Dizer o Direito

domingo, 6 de agosto de 2023

O exame de corpo de delito poderá, em determinadas situações, ser dispensado para a configuração de lesão corporal ocorrida em âmbito doméstico, na hipótese de subsistirem outras provas idôneas da materialidade do crime

Imagine a seguinte situação hipotética:

João foi até a casa de sua ex-companheira e a agrediu e a ameaçou por estar suspeitando que ela teria um novo relacionamento amoroso.

O irmão da vítima chegou em casa logo após as agressões, tendo visto e fotografado as lesões produzidas no corpo da irmã.

Em seguida, Regina procurou a Delegacia para noticiar o fato.

Vale ressaltar que, na Delegacia, não foi realizado exame de corpo de delito e as fotografias não foram periciadas.

João foi denunciado e condenado pelos crimes de lesão corporal e ameaça no contexto doméstico e familiar.

A defesa recorreu alegando insuficiência de provas para condenação, ausência de laudo de exame de corpo de delito e falta de comprovação de que as fotos eram da data do crime.

 

A questão chegou até o STJ. Os argumentos da defesa foram acolhidos?

SIM. O STJ absolveu o réu.

A palavra da vítima detém especial importância nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica, devido ao contexto de clandestinidade em que normalmente ocorrem. Todavia, a tese não deve ser vulgarizada a ponto de esvaziar o conteúdo normativo do art. 158 do CPP:

Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

 

Por um lado, incumbe ao Poder Judiciário responder adequadamente aos que perpetram atos de violência doméstica, a fim de assegurar a proteção de pessoas vulneráveis, conforme preconiza a Constituição Federal. Por outro, é um consectário do Estado de Direito preservar os direitos e garantias que visam a mitigar a assimetria entre os cidadãos e o Estado no âmbito do processo penal.

No caso concreto, não havia laudo emitido por médico particular, nem testemunha que tivesse presenciado o momento das agressões.

O exame de corpo de delito deixou de ser realizado, e as fotografias que instruem o feito, produzidas pelo irmão da vítima, não foram periciadas.

Nesse sentido, verifica-se que a condenação por lesão corporal foi proferida sem a realização de exame de corpo de delito. Ademais, as provas que deveriam suprir essa deficiência consistiam em fotografia não periciada, depoimento da vítima e relato de informante que não presenciou diretamente os fatos.

Com efeito, o exame de corpo de delito deixou de ser realizado e os elementos de prova restantes - fotografia não periciada, depoimento da vítima e relato de informante que não presenciou os fatos - se mostraram insuficientes para a manutenção da condenação.

A absolvição é medida que se impõe diante da falta de prova técnica exigida por lei, e cuja ausência não foi adequadamente suprida, nem devidamente justificada.

 

Em suma:


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