Dizer o Direito

sexta-feira, 24 de março de 2023

Se não houver, no Município, nenhum hospital credenciado que possa oferecer o tratamento necessário para o usuário do plano de saúde, a operadora deverá custear o serviço em um hospital não credenciado

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

Regina, residente em São Bernardo do Campo (SP), cliente do plano de saúde X, foi diagnosticada com câncer.

Ao tentar fazer o tratamento quimioterápico foi informada que o plano de saúde havia cancelado os contratos de credenciamento com todos os hospitais da cidade. Em outras palavras, não existiam mais hospitais credenciados ao plano em São Bernardo do Campo (SP).

Regina procurou o plano de saúde que orientou que ela se deslocasse à São Paulo (SP) para ali realizar o tratamento. Foi a única alternativa dada pela operadora. Ocorre que isso seria muito custoso e sacrificante para ela.

Diante desse cenário, Regina ajuizou ação de obrigação de fazer contra o plano de saúde pedindo para que ela fosse autorizada a realizar o tratamento em um hospital não credenciado no seu Município e que o plano de saúde fosse condenado a reembolsar integralmente os custos que ela tivesse.

 

Após tramitar nas instâncias ordinárias, o pedido de Regina foi aceito pelo STJ?

SIM.

A Resolução Normativa nº 259/2011, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), prevê que não for possível oferecer o serviço na rede credenciada, a operadora deverá garantir o atendimento, preferencialmente, no âmbito do mesmo município, ainda que por prestador não integrante da rede credenciada do plano de saúde, cujo pagamento se dará mediante acordo entre as partes (operadora do plano e prestador). Confira:

Da Ausência ou Inexistência de Prestador Credenciado no Município

Art. 4º Na hipótese de ausência ou inexistência de prestador credenciado, que ofereça o serviço ou procedimento demandado, no município pertencente à área geográfica de abrangência e à área de atuação do produto, a operadora deverá garantir o atendimento em prestador não credenciado no mesmo município.

§ 1º O pagamento do serviço ou procedimento será realizado diretamente pela operadora ao prestador não credenciado, mediante acordo entre as partes.

§ 2º Na impossibilidade de acordo entre a operadora e o prestador não credenciado, a operadora deverá garantir o transporte do beneficiário até o prestador credenciado para o atendimento, independentemente de sua localização, assim como seu retorno à localidade de origem, respeitados os prazos fixados no art. 3º.

§ 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º se aplica ao serviço de urgência e emergência, sem necessidade de autorização prévia.

 

Assim, somente em caso de inexistência de qualquer prestador no Município (credenciado, ou não), é que será devido o atendimento em município limítrofe.

Logo, no caso concreto, o plano de saúde X deveria ter oferecido custear a quimioterapia em um hospital, não credenciado, de São Bernardo do Campo (SP). Se não existisse nenhum hospital que oferecesse esse serviço na localidade, aí sim, é que a orientação seria para procurar um Município limítrofe.

Ressalte-se, que, nessas hipóteses, a operadora tem a obrigação, ainda, de custear o transporte do beneficiário (ida e volta) e se, por qualquer motivo, descumprir a garantia de atendimento, incidirá o disposto no art. 9º, que prevê reembolso integral:

Art. 9º Se o beneficiário for obrigado a pagar os custos do atendimento, na hipótese de descumprimento do disposto nos arts. 4º, 5º ou 6º, a operadora deverá reembolsá-lo integralmente no prazo de até 30 (trinta) dias, contado da data da solicitação de reembolso, inclusive as despesas com transporte.

Parágrafo único. Para os produtos que prevejam a disponibilidade de rede credenciada mais a opção por acesso a livre escolha de prestadores e não ocorrendo as hipóteses de que tratam os arts. 4º, 5º ou 6º, o reembolso será efetuado nos limites do estabelecido contratualmente, caso o beneficiário opte por atendimento em estabelecimentos de saúde não participantes da rede assistencial.

 

Seja em razão da primazia do atendimento no município pertencente à área geográfica de abrangência, ainda que por prestador não integrante da rede credenciada, seja em virtude da não indicação, pela operadora, de prestador junto ao qual tenha firmado acordo, bem como diante da impossibilidade de a parte autora se locomover a município limítrofe, afigura-se devido o reembolso integral das despesas realizadas, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data da solicitação de reembolso, conforme previsão expressa do art. 9º da RN n. 259/11 da ANS.

 

Em suma:

Plano de saúde tem o dever de reembolsar as despesas médico-hospitalares realizadas por beneficiário fora da rede credenciada na hipótese em que descumpre o dever de garantir o atendimento no mesmo município, ainda que por prestador não integrante da rede assistencial.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.842.475/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Marco Buzzi, julgado em 27/9/2022 (Info 765).

 

DOD Plus – precedente que norteia o STJ nesses casos:

Apenas em situações excepcionais é que o plano de saúde será obrigado a reembolsar o usuário por despesas realizadas fora da rede credenciada

O plano de saúde somente é obrigado a reembolsar as despesas que o usuário teve com tratamento ou atendimento fora da rede credenciada em hipóteses excepcionais, como por exemplo, em casos de:

• inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local; e

• urgência ou emergência do procedimento.

STJ. 2ª Seção. EAREsp 1459849/ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/10/2020 (Info 684).

 

 


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