Dizer o Direito

terça-feira, 31 de janeiro de 2023

A prerrogativa da escolha do momento para a nomeação de candidato, aprovado dentro das vagas ofertadas em concurso público, é da Administração Pública, durante o prazo de validade do certame

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

João fez concurso para o cargo de Professor do Município.

O edital oferecia 36 vagas e João foi aprovado na 20ª posição, ou seja, dentro do número de vagas.

O prazo de validade do concurso era de 2 anos, prorrogável por mais 2 anos.

Em outubro de 2020, o resultado final do certame foi homologado.

Em janeiro de 2021, o Município efetuou a contratação temporária de 40 professores para a rede municipal de ensino.

Diante disso, em março de 2021, João impetrou mandado de segurança dizendo que tinha o direito subjetivo de ser nomeado e empossado imediatamente.

O Tribunal de Justiça negou a segurança e o impetrante interpôs recurso ordinário.

 

O pedido de João foi acolhido pelo STJ?

NÃO.

O impetrante, por ter sido aprovado dentro do número de vagas, possui direito à nomeação. No entanto, a prerrogativa da escolha do momento em que isso ocorrerá durante o prazo de validade do certame pertence à Administração Pública, conforme entendimento fixado pelo STF:

Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público.

STF. Plenário. RE 598099, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/08/2011.

 

A contratação temporária configura, por si só, preterição arbitrária de candidato aprovado em concurso público?

NÃO.

A contratação temporária, por si só, não configura preterição arbitrária ou ilegal de candidato aprovado em concurso público.

A contratação temporária possui previsão na própria Constituição Federal (art. 37, IX), o que demonstra a sua regularidade intrínseca. Assim, só se pode dizer que a contratação é ilegal se ela não cumpriu os requisitos da lei de regência (no caso, a lei do Município que regulamente as contratações temporárias). Nesse sentido:

A teor do RE 837.311/PI, julgado sob o regime da repercussão geral, como regra o candidato aprovado em cadastro de reserva não é titular de direito público subjetivo à nomeação, não bastando para a convolação da sua expectativa o simples surgimento de vagas ou a abertura de novo concurso, antes exigindo-se ato imotivado e arbitrário da Administração Pública.

Para que a contratação temporária se configure como ato imotivado e arbitrário, a sua celebração deve deixar de observar os parâmetros estabelecidos no RE 658.026/MG, também julgado sob a sistemática da repercussão geral, bem como há de haver a demonstração de que a contratação temporária não se destina ao suprimento de vacância existente em razão do afastamento temporário do titular do cargo efetivo e de que existem cargos vagos em número que alcance a classificação do candidato interessado.

STJ. 2ª Turma. RMS 60.682/MT, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/08/2019.

 

Requisitos estabelecidos pelo STF para a validade da contratação temporária

O STF, em sede de repercussão geral, enumerou os requisitos para a verificação da regularidade da contratação temporária do art. 37, IX, da CF:

O conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da Constituição Federal pode ser resumido, ratificando-se, dessa forma, o entendimento da Corte Suprema de que, para que se considere válida a contratação temporária, é preciso que:

a) os casos excepcionais estejam previstos em lei;

b) o prazo de contratação seja predeterminado;

c) a necessidade seja temporária;

d) o interesse público seja excepcional;

e) a necessidade de contratação seja indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração.

STF. Plenário. RE 658026/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 9/4/2014 (Info 742).

 

Cabe pontuar, em acréscimo, que a contratação temporária opera-se, via de regra, para o desempenho de função pública, conceito que não se confunde com o de “cargo público”, e sendo assim o desempenho da função não significa necessariamente a existência de cargo público permanentemente vago. Pode-se cogitar, por exemplo, a hipótese da contratação para o suprimento de vacância temporária, como aquelas decorrentes de férias, licenças-saúde, afastamento para o desempenho de outros cargos comissionados, em que o cargo efetivo ocupado ainda se encontra preenchido, apenas o seu titular encontrando-se momentaneamente afastado.

 

Em suma:

A prerrogativa da escolha do momento para a nomeação de candidato, aprovado dentro das vagas ofertadas em concurso público, é da Administração Pública, durante o prazo de validade do certame.

STJ. 2ª Turma. RMS 68.657-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 27/9/2022 (Info Especial 8).

 

Veja como o tema já foi cobrado em prova:

þ (Juiz Federal TRF4) Dentro do prazo de validade do concurso público, a Administração pode escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não pode dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, constitui um direito do concursando aprovado dentro do número de vagas previstas e, dessa forma, um dever imposto ao poder público. (certo)

 

 

 


segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Polícia Militar pode ser obrigada a fornecer informações sobre quantos soldados foram nomeados e deixaram o cargo em determinado período

 

Imagine a seguinte situação:

João requereu ao Comandante Geral da Polícia Militar do Estado que informasse quantos soldados foram nomeados e quantos deixaram o cargo no período de janeiro de 2012 a dezembro de 2015.

A autoridade respondeu que não poderia fornecer essas informações porque elas seriam sigilosas.

Diante disso, João impetrou mandado de segurança pedindo judicialmente o fornecimento dessas informações.

O Tribunal de Justiça denegou a segurança (julgou improcedente o pedido) argumentando que as informações sobre o contingente da Polícia Militar podem ser direcionadas para uma utilização errônea que comprometa a segurança coletiva, razão pela qual teria sido correta a recusa já que são dados sigilosos.

Ainda inconformado, João interpôs recurso especial.

 

Para o STJ, as informações requeridas deverão ser fornecidas?

SIM.

A Constituição Federal prevê, em seu art. 5º, XXXIII, que:

Art. 5º (...)

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgão públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo de lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.

 

Desse modo, “no regime de transparência brasileiro, vige o Princípio da Máxima Divulgação: a publicidade é regra, e o sigilo, exceção, sem subterfúgios, anacronismos jurídicos ou meias-medidas.” (STJ. 1ª Seção. REsp 1.857.098/MS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 24/05/2022).

No mesmo sentido é a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) que prevê que a publicidade é o preceito geral, sendo o sigilo excepcional:

Art. 3º Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes:

I - observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção;

(...)

 

Em suma:

Quando não demonstrada, em concreto, nenhuma razão para se entender que a manutenção do sigilo de informações dos órgãos públicos é útil à segurança da sociedade e do Estado e imprescindível a essa finalidade, deve-se prevalecer a regra da publicidade.

STJ. 1ª Turma. RMS 54.405-GO, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 9/8/2022 (Info Especial 8).

 

No caso, não foi demonstrada, em concreto, nenhuma razão para se entender que a manutenção do sigilo quanto às informações requeridas fossem minimamente úteis à segurança da sociedade e do Estado e “imprescindíveis” a essa finalidade.

Busca o autor, em resumo, saber quantas nomeações e vacâncias de soldados existiram em um dado período de tempo. Não se está pretendendo saber detalhes específicos e pessoais de uma ou algumas nomeações ou vacâncias; não se pretende saber como o efetivo existente se distribui, como deverá ser alocado ou qual a estratégia utilizada para sua alocação; não se busca saber nada de caráter estratégico da Polícia Militar (planos, projetos, execuções etc.).

A publicidade das informações solicitadas pelo autor não afeta em nada a segurança da corporação militar, do Estado ou da sociedade.

Ante o exposto, o STJ deu provimento ao recurso especial para conceder a ordem, determinando que a autoridade coatora fornecesse, no prazo de 30 dias, às informações solicitadas.

 


domingo, 29 de janeiro de 2023

Revisão para o concurso de Juiz de Direito do TJDFT


Olá, amigas e amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível a Revisão para o concurso de Juiz de Direito do TJDFT.

Bons estudos.












Revisão para o concurso de Promotor de Justiça do Amazonas (MP/AM)


Olá, amigas e amigos do Dizer o Direito,

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Bons estudos.










quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

Lições da SuperAprendizagem para Concurseiros

 

Por George Marmelstein, juiz federal

Você já ficou frustrado por estudar por várias e várias horas e não progredir? Você tem a percepção de que estagnou no seu processo de aprendizagem e está cada vez mais desmotivado para seguir em frente?

Se sim, aposto que você está aprendendo da forma errada.

É provável que você esteja contaminado pela ilusão de aprendizagem, achando que está estudando quando, no fundo, por não usar métodos eficientes, está apenas ocupando a mente com informações que serão rapidamente esquecidas. E o pior: está deixando de utilizar todo o seu potencial, pois quem não aplica os melhores métodos vive em estado subótimo de funcionamento e nem se dá conta disso.

 Na verdade, poucas pessoas dominam a habilidade de aprender com eficiência. Você deve conhecer algumas delas. São “cisnes negros” que parecem desafiar todos os limites da capacidade humana. É como se fossem hackers que conseguiram quebrar o código da aprendizagem e, graças a isso, conseguem alcançar resultados incríveis em pouco tempo de preparação. Eu os chamo de superaprendizes, pessoas aparentemente normais que adquiriram a habilidade de aprender com a máxima eficiência possível.

Antes da internet, os segredos da superaprendizagem era uma espécie de fórmula secreta compartilhada apenas por poucas pessoas. Mas alguns superaprendizes, como o Josh Waitzkin, Tim Ferriss e Scott Young, começaram a mostrar para o mundo como otimizar o processo de aprendizagem.

Josh Waitzkin, por exemplo, escreveu “The Art of Learning: An Inner Journey to Optimal Performance” (“A Arte da Aprendizagem: uma jornada pessoal à ótima performance”) em que explica os fundamentos e as técnicas que utilizou para alcançar a excelência no xadrez e nas artes marcais. Do mesmo modo, Tim Ferriss publicou “Ferramenta dos Titãs: as estratégias, hábitos e rotinas de bilionários, celebridades e atletas de elite”, que compila as táticas que vários top performers adotam para alcançar o sucesso em diversas áreas. Scott Young, na mesma linha, escreveu o livro Ultra-Aprendizado para contar a história de pessoas que conseguem aprender uma nova língua em poucos meses ou tocar um instrumento musical após pouco tempo de treino.

Inspirado por essa cultura, passei vários anos pesquisando os segredos da aprendizagem de alta performance e fiquei fascinado com a quantidade e a qualidade do conhecimento já produzido. Essa empolgação transformou-se no livro “Superaprendizagem: a ciência da alta performance cognitiva”, que sistematiza esse conhecimento e apresenta uma espécie de caixa de ferramentas para uma vida intelectualmente produtiva, com dicas práticas para realizar uma leitura de alto impacto, construir um sistema de anotação poderoso, aplicar técnicas efetivas de treino, montar uma rotina de acordo com o ciclo circadiano, aprimorar hábitos com sabedoria, e assim por diante.



Pode até parecer inconveniente, mas dedicar algumas horas à compreensão da aprendizagem é a melhor forma de evoluir mais rápido. Por exemplo, você conhece o seu horário nobre biológico? Você organiza a sua rotina de acordo com o seu cronotipo? Você estimula o inconsciente a trabalhar de modo difuso nas horas em que seu cérebro está relaxado? Você programa o seu sono para maximizar a fixação do conteúdo assimilado? Você não faz nem ideia do que tudo isso significa?

Se você não pensa sobre essas coisas, provavelmente está desperdiçando suas capacidades cognitivas. Quando adotamos as melhores estratégias para nos motivar, organizar o tempo, descansar corretamente, construir hábitos saudáveis e treinar com eficiência, a evolução ocorre naturalmente. E para adotar as melhores estratégias, é preciso conhecê-las.

Mas devo ser sincero. O livro não é uma "fórmula de aprovação", nem um método para tirar boas notas. É, na verdade, um sistema de desenvolvimento pessoal baseado na ideia de que qualquer pessoa pode aprender qualquer coisa com eficiência se dominar os métodos corretos.

Mesmo não sendo um livro “para passar em concursos”, a SuperAprendizagem é capaz de transformar radicalmente as estratégias tradicionais de preparação para concurso, pois mostra que o estudo deve ser encarado como um treino (prática deliberada) e apresenta vários caminhos para impulsionar a aprendizagem direcionada a testes.

Por exemplo, para aprender com eficiência, é fundamental organizar a rotina de acordo com o cronotipo, que varia de pessoa para pessoa. O cronotipo define os horários nobres biológicos, que são os momentos de pico cognitivo e devem ser bloqueados para a aprendizagem profunda, livre de distrações e com foco total na tarefa a ser desempenhada em estado de fluxo (flow). Aplicando a máxima “horários nobres, tarefas nobres; horários pobres, tarefas pobres”, somos capazes de extrair o máximo do nosso cérebro, sem desperdício de energia, de tempo e de dinheiro.

Outro exemplo. A SuperAprendizagem mostra que é preciso estimular o inconsciente a trabalhar de modo difuso nas horas em que o cérebro está relaxado. Indo além, quando encaramos o estudo como treino, devemos necessariamente inserir no cronograma de treino um sistema eficiente de descanso deliberado, pois é o descanso que proporciona a evolução. E isso vale com muito mais intensidade para o sono! Se você não sabe programar o sono para consolidar o conteúdo assimilado e gerar novas conexões em seu cérebro, provavelmente está fazendo tudo errado, jogando no lixo das memórias esquecidas todo o seu esforço de um dia de estudo.

Por fim, a preparação para um concurso é um treino em que importa não só acumular conhecimento, mas também desenvolver habilidades específicas para a prova.

Imagine, por exemplo, uma prova com 100 questões objetivas para ser feita em 4 horas. Uma prova assim é como uma prova de maratona. Ela exige um preparo físico e mental que só se consegue com um treino específico, sobretudo por meio de simulações. Usando a analogia do treino de corrida, não basta sentar na cadeira e resolver questões, ou seja, não basta correr aleatoriamente. O treino precisa ser direcionado ao desenvolvimento das habilidades necessárias para a realização da prova.

Aqui alguns modelos de simulações só para atiçar a curiosidade:

Simulações reais: reproduzindo, da maneira mais fidedigna possível, o máximo de condições que serão enfrentadas no dia da prova. Por exemplo, se a prova for impressa, a simulação real terá que ser impressa. Se o teste real contiver 100 questões, a simulação real terá 100 questões do mesmo nível e distribuídas de acordo com as matérias correspondentes. Se a prova tiver 4 horas de duração, a simulação deverá respeitar esse limite. Se o horário da prova for pela manhã, a simulação real deverá ser pela manhã. Enfim, o objetivo é aclimatar o corpo e a mente para que, no dia da prova, tudo flua da maneira mais natural possível.

Ultra-simulação: a ideia seria tomar a simulação real como base, mas acrescentar algumas questões extras para tornar o esforço ainda maior e, com isso, elevar a capacidade de resistência física e mental.

Micro-simulações: seria uma versão reduzida da simulação real. A ideia seria fazer uma quantidade menor de questões, reduzindo proporcionalmente o tempo. Afora isso, as condições seriam o mais próximo possível da realidade, a não ser pelo fato de os problemas serem intercalados (misturados). A SuperAprendizagem mostra que embaralhar questões é mais eficiente do que seguir um padrão por matéria.

Simulação fuzzi: o objetivo seria incluir algumas dificuldades de modo a forçar o cérebro a se acostumar com condições adversas. Por exemplo, pode-se fazer uma micro-simulação ou até mesmo uma simulação real com uma música alta ao fundo, ou em uma praça de alimentação de um shopping, ou com a temperatura bem baixa ou bem alta e assim por diante. Em alguns casos, vale colocar questões de matérias totalmente estranhas só para treinar o cérebro a pensar de modo versátil. A ideia é bagunçar mesmo o ambiente de teste, usando a lógica do “treino difícil/prova fácil”.

Hipersimulações: a proposta seria fazer uma ou duas sessões de 10 a 20 minutos de exercícios em modo ultra-acelelerado, tentando resolver as questões com o mínimo de reflexão possível para forçar o cérebro a desenvolver a capacidade de pensar rápido. Não é preciso se preocupar tanto em acertar, mas apenas em tentar compreender o problema e intuir rapidamente uma solução. Se for possível incluir algum método de feedback imediato, com um sistema de aprendizagem adaptativa, o processo seria ainda mais eficaz, já que poderia estimular o desenvolvimento da competência inconsciente, que é a habilidade de identificar padrões e intuir a solução mesmo sem ter uma clara consciência da razões por trás do palpite.

Tudo isso, junto com um sistema de formação de hábitos, de motivação, de descanso de qualidade, de treinos eficientes, de leitura de alto impacto compõem a estrutura central da SuperAprendizagem.

Apesar de ser suspeito, porque sou verdadeiramente fascinado pelo tema, acredito muito no poder transformador dessas ideias.

Quando dominamos conceitos como prática deliberada, dificuldades desejáveis, flow, entre várias outras, somos capazes de otimizar o tempo para não desperdiçar energia com práticas ineficientes. Além disso, podemos aprender a formar hábitos para construir uma rotina produtiva e evoluir continuamente sem estresse e sem depender da força de vontade. Enfim, somos capazes de aprender mais, mais rápido e melhor.

E essa é a mágica da SuperAprendizagem. Ela tem um efeito dominó que transforma o processo de evolução em algo prazeroso e que vai se tornando cada vez mais fácil de implementar.

Não é preciso ter algum tipo especial de superpoder de transformação para se tornar um superaprendiz. Basta ter a capacidade de buscar a melhoria contínua em tudo o que podemos controlar. Para nossa sorte, essa capacidade já está pré-configurada em nossas mentes. Só precisamos dar uma forcinha para ativá-la e conhecer os melhores métodos para deixar a plasticidade cerebral fazer o seu trabalho.

PS. Se quiser ser um dos primeiros a conhecer os segredos da SuperAprendizagem, clique aqui e adquira o livro.

 


segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Revisão para o concurso de Defensor Público de Rondônia (DPE/RO)

Olá, amigas e amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível a Revisão para o concurso de Defensor Público de Rondônia (DPE/RO).

Bons estudos.

 


Revisão para o concurso de Promotor de Justiça de Roraima (MP/RR)

Olá, amigas e amigos do Dizer o Direito,

Já está disponível a Revisão para o concurso de Promotor de Justiça de Roraima (MP/RR).

Bons estudos.

 


sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Titulares de serventias notariais e registrais não pagam salário-educação

 

Salário-educação

O salário-educação é uma contribuição social, existente desde 1964, sendo cobrada sobre o total das remunerações pagas ou creditadas pelas empresas, a qualquer título, aos segurados empregados.

Atualmente, essa contribuição é prevista no art. 212, §§ 5º e 6º da Constituição Federal:

Art. 212 (...)

§ 5º A educação básica pública terá como fonte adicional de financiamento a contribuição social do salário-educação, recolhida pelas empresas na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

§ 6º As cotas estaduais e municipais da arrecadação da contribuição social do salário-educação serão distribuídas proporcionalmente ao número de alunos matriculados na educação básica nas respectivas redes públicas de ensino. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

 

Os valores arrecadados com o salário-educação deverão ser utilizados para financiar a educação básica.

A previsão constitucional do art. 212, § 5º, foi regulamentada pelas Leis 9.424/96, 9.766/98 e 11.457/2007.

A constitucionalidade desta contribuição foi reconhecida pelo STF, que a traduziu no seguinte enunciado:

Súmula 732-STF: É constitucional a cobrança da contribuição do salário-educação, seja sob a Carta de 1969, seja sob a Constituição Federal de 1988, e no regime da Lei 9.424/96.

 

Feito este esclarecimento, imagine agora a seguinte situação hipotética:

Regina é titular do serviço de registro de imóveis.

No exercício dessas atividades, Regina emprega diretamente, como pessoa física, através de matrícula CAEPF (Cadastro de Atividades Econômicas da Pessoa Física), funcionários que prestam serviços de natureza não eventual, sob dependência, subordinação e mediante pagamento de salário.

Diante da sua condição de empregadora pessoa física, Regina recolhe à Receita Federal do Brasil as contribuições destinadas à seguridade social e aquelas descontadas de seus empregados.

Até aí, tudo bem.

Ocorre que a Receita Federal exigia que Regina também recolhesse, mensalmente, salário-educação, à alíquota de 2,5% sobre a remuneração paga aos seus empregados.

Regina não concordou com isso e impetrou mandado de segurança pedindo que fosse declarado que ela não tem obrigação de pagar o salário-educação (ação declaratória de inexigibilidade de obrigação tributária).

A impetrante argumentou que contribuição ao salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, em consonância com o art. 15 da Lei nº 9.424/96:

Art. 15. O Salário-Educação, previsto no art. 212, § 5º, da Constituição Federal e devido pelas empresas, na forma em que vier a ser disposto em regulamento, é calculado com base na alíquota de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o total de remunerações pagas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, assim definidos no art. 12, inciso I, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

 

Assim, ela, enquanto pessoa física, não teria obrigação de pagar a referida contribuição.

 

Assiste razão à impetrante?

SIM.

Em 2010, o STJ fixou a seguinte tese a respeito de quem são os sujeitos passivos do salário-educação:

A contribuição para o salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, assim entendidas as firmas individuais ou sociedades que assumam o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, em consonância com o art. 15 da Lei 9.424/96, regulamentado pelo Decreto 3.142/99, sucedido pelo Decreto 6.003/2006.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.162.307/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 24/11/2010 (Recurso Repetitivo – Tema 362).

 

Nos termos, ainda, da jurisprudência do STJ:

A definição do sujeito passivo da obrigação tributária referente à contribuição ao salário-educação foi realizada pelo art. 1º, § 3º, da Lei 9.766/98, pelo art. 2º, § 1º, do Decreto 3.142/99 e, posteriormente, pelo art. 2º, do Decreto 6.003/2006.

Sendo assim, em havendo lei específica e regulamento específico, não se aplica à contribuição ao salário-educação o disposto no parágrafo único do art. 15 da Lei 8.212/91, que estabelece a equiparação de contribuintes individuais e pessoas físicas a empresas no que diz respeito às contribuições previdenciárias. STJ. 2ª Turma. REsp 1.812.828/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 31/8/2022.

 

As pessoas físicas titulares de serviços notariais e de registro não se enquadram na definição de sujeito passivo da contribuição para o salário-educação, porque, desde o art. 178 da CF/69 o sujeito passivo da contribuição para o salário-educação são as empresas comerciais, industriais e agrícolas. O Tabelionato de Notas é uma serventia judicial, que desenvolve atividade estatal típica, não se enquadrando como empresa (STJ. 2ª Turma. REsp 262.972/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU 27/5/2002).

 

Em suma:

As pessoas físicas titulares de serviços notariais e de registro não se enquadram na definição de sujeito passivo da contribuição para o salário-educação.

STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 2.011.917-PR, Rel. Ministra Assusete Magalhães, julgado em 9/11/2022 (Info 760).

 


quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

O simples fato de o acusado ter antecedente por tráfico de drogas não autoriza a realização de busca domiciliar

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

A polícia recebeu denúncia anônima de que havia um homem armado nas imediações do bairro Ana Jacinta, em São Paulo (SP). A pessoa que fez a denúncia descreveu como seria esse homem.

Os policiais se dirigiram até o local e se depararam com um indivíduo com as características informadas na denúncia. Ao realizarem revista pessoal, encontraram uma pistola. Os policiais descobriram o nome completo do indivíduo por meio de seu documento pessoal que estava com ele.

Ainda na abordagem policial, em via pública, por meio do COPOM (Centro de Operações da Polícia Militar do Estado de São Paulo), os policiais checaram que o indivíduo possuía antecedente criminal por tráfico de drogas.

Diante dessa informação, os policiais decidiram colocar o indivíduo na viatura e seguir até a residência do suspeito para ali procurarem drogas.

Chegando ao local, os policiais afirmam que o indivíduo autorizou que eles entrassem na casa.

Com o auxílio de cães farejadores, os policiais encontram droga na residência do suspeito.

Com base nesses elementos informativos, o indivíduo foi condenado por:

a)       porte ilegal de arma de fogo (art. 14, caput, da Lei nº 10.826/2003); e

b)      por tráfico de drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006).

 

A defesa questionou a condenação por tráfico afirmando que a apreensão da droga foi nula por ofensa à inviolabilidade de domicílio.

 

O STJ concordou com os argumentos da defesa?

SIM.

 

Inviolabilidade de domicílio

A CF/88 prevê, em seu art. 5º, a seguinte garantia:

XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;

 

A inviolabilidade do domicílio é uma das expressões do direito à intimidade do indivíduo.

 

Entendendo o inciso XI:

Só se pode entrar na casa de alguém sem o consentimento do morador nas seguintes hipóteses:

Durante o DIA

Durante a NOITE

• Em caso de flagrante delito;

• Em caso de desastre;

• Para prestar socorro;

• Para cumprir determinação judicial (ex: busca e apreensão; cumprimento de prisão preventiva).

• Em caso de flagrante delito;

• Em caso de desastre;

• Para prestar socorro.

 

 

Assim, guarde isso: não se pode invadir a casa de alguém durante a noite para cumprir ordem judicial.

 

Flagrante delito

Vimos acima que, havendo flagrante delito, é possível ingressar na casa mesmo sem consentimento do morador, seja de dia ou de noite.

Um exemplo comum no cotidiano é o caso do tráfico de drogas. Diversos verbos do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 fazem com que este delito seja permanente:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

 

Assim, se a casa do traficante funciona como boca-de-fumo, onde ele armazena e vende drogas, a todo momento estará ocorrendo o crime, considerando que ele está praticando os verbos “ter em depósito” e “guardar”.

 

Diante disso, havendo suspeitas de que existe droga em determinada casa, será possível que os policiais invadam a residência mesmo sem ordem judicial e ainda que contra o consentimento do morador?

SIM. No entanto, no caso concreto, devem existir fundadas razões que indiquem que ali está sendo cometido um crime (flagrante delito). Essas razões que motivaram a invasão forçada deverão ser posteriormente expostas pela autoridade, sob pena de ela responder nos âmbitos disciplinar, civil e penal. Além disso, os atos praticados poderão ser anulados.

O STF possui uma tese fixada sobre o tema:

A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados.

STF. Plenário. RE 603616/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 4 e 5/11/2015 (repercussão geral – Tema 280) (Info 806).

 

O STJ também possui alguns julgados a respeito do assunto:

O ingresso regular da polícia no domicílio, sem autorização judicial, em caso de flagrante delito, para que seja válido, necessita que haja fundadas razões (justa causa) que sinalizem a ocorrência de crime no interior da residência.

A mera intuição acerca de eventual traficância praticada pelo agente, embora pudesse autorizar abordagem policial em via pública para averiguação, não configura, por si só, justa causa a autorizar o ingresso em seu domicílio, sem o seu consentimento e sem determinação judicial.

STJ. 6ª Turma. REsp 1574681-RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 20/4/2017 (Info 606).

 

No referido julgamento, concluiu-se, portanto, que, para legitimar-se o ingresso em domicílio alheio, é necessário tenha a autoridade policial fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida.

 

Voltando ao caso concreto

No caso, os policiais receberam uma denúncia anônima segundo a qual o acusado estava com uma arma de fogo em via pública, razão por que o abordaram e encontraram a referida arma. Depois disso, decidiram ir até a sua residência e entraram no imóvel com a suposta autorização do paciente, oportunidade em que soltaram cães farejadores de drogas, sob a justificativa de que o réu tinha um antecedente por tráfico.

Não houve referência a prévia investigação, monitoramento ou campanas no local, a afastar a hipótese de que se tratava de averiguação de informações robustas e atuais acerca da existência de drogas naquele lugar. Da mesma forma, não se fez menção a nenhuma atitude suspeita, externalizada em atos concretos, tampouco movimentação de pessoas típica de comercialização de drogas. A denúncia anônima, aliás, nem sequer tratava da presença de entorpecentes no imóvel, mas sim do porte de arma de fogo em via pública distante do domicílio, a qual já havia sido encontrada e apreendida.

 

 

Admitir a validade desse fundamento para, isoladamente, autorizar essa diligência invasiva, implicaria, em última análise, permitir que todo indivíduo que um dia teve algum registro criminal na vida tenha seu lar diuturnamente vasculhado pelas forças policiais, a ensejar, além da inadmissível prevalência do “Direito Penal do autor” sobre o “Direito Penal do fato”, uma espécie de perpetuação da pena restritiva de liberdade, por vezes até antes que ela seja imposta. Isso porque, mesmo depois de cumprida a sanção penal (ou até antes da condenação), todo sentenciado (ou acusado ou investigado) poderia ter sua residência vistoriada, a qualquer momento, para “averiguação” da existência de drogas, como se a anotação criminal lhe despisse para todo o sempre da presunção de inocência e da garantia da inviolabilidade domiciliar, além de lhe impingir uma marca indelével de suspeição.

As regras de experiência e o senso comum, somados às peculiaridades do caso concreto, não conferem verossimilhança à afirmação dos agentes policiais de que o paciente, depois de ser abordado e preso por porte de arma de fogo em via pública distante de sua residência, sabendo ter drogas em casa, haveria livre e espontaneamente franqueado a realização de buscas no imóvel com cães farejadores, os quais fatalmente encontrariam tais substâncias.

Em verdade, caberia aos agentes que atuam em nome do Estado demonstrar, de modo inequívoco, que o consentimento do morador foi livremente prestado, ou que, na espécie, havia em curso na residência uma clara situação de comércio espúrio de droga, a autorizar, pois, o ingresso domiciliar mesmo sem consentimento válido do morador.

 

Mesmo se ausente coação direta e explícita sobre o acusado, as circunstâncias de ele já haver sido preso em flagrante pelo porte da arma de fogo em via pública e estar detido, sozinho - sem a oportunidade de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos -, diante de dois policiais armados, poderiam macular a validade de eventual consentimento para a realização de busca domiciliar, em virtude da existência de um constrangimento ambiental/circunstancial.

STJ. 6ª Turma. HC 762.932-SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, julgado em 22/11/2022 (Info 760).

 

Isso porque a prova do consentimento do morador é um requisito necessário, mas não suficiente, por si só, para legitimar a diligência policial, porquanto deve ser assegurado que tal consentimento, além de existente, seja válido, isto é, livre de vícios aptos a afetar a manifestação de vontade.

 

O art. 152 do Código Civil, ao disciplinar a coação como um dos vícios do consentimento nos negócios jurídicos, dispõe que: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela”.

Se, no Direito Civil, que envolve, em regra, direitos patrimoniais disponíveis, em uma relação equilibrada entre particulares, todas as circunstâncias que possam influir na liberdade de manifestação da vontade devem ser consideradas, com muito mais razão isso deve ocorrer no Direito Penal (lato sensu), que trata de direitos indisponíveis de um indivíduo diante do poderio do Estado, em relação manifestamente desigual.

Retomando a situação em análise, uma vez que o acusado já estava preso por porte de arma de fogo em via pública, sozinho, diante de dois policiais armados, sem a opção de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos, não é crível que estivesse em plenas condições de prestar livre e válido consentimento para que os agentes de segurança estendessem a diligência com uma varredura especulativa auxiliada por cães farejadores em seu domicílio à procura de drogas, a ponto de lhe impor uma provável condenação de 5 a 15 anos de reclusão, além da pena prevista para o crime do art. 14 do Estatuto do Desarmamento, no qual já havia incorrido.

A diligência policial, no caso dos autos, a rigor, configurou verdadeira pescaria probatória (fishing expedition) no domicílio do acusado, definida pela doutrina como a:

“Apropriação de meios legais para, sem objetivo traçado, 'pescar' qualquer espécie de evidência, tendo ou não relação com o caso concreto. Trata-se de uma investigação especulativa e indiscriminada, sem objetivo certo ou declarado, que, de forma ampla e genérica, 'lança' suas redes com a esperança de 'pescar' qualquer prova, para subsidiar uma futura acusação ou para tentar justificar uma ação já iniciada”. (SILVA, Viviani Ghizoni da; MELO E SILVA, Philipe Benoni; MORAIS DA ROSA. Fishing expedition e encontro fortuito na busca e na apreensão: um dilema oculto do processo penal. 2ª ed. Florianópolis: Emais, 2022, p. 50).

 

Com efeito, uma vez que a arma de fogo mencionada na denúncia anônima já havia sido apreendida com o paciente em via pública (distante da residência, frise-se) e não existia nenhum indício concreto, nem sequer informação apócrifa, quanto à presença de drogas no interior do imóvel, não havia razão legítima para que os agentes de segurança se dirigissem até o local e realizassem varredura meramente especulativa à procura de entorpecentes com cães farejadores. Cabia-lhes, apenas, diante do encontro da arma de fogo em via pública, conduzir o réu à delegacia para a lavratura do auto de prisão em flagrante.

 

Resultado do julgamento

Diante do exposto, a ordem foi concedida para reconhecer a ilicitude das provas por esse meio obtidas, bem como de todas as que delas decorreram, e, por conseguinte, absolvê-lo em relação à prática do delito de tráfico de drogas.

 


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