Imagine a seguinte situação adaptada:
A Lei Estadual 7.990/2001, do Estado da Bahia, ao instituir o Estatuto
dos Policiais Militares daquele Estado, estabeleceu o pagamento de
auxílio-transporte para os integrantes da categoria.
No entanto, mesmo após a edição da lei, esse benefício não estava
sendo pago por ausência de regulamentação.
Por entender que a omissão do Estado em regulamentar o benefício
caracterizava ilegalidade, a Associação de Policiais e Bombeiros do Estado impetrou
mandado de segurança, objetivando seu imediato pagamento.
Após regular processamento, o TJ/BA concedeu a ordem, para que fosse
implementado o auxílio-transporte nos contracheques dos associados da
Impetrante, adotando-se por analogia os parâmetros estabelecidos pelo Decreto
Estadual 6.192/97 até que a matéria fosse regulamentada.
Determinou-se, ainda, o pagamento retroativo do benefício, desde a
data da impetração (05/03/2015).
Essa decisão transitou em julgado.
Execução individual
Regina, policial militar da Bahia, ingressou com execução individual
de sentença, objetivando receber os valores correspondentes ao
auxílio-transporte devido no período de março/2015 a dezembro/2018 (impetração
até a data da efetiva implementação).
Segundo os cálculos da exequente, o valor devido perfazia R$ 20 mil.
Citado, o Estado da Bahia apresentou impugnação alegando excesso de
execução.
O TJ/BA acolheu a impugnação reconhecer o excesso de execução.
A exequente não se conformou e interpôs recurso ordinário
constitucional, com fundamento no art. 105, II, “b”, da CF/88:
Art. 105. Compete ao Superior
Tribunal de Justiça:
(...)
II - julgar, em recurso
ordinário:
(...)
b) os mandados de segurança
decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos
tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a
decisão;
(...)
O que decidiu o STJ?
A 2ª Turma do STJ não conheceu do recurso ordinário.
Como vimos acima, o art. 105, II,
“b”, da Constituição Federal prevê o cabimento de recurso ordinário para o STJ,
em “mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais
Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e
Territórios, quando denegatória a decisão”.
Perceba que o dispositivo
constitucional não menciona a possiblidade de recurso ordinário em caso de
execução de mandado de segurança.
As hipóteses de cabimento de
recurso ordinário para o STJ constituem rol taxativo.
Assim, a hipótese prevista no art. 105, II, “b”, da CF/88, qual seja,
o cabimento de recurso ordinário nos processos de mandado de segurança
decididos em única instância pelos TRFs ou pelos TJs, quando denegatória a
decisão, não poderia ser estendida para as decisões proferidas em sede
impugnação ao cumprimento de sentença proferida em mandado de segurança.
A mesma orientação é adotada pelo
STF, em relação ao recurso ordinário previsto no art. 102, II, da Constituição
Federal (RMS 36.462 AgR, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe de
23/4/2020).
Qual seria então o recurso
cabível?
Recurso especial ou recurso
extraordinário, a depender da matéria impugnada.
O STJ não poderia ter
admitido o recurso ordinário como se fosse recurso especial aplicando o
princípio da fungibilidade?
NÃO. O STJ tem entendido que o
princípio da fungibilidade recursal não é aplicável à situação em que o recurso
ordinário constitucional é manejado fora das hipóteses taxativamente enumeradas
no art. 105, II, do texto constitucional.
Em suma:
Não cabe recurso ordinário
constitucional em sede de execução em mandado de segurança.
STJ. 2ª Turma. Pet 15.753-BA, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado
em 15/8/2023 (Info 783).
No mesmo sentido:
O rol de hipóteses de cabimento do recurso ordinário, do art.
102, II, “a”, CF, é taxativo, razão pela qual deve-se reconhecer o não
cabimento de recurso ordinário constitucional em sede de execução em mandado de
segurança.
STF. 2ª Turma. Pet
5.397 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 9/3/2015.