a) a modalidade medição
coletiva, segundo a qual o pagamento da integralidade do débito fica a
cargo do condomínio, reduzindo as chances de não pagamento. Vale ressaltar que,
nesta forma de contrato, eventual inadimplemento de algum condômino pode causar
o aumento da cota condominial dos demais condôminos adimplentes. Outra
desvantagem é que gera um custo maior para aqueles condôminos que consomem
menor quantidade de gás, já que serão obrigados a pagar o valor do rateio;
b) a modalidade de fornecimento
com leitura individualizada, pela qual há o fornecimento de gás a
granel, mas com medição e gestão individualizada do consumo de cada unidade
autônoma do condomínio. Essa medição individualizada é um serviço executado
pelo fornecedor do produto que, em razão disso, cobra uma tarifa prevista no
respectivo contrato.
A escolha da modalidade cabe à
assembleia condominial.
Veja agora o caso concreto
enfrentado pelo STJ (com adaptações):
A Companhia Ultragaz S/A é
fornecedora de gás para residências, inclusive para condomínios.
A empresa passou a fornecer gás
de maneira individualizada para diversos condomínios e, para tanto, cobrava
mensalmente R$ 4,00 de cada unidade, sob a justificativa de que tal serviço (medição
individualizada) exigia a substituição de equipamentos, instalação de medidores,
emissão de faturas individuais e uma logística totalmente diferente, o que
envolveria custos mais elevados.
A Associação Paulista de
Consumidores ajuizou ação civil pública contra a Companhia, pedindo:
a) que fosse declarada a
abusividade da cláusula contratual, com a condenação da ré a não mais inserir a
referida previsão em seus contratos futuros, sob pena de multa de R$ 300 mil;
b) que fosse a ré condenada a
devolver os valores recebidos de todos os consumidores lesados, em dobro e
corrigidos;
c) que fosse a ré condenada a
informar, por meio de publicações em jornais de grande circulação nas
principais comarcas do país, a todos os consumidores submetidos aos efeitos da
cláusula em tese abusiva para que se habilitassem nos autos da ação civil pública,
para receber os valores de reembolso, sob pena de multa de R$ 300 mil.
Em 1ª instância, os pedidos foram
julgados procedentes.
A Companhia Ultragaz S/A interpôs
recurso de apelação, que foi desprovido.
Ainda inconformada, a Companhia interpôs
recurso especial alegando que não há abusividade considerando que se trata de
uma livre escolha do consumidor.
Para o STJ, existe
abusividade nessa cobrança?
NÃO.
Conforme já explicado, no
fornecimento de gás a condomínios residenciais, as empresas distribuidoras de
GLP disponibilizam duas formas de contratação, quais sejam, a modalidade
medição coletiva e a de fornecimento com leitura individualizada, cabendo a
escolha à assembleia condominial de acordo com seus interesses.
Na segunda modalidade, adotada no
caso concreto, há o fornecimento de gás a granel, mas com medição e gestão
individualizada do consumo de cada unidade autônoma do condomínio - serviço
executado pelo fornecedor do produto, que, em razão disso, cobra um preço
previsto no respectivo contrato.
Não se mostra abusiva a cobrança
de tarifa para medição individualizada quando assegurada a livre escolha dos
consumidores na contratação, com liberdade na formação do preço, de acordo com
seus custos e em atenção às características da atividade realizada,
respeitando-se a equivalência material das prestações e demonstrada a
correspondente vantagem do consumidor no caso.
Portanto, indiscutivelmente cada
uma das modalidades colocadas à disposição gera riscos e custos diversos, tanto
para a fornecedora como para os consumidores, cabendo a estes ponderarem quais
delas melhor lhes atendem diante dos benefícios proporcionados e os custos por
estes gerados.
É incontroverso que, na
modalidade de contratação por medição individualizada, a distribuidora passa a ter
inúmeros contratos em um mesmo condomínio, de modo que as diferentes
contratações encerram características específicas para cada caso, justificando
a cobrança de uma tarifa para a prestação de um serviço mais eficiente.
Dessa forma, denota-se que a escolha
quanto à modalidade de contratação e à distribuidora que irá fornecer o serviço
é livre aos condomínios, os quais são previamente informados sobre as
características dos serviços prestados e seus custos, notadamente em relação à
cobrança da taxa pelo serviço adicional de medição que integra o objeto da
contratação por fornecimento com leitura individualizada.
Assim, não há uma imposição por
parte da distribuidora quanto ao tipo de contratação do serviço, podendo o
condomínio exercer sua escolha de forma livre, conforme a percepção do que
melhor atenda aos seus interesses e aos dos condôminos, que optaram, por meio
de assembleia condominial, pelo serviço proposto.
A modalidade por medição coletiva
gera, na verdade, uma vantagem para a distribuidora e uma desvantagem para o
consumidor, visto que o pagamento da integralidade do débito fica a cargo do
condomínio, reduzindo as chances de não pagamento, e eventual inadimplemento de
algum condômino pode causar o aumento da cota condominial dos demais condôminos
adimplentes, assim como gera um custo maior para aqueles condôminos que
consomem menor quantidade de GLP, já que serão obrigados a pagar o valor do
rateio.
Assim, o exame do valor cobrado
dos condôminos para o serviço de medição individual do consumo deve-se realizar
em relação às vantagens identificadas na modalidade contratual, que pressupõe
esta atividade como meio necessário para determinar certo modo de cobrança do
efetivo proveito, assim como desonera o condomínio da responsabilidade pelo
rateio entre os condôminos, e de suportar o custo dos inadimplentes.
A liberdade de iniciativa
econômica consagrada pela ordem constitucional (arts. 1º, IV, e 170 da
Constituição Federal) é pautada na livre concorrência, fomentando a
competitividade entre os fornecedores em benefício dos consumidores, motivo
pelo qual pode haver uma internalização moderada dos custos conforme as
características da prestação do serviço.
Essa diferenciação será benéfica
aos consumidores quando demonstrada a efetiva liberdade de escolha do
consumidor quanto às modalidades de serviço com e sem a vantagem específica -
com a observância do dever de informação e esclarecimento prévio dos
consumidores em relação às opções existentes para sua escolha - e não houver
restrições ou barreiras criadas pelo fornecedor com o propósito de desestimular
o consumidor a optar pela contratação menos custosa.
Diante disso, vê-se que, na
hipótese em apreço, o valor da tarifa é proporcional ao serviço prestado; a
opção pela medição individualizada foi feita livremente pelo condomínio, sem
nenhum constrangimento por parte da fornecedora, estando comprovada a real
vantagem para os consumidores, não se tratando da transferência de um custo
ordinário do produto ou do seu fornecimento. Isso porque os condôminos pagam
exclusivamente pela quantidade de produto efetivamente consumida e evita que o
conjunto dos condôminos seja onerado pelos custos da parcela do rateio não paga
por eventuais inadimplentes.
Em suma:
STJ. 3ª
Turma. REsp 1.986.320-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 8/8/2023
(Info 782).