Imagine a seguinte situação hipotética:
A Companhia Estadual de Águas e Esgotos cobra, todos os
meses, dos usuários, uma “tarifa de esgotamento sanitário”, debitada na própria
conta de água.
João ajuizou ação contra a Companhia pedindo a devolução dos
valores pagos nos últimos 5 anos a título de tarifa de esgotamento sanitário.
Alegou não existe o tratamento de esgoto no bairro onde mora, razão pela qual a
ré não pode cobrar essa tarifa.
A Companhia contestou a demanda afirmando que, a despeito de
não haver o serviço de tratamento de esgoto no bairro de João, há a coleta de
dejetos, serviço esse que é parte integrante do complexo serviço de tratamento
de água e esgoto.
O pedido de João encontra amparo na jurisprudência do
STJ?
NÃO.
Em 2013, a Primeira Seção do STJ, no REsp 1.339.313/RJ,
julgado sob o rito dos recursos repetitivos, firmou em 2013 o entendimento de
que a legislação que trata sobre a matéria autoriza que a concessionária cobre tarifa
de esgotamento sanitário, ainda que não haja o cumprimento de todas as etapas
do serviço:
(...) 2. À luz do disposto no art. 3º da Lei 11.445/2007 e no
art. 9º do Decreto regulamentador 7.217/2010, justifica-se a cobrança da tarifa
de esgoto quando a concessionária realiza a coleta, transporte e escoamento dos
dejetos, ainda que não promova o respectivo tratamento sanitário antes do
deságue.
3. Tal cobrança não é afastada pelo fato de serem utilizadas as
galerias de águas pluviais para a prestação do serviço, uma vez que a
concessionária não só realiza a manutenção e desobstrução das ligações de
esgoto que são conectadas no sistema público de esgotamento, como também trata
o lodo nele gerado.
4. O tratamento final de efluentes é uma etapa posterior e
complementar, de natureza socioambiental, travada entre a concessionária e o
Poder Público.
5. A legislação que rege a matéria dá suporte para a cobrança da
tarifa de esgoto mesmo ausente o tratamento final dos dejetos, principalmente
porque não estabelece que o serviço público de esgotamento sanitário somente
existirá quando todas as etapas forem efetivadas, tampouco proíbe a cobrança da
tarifa pela prestação de uma só ou de algumas dessas atividades. (...)
6. Diante do reconhecimento da legalidade da cobrança, não há o
que se falar em devolução de valores pagos indevidamente, restando, portanto,
prejudicada a questão atinente ao prazo prescricional aplicável as ações de
repetição de indébito de tarifas de água e esgoto.
7. Recurso especial provido, para reconhecer a legalidade da
cobrança da tarifa de esgotamento sanitário. Processo submetido ao regime do
artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.339.313/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
julgado em 12/6/2013 (Recurso Repetitivo – Tema 565).
Naquela ocasião o STJ ainda afirmou que não é possível nem
mesmo a concessão de redução (“desconto”) proporcional da tarifa de acordo com
as etapas do serviço efetivamente prestadas. Em outras palavras, a
concessionária pode cobrar a tarifa de esgotamento sanitário e pode cobrar no
valor “cheio”. O STJ entende que, se o serviço público está sendo prestado,
ainda que não contemple todas as suas fases, é devida a cobrança da tarifa.
Voltando ao caso concreto:
O serviço de esgotamento sanitário é formado por um complexo
de atividades (coleta, transporte, tratamento e disposição final dos dejetos no
meio ambiente).
A companhia que faz a coleta de dejetos. Assim, é devido o
pagamento da tarifa de esgotamento sanitário. Isso porque, para o STJ, a prestação
de qualquer uma dessas atividades acima mencionadas é suficiente para,
autonomamente, permitir a cobrança integral da respectiva tarifa.
Em suma:
STJ. 2ª
Turma. Ag 1.308.764-RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 16/8/2022 (Info
Especial 8).