Dizer o Direito

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Distribuidora de gás pode cobrar tarifa pela medição individualizada em um condomínio

Formas de contatação de gás residencial pelos condomínios

No fornecimento de gás a condomínios residenciais, as empresas distribuidoras de GLP (gás liquefeito de petróleo = “gás de cozinha”) disponibilizam duas formas de contratação:

No fornecimento de gás a condomínios residenciais são disponibilizadas duas formas de contratação:

a) a modalidade medição coletiva, segundo a qual o pagamento da integralidade do débito fica a cargo do condomínio, reduzindo as chances de não pagamento. Vale ressaltar que, nesta forma de contrato, eventual inadimplemento de algum condômino pode causar o aumento da cota condominial dos demais condôminos adimplentes. Outra desvantagem é que gera um custo maior para aqueles condôminos que consomem menor quantidade de gás, já que serão obrigados a pagar o valor do rateio;

b) a modalidade de fornecimento com leitura individualizada, pela qual há o fornecimento de gás a granel, mas com medição e gestão individualizada do consumo de cada unidade autônoma do condomínio. Essa medição individualizada é um serviço executado pelo fornecedor do produto que, em razão disso, cobra uma tarifa prevista no respectivo contrato.

A escolha da modalidade cabe à assembleia condominial.

 

Veja agora o caso concreto enfrentado pelo STJ (com adaptações):

A Companhia Ultragaz S/A é fornecedora de gás para residências, inclusive para condomínios.

A empresa passou a fornecer gás de maneira individualizada para diversos condomínios e, para tanto, cobrava mensalmente R$ 4,00 de cada unidade, sob a justificativa de que tal serviço (medição individualizada) exigia a substituição de equipamentos, instalação de medidores, emissão de faturas individuais e uma logística totalmente diferente, o que envolveria custos mais elevados.

A Associação Paulista de Consumidores ajuizou ação civil pública contra a Companhia, pedindo:

a) que fosse declarada a abusividade da cláusula contratual, com a condenação da ré a não mais inserir a referida previsão em seus contratos futuros, sob pena de multa de R$ 300 mil;

b) que fosse a ré condenada a devolver os valores recebidos de todos os consumidores lesados, em dobro e corrigidos;

c) que fosse a ré condenada a informar, por meio de publicações em jornais de grande circulação nas principais comarcas do país, a todos os consumidores submetidos aos efeitos da cláusula em tese abusiva para que se habilitassem nos autos da ação civil pública, para receber os valores de reembolso, sob pena de multa de R$ 300 mil.

 

Em 1ª instância, os pedidos foram julgados procedentes.

A Companhia Ultragaz S/A interpôs recurso de apelação, que foi desprovido.

Ainda inconformada, a Companhia interpôs recurso especial alegando que não há abusividade considerando que se trata de uma livre escolha do consumidor.

 

Para o STJ, existe abusividade nessa cobrança?

NÃO.

Conforme já explicado, no fornecimento de gás a condomínios residenciais, as empresas distribuidoras de GLP disponibilizam duas formas de contratação, quais sejam, a modalidade medição coletiva e a de fornecimento com leitura individualizada, cabendo a escolha à assembleia condominial de acordo com seus interesses.

Na segunda modalidade, adotada no caso concreto, há o fornecimento de gás a granel, mas com medição e gestão individualizada do consumo de cada unidade autônoma do condomínio - serviço executado pelo fornecedor do produto, que, em razão disso, cobra um preço previsto no respectivo contrato.

Não se mostra abusiva a cobrança de tarifa para medição individualizada quando assegurada a livre escolha dos consumidores na contratação, com liberdade na formação do preço, de acordo com seus custos e em atenção às características da atividade realizada, respeitando-se a equivalência material das prestações e demonstrada a correspondente vantagem do consumidor no caso.

Portanto, indiscutivelmente cada uma das modalidades colocadas à disposição gera riscos e custos diversos, tanto para a fornecedora como para os consumidores, cabendo a estes ponderarem quais delas melhor lhes atendem diante dos benefícios proporcionados e os custos por estes gerados.

É incontroverso que, na modalidade de contratação por medição individualizada, a distribuidora passa a ter inúmeros contratos em um mesmo condomínio, de modo que as diferentes contratações encerram características específicas para cada caso, justificando a cobrança de uma tarifa para a prestação de um serviço mais eficiente.

Dessa forma, denota-se que a escolha quanto à modalidade de contratação e à distribuidora que irá fornecer o serviço é livre aos condomínios, os quais são previamente informados sobre as características dos serviços prestados e seus custos, notadamente em relação à cobrança da taxa pelo serviço adicional de medição que integra o objeto da contratação por fornecimento com leitura individualizada.

Assim, não há uma imposição por parte da distribuidora quanto ao tipo de contratação do serviço, podendo o condomínio exercer sua escolha de forma livre, conforme a percepção do que melhor atenda aos seus interesses e aos dos condôminos, que optaram, por meio de assembleia condominial, pelo serviço proposto.

A modalidade por medição coletiva gera, na verdade, uma vantagem para a distribuidora e uma desvantagem para o consumidor, visto que o pagamento da integralidade do débito fica a cargo do condomínio, reduzindo as chances de não pagamento, e eventual inadimplemento de algum condômino pode causar o aumento da cota condominial dos demais condôminos adimplentes, assim como gera um custo maior para aqueles condôminos que consomem menor quantidade de GLP, já que serão obrigados a pagar o valor do rateio.

Assim, o exame do valor cobrado dos condôminos para o serviço de medição individual do consumo deve-se realizar em relação às vantagens identificadas na modalidade contratual, que pressupõe esta atividade como meio necessário para determinar certo modo de cobrança do efetivo proveito, assim como desonera o condomínio da responsabilidade pelo rateio entre os condôminos, e de suportar o custo dos inadimplentes.

A liberdade de iniciativa econômica consagrada pela ordem constitucional (arts. 1º, IV, e 170 da Constituição Federal) é pautada na livre concorrência, fomentando a competitividade entre os fornecedores em benefício dos consumidores, motivo pelo qual pode haver uma internalização moderada dos custos conforme as características da prestação do serviço.

Essa diferenciação será benéfica aos consumidores quando demonstrada a efetiva liberdade de escolha do consumidor quanto às modalidades de serviço com e sem a vantagem específica - com a observância do dever de informação e esclarecimento prévio dos consumidores em relação às opções existentes para sua escolha - e não houver restrições ou barreiras criadas pelo fornecedor com o propósito de desestimular o consumidor a optar pela contratação menos custosa.

Diante disso, vê-se que, na hipótese em apreço, o valor da tarifa é proporcional ao serviço prestado; a opção pela medição individualizada foi feita livremente pelo condomínio, sem nenhum constrangimento por parte da fornecedora, estando comprovada a real vantagem para os consumidores, não se tratando da transferência de um custo ordinário do produto ou do seu fornecimento. Isso porque os condôminos pagam exclusivamente pela quantidade de produto efetivamente consumida e evita que o conjunto dos condôminos seja onerado pelos custos da parcela do rateio não paga por eventuais inadimplentes.

 

Em suma:


Dizer o Direito!