Imagine a seguinte situação
hipotética:
João ajuizou ação de cobrança
contra Pedro.
O réu foi citado pessoalmente,
mas não apresentou contestação nem constituiu advogado para representá-lo em
juízo.
Diante disso, o juiz decretou a sua revelia, nos termos do
art. 344 do CPC:
Art. 344. Se o réu não contestar
a ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de
fato formuladas pelo autor.
Em sentença, o magistrado
condenou Pedro a pagar R$ 100 mil em favor do autor.
Houve o trânsito em julgado.
O que acontece agora?
João terá que ingressar com uma petição
em juízo requerendo o cumprimento da sentença.
A partir do requerimento do credor, o
que faz o juiz?
O juiz determina a intimação do devedor para pagar a quantia em um prazo máximo de 15
dias:
Art. 523. No caso de condenação
em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre
parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a
requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15
(quinze) dias, acrescido de custas, se houver.
O credor alegou, no
entanto, que seria desnecessária a intimação do devedor considerando que ele já
foi citado pessoalmente na fase de conhecimento e, mesmo assim, permaneceu
revel. Logo, para o credor, não deveria haver mais nenhuma intimação. Essa tese
foi acolhida pelo STJ?
NÃO. Mesmo que o devedor tenha
sido citado pessoalmente na fase de conhecimento e tenha sido revel, quando
chegar a fase de cumprimento de sentença o juiz terá que determinar sim a sua
intimação.
Como é feita essa
intimação?
Via postal, ou seja, por carta,
com aviso de recebimento (AR).
Qual é o fundamento para
isso?
Inciso II do
§ 2º do art. 513 do CPC/2015:
Art. 513 (...)
§ 2º O devedor será intimado para
cumprir a sentença:
I - pelo Diário da Justiça, na pessoa
de seu advogado constituído nos autos;
II - por carta com aviso de recebimento, quando
representado pela Defensoria Pública ou quando não tiver procurador constituído nos autos, ressalvada a
hipótese do inciso IV;
III - por meio eletrônico, quando, no
caso do § 1º do art. 246, não tiver procurador constituído nos autos
IV - por edital, quando, citado na
forma do art. 256, tiver sido revel na fase de conhecimento.
§ 3º Na hipótese do § 2º, incisos II e
III, considera-se realizada a intimação quando o devedor houver mudado de
endereço sem prévia comunicação ao juízo, observado o disposto no parágrafo
único do art. 274.
Por que esse devedor não é
intimado por edital, na forma do inciso IV?
Porque esse inciso IV trata da
situação em que o devedor, na fase de conhecimento, foi citado por edital
(“citado na forma do art. 256” = citação por edital) e ficou revel. Logo, se o
devedor revel foi citado por edital ele será também intimado por edital na fase
de cumprimento de sentença.
Em nosso exemplo, o devedor foi
citado pessoalmente (e não por edital), de maneira que não pode se
aplicar a previsão do inciso IV.
Por que será necessário
intimar o devedor no cumprimento de sentença que ele tenha sido revel na fase
de conhecimento?
Foi uma escolha do CPC/2015 para
fortalecer o contraditório.
A norma processual é clara e não
permite nenhum outro entendimento a respeito do tema, sendo, por conseguinte,
causa de nulidade a ausência de intimação da parte revel em fase de cumprimento
de sentença, não obstante ter sido devidamente citada na ação de conhecimento.
Em suma:
STJ. 4ª
Turma. REsp 2.053.868-RS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em
6/6/2023 (Info 780).
No mesmo sentido:
Ainda que citado pessoalmente na fase de conhecimento, é devida
a intimação por carta do réu revel, sem procurador constituído, para o cumprimento
de sentença.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.760.914-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 02/06/2020 (Info 673).