Organização Internacional
do Trabalho (OIT)
A Organização Internacional do
Trabalho (OIT) é uma agência das Nações Unidas, criada em 1919, pelo Tratado de
Versalhes, da qual o Brasil foi signatário.
“A missão da OIT é promover
oportunidades para que homens e mulheres possam ter acesso a um trabalho
decente e produtivo, em condições de liberdade, equidade, segurança e
dignidade.” (https://www.ilo.org/brasilia/conheca-a-oit/lang--pt/index.htm)
A OIT formula normas
internacionais do trabalho, que assumem a forma de convenções e recomendações.
As convenções, quando ratificadas
por um país membro, são vinculantes (obrigatórias).
As recomendações, por sua vez,
servem apenas como diretrizes, não sendo vinculantes (softlaw).
Essas normas tratando sobre uma
ampla gama de tópicos relacionados ao trabalho, incluindo condições de
trabalho, segurança no trabalho, direito à organização, negociação coletiva,
erradicação do trabalho forçado e infantil, entre outros.
A Convenção da OIT é
considerada um tratado internacional?
SIM.
“As convenções da OIT são
tratados multilaterais que não se diferenciam de qualquer outro tratado
internacional, consistindo em acordos que adotam a forma escrita e que vinculam
juridicamente os Estados que deles façam parte. Encontram-se abertas à ratificação
de qualquer Estado membro da Organização.” (PORTELA Paulo Henrique Gonçalves. Direito
internacional público e privado. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 572)
Convenção 158 OIT
A Convenção nº 158 da OIT trata
sobre o término da relação de trabalho por iniciativa do empregador,
estabelecendo parâmetros de proteção ao trabalhador contra a despedida
arbitrária ou sem justa causa. O documento foi aprovado na 68ª reunião da
Conferência Internacional do Trabalho, em 2 de junho de 1982, em Genebra,
entrando em vigor no plano internacional em 23 de novembro de 1985 e vindo a
ser ratificada por 36 países, entre eles o Brasil.
Denúncia de um tratado
“A denúncia é o ato unilateral
pelo qual uma parte em um tratado anuncia sua intenção de se desvincular de um
compromisso internacional de que faça parte, desobrigando-se de cumprir as
obrigações estabelecidas em seu bojo sem que isso enseje a possibilidade de
responsabilização internacional.
Logicamente, a denúncia extingue
o tratado bilateral. Nos atos multilaterais, a denúncia implica apenas a
retirada da parte do acordo, cujos efeitos cessam para o denunciante, mas
permanecem para os demais signatários. Cabe destacar que autores como Ricardo
Seitenfus chamam a denúncia de compromissos multilaterais de ‘retirada’.
A denúncia isenta o Estado
signatário de cumprir as normas dos tratados. Entretanto, é ato que produz
efeitos ex nunc, não excluindo as obrigações estatais relativas a atos ou
omissões ocorridas antes da data em que venha a produzir efeitos.” (PORTELA
Paulo Henrique Gonçalves. Direito internacional público e privado.
Salvador: Juspodivm, 2021, p. 128)
Denúncia da Convenção 158 da OIT
Em 1996, o Presidente da
República editou o Decreto nº 2.100/96, por meio do qual fez a denúncia da
Convenção nº 158, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Veja o que disse o Decreto:
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, torna
público que deixará de vigorar para o Brasil, a partir de 20 de novembro de
1997, a Convenção da OIT nº 158, relativa ao Término da Relação de Trabalho por
Iniciativa do Empregador, adotada em Genebra, em 22 de junho de 1982, visto
haver sido denunciada por Nota do Governo brasileiro à Organização
Internacional do Trabalho, tendo sido a denúncia registrada, por esta última, a
20 de novembro de 1996.
ADC
Surgiram questionamentos a
respeito da validade desse Decreto. Entidades de proteção ao trabalhador
argumentaram que ele seria inconstitucional, porque para a denúncia de um
tratado, seria necessária não apenas a iniciativa do Presidente da República,
mas também a aprovação do Congresso Nacional. Como não houve, no caso concreto,
a aprovação, essa denúncia teria descumprido o texto constitucional.
Diante desse cenário de controvérsia
judicial relevante, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e
Turismo (CNC) e a Confederação Nacional do Transporte (CNT) propuseram ADC em
face do Decreto nº 2.100/1996.
Argumentaram que o Decreto nº
2.100/96 seria constitucional porque o Presidente da República possui a
prerrogativa de denunciar tratados, convenções e atos internacionais,
prescindindo, para tanto, de anuência do Congresso Nacional.
Para que haja a denúncia de
um tratado internacional é necessária a aprovação do Congresso Nacional?
SIM.
A aprovação e a internalização de tratados internacionais
estão disciplinadas expressamente na Constituição Federal:
Art. 84. Compete privativamente ao
Presidente da República:
(...)
VIII - celebrar tratados, convenções e
atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
Art. 49. É da competência exclusiva do
Congresso Nacional:
I - resolver definitivamente sobre
tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos
gravosos ao patrimônio nacional;
(...)
Por outro lado, a denúncia e a respectiva
exclusão dos tratados internacionais não foram tratadas de forma expressa no
texto constitucional.
Mesmo diante desse silêncio do
legislador constituinte, o STF concluiu que a exclusão dos tratados
internacionais incorporadas ao ordenamento jurídico interno não pode ocorrer
por vontade exclusiva do Presidente da República, sob pena de vulnerar o
princípio democrático, a separação de Poderes, o sistema de freios e
contrapesos e a própria soberania popular. Assim, uma vez ingressado no
ordenamento jurídico pátrio mediante referendo do Congresso Nacional, a
supressão do tratado internacional pressupõe também a chancela popular por meio
de seus representantes eleitos.
Os tratados promulgados se
transformam em legislação nacional e, assim sendo, sua revogação deve se dar
por norma equivalente e posterior.
É dizer, por paralelismo, a
revogação de normas que foram regularmente aprovadas pelos representantes do
povo só pode observar o mesmo procedimento, pois, do contrário, o ato careceria
de legitimidade e se traduziria em antidemocrático. Aliás, é intrínseco ao
Estado Democrático de Direito que não apenas os cidadãos, mas também os
titulares do Poder se submetam às leis, as quais não podem ser alteradas ou
simplesmente revogadas unilateralmente, sem observância do devido processo
legislativo.
Destarte, se é exigível a
anuência do Parlamento para que um compromisso internacional assumido pelo
chefe do Poder Executivo seja vinculante perante a ordem jurídica interna, o
ato de desobrigar-se dessa
avença, de forma a alterar
novamente o direito vigente, requer, necessariamente, a chancela congressual.
Também é essa a conclusão de
Valerio de Oliveira Mazzuoli , que vislumbra a questão sob a óptica do “comando
constitucional (art. 1º, parágrafo único) segundo o qual todo o poder emana do
povo, incluindo-se nessa categoria também o poder de denunciar tratados ”
(MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público . Rio de
Janeiro: Editora Forense, 14. ed., 2021, p. 267).
A importância da participação do
Poder Legislativo na denúncia de tratados torna-se ainda mais evidente quanto
se tem em perspectiva normas de proteção aos direitos humanos, como é o caso da
Convenção nº 158 da OIT, cujo intuito é a proteção dos trabalhadores contra a
dispensa arbitrária, o que figura na Constituição Federal como um direito
social (art. 7º, inciso I).
O STF fixou a seguinte tese a
respeito do tema:
STF.
Plenário. ADC 39/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/6/2023 (Info 1099).
Isso significa que a
denúncia da Convenção 158 da OIT precisava ter sido aprovada pelo Congresso
Nacional?
SIM.
Isso significa então que, com a decisão do STF, a Convenção 158 da OIT
voltou a produzir efeitos no Brasil?
NÃO.
O STF decidiu modular os efeitos
da decisão e, desse modo, o entendimento acima explicado deve ser aplicado
somente a partir da publicação da ata do presente julgamento, mantendo-se a
eficácia das denúncias realizadas até esse marco temporal.
Assim, em homenagem ao princípio
da segurança jurídica, o STF decidiu que deveria ser mantida a validade do
Decreto 2.100/1996, por meio do qual o Presidente da República tornou pública a
denúncia da Convenção 158 da OIT.
Embora, à luz do ordenamento
constitucional, a denúncia de tratados internacionais dependa de anuência do
Congresso Nacional para surtir efeitos internamente, a prática institucional
resultou em uma aceitação tácita da denúncia unilateral por reiteradas vezes e
em períodos variados da história nacional, de modo que se consubstanciou em
costume consolidado pelo tempo e que vinha sendo adotado de boa-fé e com justa
expectativa de legitimidade, eis que, até então, não foi formalmente
invalidado.
Em
decorrência do próprio Estado Democrático de Direito e de seu corolário, o
princípio da legalidade, é necessária a manifestação de vontade do Congresso
Nacional para que a denúncia de um tratado internacional produza efeitos no
direito doméstico, razão pela qual é inconstitucional a denúncia unilateral
pelo Presidente da República. Contudo, esse entendimento deve ser aplicado
somente a partir da publicação da ata do presente julgamento, mantendo-se a
eficácia das denúncias realizadas até esse marco temporal.
STF.
Plenário. ADC 39/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/6/2023 (Info 1099).
Com base nesses entendimentos, o
Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para manter a validade do
Decreto nº 2.100/1996 e formular apelo ao legislador “para que elabore
disciplina acerca da denúncia dos tratados internacionais, a qual preveja a
chancela do Congresso Nacional como condição para a produção de efeitos na
ordem jurídica interna, por se tratar de um imperativo democrático e de uma
exigência do princípio da legalidade”.