Imagine a seguinte situação
hipotética:
João ajuizou ação de cobrança
contra Pedro.
O pedido foi julgado procedente.
Houve trânsito em julgado.
O credor iniciou o cumprimento de
sentença.
Em 02/02, o Juiz determinou a
intimação de Pedro para que efetuasse o pagamento do débito em 15 dias, sob
pena de aplicação de multa de 10% e de honorários de 10%, nos termos do art.
523, § 1º, do CPC.
Em 10/02, Pedro opôs embargos de declaração
argumentando que a matéria discutida na ação já havia sido debatida em outro
processo. Requereu a condenação do autor como litigante de má-fé.
Em 10/04, o juiz prolatou decisão
rejeitando os embargos de declaração. Na decisão, o magistrado reabriu o prazo
para impugnação e para interposição de recurso.
Em 11/04, Pedro ingressou com impugnação.
João, o credor, interpôs agravo de instrumento alegando que o
juiz errou ao reabrir o prazo para impugnação. Isso porque o art. 1.026 do CPC,
prevê que a oposição de embargos de declaração interrompe apenas o prazo para
interposição de recurso, não interrompendo o prazo para defesa (no caso, a
impugnação):
Art. 1.026. Os embargos de
declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a interposição de recurso.
Por esse motivo, João sustentou
que a impugnação juntada aos autos não poderia ser conhecida, porque
apresentada após o prazo legal.
Agiu corretamente o
magistrado? A oposição de embargos de declaração interrompe o
prazo para apresentação de qualquer defesa, devendo ser feita uma interpretação
extensiva do art. 1.026 do CPC?
NÃO.
A interpretação extensiva é feita
quando se constata a carência de amplitude da lei, ou seja, a norma não fornece
o necessário para atender o caso em concreto.
Assim, a interpretação extensiva
é uma técnica interpretativa na qual o magistrado amplia o sentido da norma, de
forma a alcançar uma situação que, a princípio, não seria objeto dela.
Ressalte-se que a interpretação
extensiva não cria direito novo, mas apenas identifica o verdadeiro conteúdo e
alcance da lei, que não teria sido suficientemente expresso no texto normativo.
Nesse sentido, Maria Helena Diniz
ensina que a interpretação extensiva “desenvolve-se em torno de um preceito
normativo, para nele compreender casos que não estão expressos em sua letra,
mas que nela se encontra, virtualmente, incluídos, conferindo, assim, à norma o
mais amplo raio de ação possível. [...]. Não se acrescenta coisa alguma, mas se
dá às palavras contidas no dispositivo normativo o seu significado” (Compêndio
de Introdução à Ciência do Direito. 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 429).
Nessa perspectiva, não é possível
se reconhecer o cabimento de interpretação extensiva para ampliar a regra
contida no art. 1.026 do CPC. Isso porque o termo “recurso” não dá margem para
o intérprete validamente extrair o sentido de “defesa ajuizada pelo devedor”.
Se o Poder Judiciário conferisse interpretação extensiva no presente caso ele
estaria usurpando a função legislativa.
O STJ possui o entendimento
pacífico de que o rol de recursos, previsto no art. 994 do CPC, é taxativo.
Assim, por serem taxativas as hipóteses legais de recurso, não é possível
atribuir interpretação extensiva ao texto normativo. Desse modo, confere-se
previsibilidade e coerência na aplicação da lei, em observância à segurança
jurídica que deve permear a hermenêutica das normas processuais.
Em suma:
Os embargos de declaração interrompem o prazo apenas
para a interposição de recurso, não sendo possível conferir interpretação
extensiva ao art. 1.026 do Código de Processo Civil a fim de estender o
significado de recurso a quaisquer defesas apresentadas.
STJ. 4ª
Turma. REsp 1.822.287-PR, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em
6/6/2023 (Info 780).