Imagine a seguinte situação hipotética:
Suzana e Pedro eram casados e tiveram um filho chamado de
Tiago.
O casal se divorciou e ficou ajustado, na sentença, que:
- Tiago ficaria morando com Pedro; e que
- Suzana (a mãe) pagaria pensão alimentícia em favor do
filho (50% do salário-mínimo).
Suzana tornou-se inadimplente e Tiago, representado por seu
pai, ingressou com cumprimento de sentença.
O juiz decretou a prisão civil de Suzana.
Quando uma pessoa devedora de alimentos é presa, ela
fica em uma unidade prisional como se estivesse em regime fechado?
Sim, no entanto, deverá ficar separada dos presos comuns.
É o que afirma expressamente o § 4º do art. 528 do CPC:
Art. 528 (...) § 4º A prisão será
cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.
Habeas corpus
Suzana impetrou habeas corpus alegando que possui outro
filho (Arthur), de 3 anos de idade, que depende integralmente de sua presença.
Diante disso, pediu que a sua prisão civil, que seria
normalmente em regime fechado (art. 528, § 4º, do CPC), fosse convertida para
prisão domiciliar, aplicando-se, por analogia, a regra do art. 318, V, do CPP:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva
pela domiciliar quando o agente for:
(...)
V - mulher com filho de até 12
(doze) anos de idade incompletos;
O pedido de Suzana foi acolhido pelo STJ? É possível
aplicar o art. 318, V, do CPP, por analogia, para a prisão civil por dívidas
alimentares?
SIM.
A prisão civil da devedora de alimentos pode ser convertida,
do regime fechado para o domiciliar, caso ela tenha filho de até 12 anos de
idade, aplicando-se, por analogia, o art. 318, V, do Código de Processo Penal.
O art. 318, V, do CPP não é uma regra isoladamente criada
com o fim específico de atender ao direito processual penal. Ele é parte de um conjunto
de regras destinadas à promoção de uma política pública de proteção à primeira
infância (Lei nº 13.257/2016).
Pretende-se, com esse conjunto de regras, minimizar os
riscos e diminuir os efeitos naturalmente nocivos que o afastamento parental produz
em relação aos filhos.
Desse modo, se a finalidade essencial da regra do art. 318,
V, do CPP, é a proteção integral da criança, minimizando-se as chances de ela
ser criada no cárcere conjuntamente com a mãe ou colocada em família substituta
ou em acolhimento institucional na ausência da mãe encarcerada, mesmo diante da
hipótese de possível prática de um ilícito penal, não há razão para que essa
mesma regra não se aplique às mães encarceradas em virtude de dívida de
natureza alimentar, observada a necessidade de adaptação desse entendimento às
particularidades dessa espécie de execução.
Desse modo, não há dúvida de que, na hipótese de
inadimplemento da dívida, deve haver a segregação da devedora de alimentos, com
a finalidade de incomodá-la a ponto de buscar todos os meios possíveis de
solver a obrigação, mas essa restrição ao direito de ir e vir deve ser
compatibilizada com a necessidade de obter recursos financeiros aptos não
apenas a quitar a dívida alimentar em relação ao exequente, mas também suprir
as necessidades básicas do filho que se encontra sob a sua guarda.
Em suma:
STJ. 3ª Turma. HC 770.015/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em
7/2/2023 (Info 763).