domingo, 18 de junho de 2023
Lei municipal pode proibir a soltura de fogos de artifício?
De quem é a competência para legislar sobre meio ambiente
e saúde?
Trata-se de
competência concorrente, distribuída entre União, Estados/DF e Municípios, conforme previsto no art. 24, VI e XII c/c o art. 30,
I e II, da CF/88:
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
(...)
VI — florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do
solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
(...)
XII - previdência social,
proteção e defesa da saúde;
Art. 30. Compete aos Municípios:
I — legislar sobre assuntos de interesse local;
II — suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
Então, o Município detém competência para legislar sobre
meio ambiente e saúde?
SIM. O Município é competente para legislar sobre o meio
ambiente e saúde, juntamente com a União e o Estado-membro/DF, no limite do seu
interesse local e desde que esse regramento seja harmônico com a disciplina
estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI e XII c/c o art. 30, I e
II, da CF/88).
Feitas essas considerações, vejamos o caso concreto
enfrentado pelo STF:
No Município
de Itapetininga, interior do Estado de São Paulo, foi editada a Lei municipal nº
6.212/2017, que proibiu, na zona urbana, a soltura de fogos de artifício e
artefatos pirotécnicos. Veja:
Art. 1º Fica proibido na zona urbana do Município de Itapetininga a
soltura de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos que produzam estampido.
Art. 2º O descumprimento do disposto nesta Lei sujeitará os responsáveis
às seguintes penalidades:
I - multa de R$ 3.000 (três mil reais) à pessoa física infratora, e de
R$ 10.000 (dez mil reais) à pessoa jurídica infratora;
II - dobra do valor da multa na reincidência.
Art. 3º O Poder Executivo regulamentará esta Lei, no que couber.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Essa Lei é
constitucional?
SIM.
É constitucional lei municipal que veda a soltura de fogos de artifício e
artefatos pirotécnicos produtores de estampidos.
Constitucionalidade formal
A lei municipal que confere regulamentação mais
protetiva, considerados os impactos negativos à saúde e ao meio ambiente
advindos dos efeitos ruidosos causados com a queima de fogos de artifício e
outros artefatos similares, atua nos limites do regular exercício de sua
competência legislativa.
Na espécie, a proibição imposta pela Lei nº 6.212/2017 do
Município de Itapetininga/SP observa a disciplina normativa estabelecida no
âmbito federal.
Nesse sentido, a Resolução CONAMA 02/1990 — que dispõe
sobre o Programa Nacional de Educação e Controle da Poluição Sonora —
expressamente autoriza a fixação, a níveis estadual e municipal, de limites de
emissão de ruídos em valores mais rígidos.
Constitucionalidade material
A proibição de soltar fogos de artifício que causam
barulhos altos é um meio eficaz para proteger a saúde e o meio ambiente. Esta
medida mitiga os danos causados pelo ruído excessivo dos fogos de artifício a
indivíduos com hipersensibilidade auditiva, pessoas com transtorno do espectro
autista, crianças, idosos e pessoas com deficiência. Além disso, protege a
fauna em geral.
Nesse contexto, o legislador municipal privilegiou o
princípio da proteção à saúde e ao meio ambiente equilibrado. Em prol desses
valores, houve a regulamentação da liberdade jurídica dos particulares e da
livre exploração de atividades econômicas.
Ademais, a restrição é justificável em razão de premissas
empíricas, motivo pelo qual, diante da realidade fática local, inexiste ofensa
aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Em suma:
É
constitucional — por dispor sobre a proteção do meio ambiente e a proteção e
defesa da saúde, matérias de competência legislativa concorrente entre a União,
estados e DF (art. 24, VI e XII, CF/88), e estabelecer restrição necessária,
adequada e proporcional no âmbito de sua competência suplementar e nos limites
de seu interesse local (art. 30, I e II, CF/88) — lei municipal que veda a
soltura de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos produtores de
estampidos.
STF. Plenário.
RE 1.210.727/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 9/5/2023 (Repercussão Geral –
Tema 1056) (Info 1093).
Tese fixada pelo STF:
É
constitucional – formal e materialmente – lei municipal que proíbe a soltura de
fogos de artifício e artefatos pirotécnicos produtores de estampidos.
STF. Plenário.
RE 1.210.727/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 9/5/2023 (Repercussão Geral –
Tema 1056) (Info 1093).
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade,
ao apreciar o Tema 1.056 da repercussão geral, negou provimento ao recurso
extraordinário.
O STF tem adotado o entendimento de que a legislação
municipal pode ampliar a proteção do meio ambiente:
Cabe aos
municípios promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos
que possam causar impacto ambiental de âmbito local.
STF. Plenário.
ADI 2142/CE, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/6/2022 (Info 1060).
O Município é
competente para legislar sobre o meio ambiente, juntamente com a União e o
Estado-membro/DF, no limite do seu interesse local e desde que esse regramento
seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art.
24, VI, c/c o art. 30, I e II, da CF/88).
O STF julgou
inconstitucional lei municipal que proíbe, sob qualquer forma, o emprego de
fogo para fins de limpeza e preparo do solo no referido município, inclusive
para o preparo do plantio e para a colheita de cana-de-açúcar e de outras
culturas.
Entendeu-se que
seria necessário ponderar, de um lado, a proteção ao meio ambiente obtida com a
proibição imediata da queima da cana e, de outro, a preservação dos empregos
dos trabalhadores que atuem neste setor. No caso, o STF entendeu que deveria
prevalecer a garantia dos empregos dos trabalhadores canavieiros, que merecem
proteção diante do chamado progresso tecnológico e da respectiva mecanização,
ambos trazidos pela pretensão de proibição imediata da colheita da cana
mediante uso de fogo.
Além disso, as
normas federais que tratam sobre o assunto apontam para a necessidade de se
traçar um planejamento com o intuito de se extinguir gradativamente o uso do
fogo como método despalhador e facilitador para o corte da cana. Nesse sentido:
Lei 12.651/2012 (art. 40) e Decreto 2.661/98.
STF. Plenário. RE
586224/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/3/2015 (repercussão geral) (Info
776).