Imagine a seguinte situação
hipotética:
O banco ajuizou ação de cobrança
contra João. O pedido foi julgado procedente e transitou em julgado.
O banco ingressou, então, com
cumprimento de sentença cobrando a quantia devida.
O juiz determinou a penhora de valores
que estavam na conta bancária de João.
O devedor interpôs agravo de
instrumento sustentando que não poderia ter havido a penhora porque seriam
verbas de natureza alimentar.
As partes foram intimadas para se
manifestarem, no prazo de 15 dias, acerca de eventual oposição ao julgamento
virtual do agravo de instrumento.
João, dentro do prazo assinalado,
apresentou petição dizendo que se opunha ao julgamento virtual e que deseja que
o julgamento fosse presencial.
Mesmo com a oposição, o Tribunal
de Justiça julgou o recurso em sessão virtual e negou provimento ao agravo de
instrumento.
João interpôs recurso especial alegando a
nulidade do julgamento, por desrespeitar a manifesta oposição à forma de
julgamento virtual.
O STJ deu provimento ao recurso de João?
Houve nulidade?
NÃO.
Inicialmente, é importante
assinalar que o julgamento virtual é uma forma de julgamento válida, conforme
pacífica jurisprudência do STJ:
Não há que se falar em nulidade do julgamento virtual porque ele
está em consonância com os princípios da colegialidade, da adequada duração do
processo e do devido processo legal.
STJ. Corte Especial. AgRg no AgRg no RE nos EDcl na APn 327/RR,
DJe 30/6/2020.
Para o STJ, a mera oposição da
parte ao julgamento virtual não tem o condão de determinar (obrigar) a
ocorrência do julgamento em sessão presencial ou telepresencial. Isso porque não
há lei que imponha essa consequência.
Em sua redação originária, o art.
945, §§ 2º e 3º, do CPC/2015 previa o direito de as partes apresentarem discordância do
julgamento por meio eletrônico, sem necessidade de motivação, “sendo apta a
determinar o julgamento em sessão presencial”.
Ocorre
que esses dispositivos foram revogados pela Lei nº 13.256/2016, ficando
consignado no parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania no
respectivo Projeto de Lei (PL nº 2.384/2015), que a revogação ocorreu porque
autorizava as partes, sem motivação, “solicitar julgamento presencial, mesmo
quando não houver previsão de sustentação oral, o que pode ampliar sobremaneira
o número de petições a serem analisadas pelos tribunais superiores,
inviabilizando a Corte e o funcionamento do plenário virtual”.
Desse modo, como não há, no
ordenamento jurídico vigente, o direito de exigir que o julgamento ocorra por
meio de sessão presencial, o fato de o julgamento ter sido realizado de forma
virtual, mesmo com a oposição expressa e tempestiva da parte, não é, por si só,
causa de nulidade.
Destaca-se que a decretação de
nulidade de atos processuais depende de efetiva demonstração de prejuízo da
parte interessada (pas de nullité sans grief), por prevalência do
princípio da instrumentalidade das formas.
Com efeito, a realização do
julgamento por meio virtual, mesmo com a oposição pela parte, não acarreta, em
regra, prejuízo nas hipóteses em que não há previsão legal ou regimental de
sustentação oral, sendo imprescindível, para a decretação de eventual nulidade,
a comprovação de efetivo prejuízo na situação.
Além disso, mesmo quando há o
direito de sustentação oral, se o seu exercício for garantido e viabilizado na
modalidade de julgamento virtual, não haverá qualquer prejuízo ou nulidade,
ainda que a parte se oponha a essa forma de julgamento, porquanto o direito de
sustentar oralmente as suas razões não significa o de, necessariamente, o fazer
de forma presencial.
Em suma:
STJ. 3ª
Turma. REsp 1.995.565-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/11/2022 (Info
762).
DOD Plus –
informações complementares
O requerimento para a não inclusão do recurso em plenário
virtual deve ser fundamentado, não bastando a mera oposição sem indicação das
razões que justifique o julgamento telepresencial.
STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 2.164.849/RS, Rel. Min. João
Otávio de Noronha, julgado em 12/12/2022.
A pretensão de sustentar oralmente não é suficiente para impedir
que o presente recurso seja incluído em pauta virtual (e-Julg), tendo em vista
que o Superior Tribunal de Justiça implementou funcionalidade, na plataforma de
julgamento virtual, para que os advogados, nos casos previstos em lei, possam
enviar arquivos de áudio ou vídeo com suas sustentações orais.
Ademais, as partes podem também apresentar memoriais, por meio
eletrônico ou mediante petição nos autos e, durante o julgamento eletrônico,
todos os Ministros que compõem o Órgão Colegiado têm acesso ao conteúdo
integral do voto do Relator e dos autos, e a sessão tem duração
substancialmente maior que a do julgamento presencial, do que resulta um exame
ainda mais acurado por seus Membros.
STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1.814.753/MG, Rel. Min. Antonio
Carlos Ferreira, julgado em 12/12/2022.