DECISÃO DO STF RESTRINGINDO O FORO POR PRERROGATIVA
DE FUNÇÃO
Em maio de 2018, o STF decidiu
restringir o foro por prerrogativa de função dos Deputados Federais e
Senadores.
O art. 53, § 1º e o art. 102, I, “b”,
da CF/88 preveem que, em caso de crimes comuns, os Deputados Federais e os
Senadores serão julgados pelo STF.
Ocorre que o Supremo conferiu uma
interpretação restritiva a esses dispositivos e afirmou o seguinte:
O foro por prerrogativa de função
aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e
relacionados às funções desempenhadas.
STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min.
Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018 (Info 900).
Em outras palavras, os Deputados
Federais e Senadores somente serão julgados pelo STF se:
· o crime
tiver sido praticado durante o exercício do mandato de parlamentar federal; e
· se
estiver relacionado com essa função.
O entendimento que restringe o foro por
prerrogativa de função vale para outras hipóteses de foro privilegiado ou
apenas para os Deputados Federais e Senadores?
Vale para outros casos de foro por
prerrogativa de função. Foi o que decidiu o próprio STF no julgamento do Inq.
4703 QO/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12/06/2018, no qual afirmou que o
entendimento vale também para Ministros de Estado.
O STJ também decidiu que a restrição do
foro deve alcançar Governadores. Explico.
O art.
105, I, “a”, da CF/88 prevê que compete ao STJ julgar os crimes praticados por
Governadores de Estado:
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal
de Justiça:
I - processar e julgar,
originariamente:
a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal,
e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de
Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos
Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais
Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os
membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério
Público da União que oficiem perante tribunais;
A Corte Especial do STJ, seguindo o
mesmo raciocínio do STF, limitou a amplitude do art. 105, I, “a”, da CF/88 e
decidiu que:
O foro por prerrogativa de função no
caso de Governadores deve ficar restrito aos fatos ocorridos durante o
exercício do cargo e em razão deste.
Assim, o STJ é competente para julgar
os crimes praticados pelos Governadores somente se estes delitos tiverem sido
praticados durante o exercício do cargo e em razão deste.
STJ. Corte Especial. APn 857/DF, Rel.
para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/06/2018.
STJ. Corte Especial. APn 866/DF, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/06/2018.
DECISÃO QUE RESTRINGE O FORO
POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO NÃO SE APLICA PARA DESEMBARGADORES
O art. 105, I, “a”, da CF/88 prevê que
os Desembargadores dos Tribunais de Justiça são julgados criminalmente pelo
STJ. O entendimento acima exposto (que restringiu o foro para crimes
relacionados com o cargo) é aplicado também para os Desembargadores dos
Tribunais de Justiça? Se um Desembargador praticar crime que não esteja
relacionado com o exercício de suas funções (ex: lesão corporal contra a
esposa), ele será julgado pelo juízo de 1ª instância?
NÃO.
O Superior
Tribunal de Justiça é o tribunal competente para o julgamento nas hipóteses em
que, não fosse a prerrogativa de foro (art. 105, I, da Constituição Federal), o
desembargador acusado houvesse de responder à ação penal perante juiz de
primeiro grau vinculado ao mesmo tribunal.
Assim,
mesmo que o crime cometido pelo Desembargador não esteja relacionado com as
suas funções, ele será julgado pelo STJ se a remessa para a 1ª instância
significar que o réu seria julgado por um juiz de primeiro grau vinculado ao
mesmo tribunal que o Desembargador.
A
manutenção do julgamento no STJ tem por objetivo preservar a isenção
(imparcialidade e independência) do órgão julgador.
STJ. Corte
Especial. QO na APn 878-DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 21/11/2018
(Info 639).
É uma espécie de “exceção” ao
entendimento do STJ que restringe o foro por prerrogativa de função.
O STJ entendeu que haveria um risco à
imparcialidade caso o juiz de 1º instância julgasse um Desembargador
(autoridade que, sob o aspecto administrativo, está em uma posição
hierarquicamente superior ao juiz).
DECISÃO QUE
RESTRINGE O FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO NÃO SE APLICA PARA CONSELHEIROS DOS
TRIBUNAIS DE CONTAS
O art. 105, I, “a”, da CF/88 prevê que
os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal são
julgados criminalmente pelo STJ. O entendimento acima exposto (que restringiu o
foro para crimes relacionados com o cargo) é aplicado também para os Conselheiros
dos Tribunais de Contas? Se um Conselheiro praticar crime que não esteja
relacionado com o exercício de suas funções (ex: lesão corporal contra a
esposa), ele será julgado pelo juízo de 1ª instância?
NÃO.
Conforme vimos acima, o STJ decidiu
que:
Mesmo que
o crime cometido pelo Desembargador não esteja relacionado com as suas funções,
ele será julgado pelo STJ se a remessa para a 1ª instância significar que o réu
seria julgado por um juiz de primeiro grau vinculado ao mesmo tribunal que o
Desembargador.
A
manutenção do julgamento no STJ tem por objetivo preservar a isenção
(imparcialidade e independência) do órgão julgador.
STJ. Corte
Especial. QO na APn 878-DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 21/11/2018
(Info 639).
Esse mesmo raciocínio deve ser aplicado para os Conselheiros
dos Tribunais de Contas considerando que eles são equiparados a Magistrados. É
o que prevê o art. 73, § 3º c/c o art. 75 da CF/88:
Art. 73 (...)
§ 3º Os Ministros do Tribunal de
Contas da União terão as mesmas garantias, prerrogativas, impedimentos,
vencimentos e vantagens dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça,
aplicando-se-lhes, quanto à aposentadoria e pensão, as normas constantes do
art. 40.
Art. 75. As normas estabelecidas
nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização
dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos
Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.
Importante esclarecer que essa
mesma “exceção” já havia sido construída para os membros do Ministério Público,
que continuam com foro por prerrogativa de função mesmo que o crime cometido
não tenha relação com o cargo. Veja:
Compete aos tribunais de justiça estaduais processar e julgar os
delitos comuns, não relacionados com o cargo, em tese praticados por Promotores
de Justiça.
STJ. 3ª Seção. CC 177.100-CE, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik,
julgado em 08/09/2021 (Info 708).
Em suma:
STJ. Corte
Especial. AgRg na Rcl 42.804/DF, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 16/8/2023 (Info
783).