Imagine a seguinte situação
hipotética:
João e Regina viviam em união
estável.
O relacionamento não deu mais
certo e Regina ajuizou ação de dissolução de união estável contra João.
O juiz proferiu sentença
declarando que houve união estável e reconhecendo que ela foi dissolvida. Além
disso, o magistrado condenou João a pagar, mensalmente, 15 salários-mínimos em
favor de Regina, a título de alimentos compensatórios.
O que são alimentos compensatórios?
Conforme explica Anderson Schreiber,
“Os alimentos
compensatórios são aqueles que buscam minimizar o desequilíbrio financeiro
entre os cônjuges ocorrido em decorrência do divórcio ou dissolução da união
estável, a fim de proporcionar aos ex-cônjuges ou ex-companheiros o mesmo
padrão socioeconômico. Esses alimentos podem ser estabelecidos de forma
limitada no tempo, como enquanto não for ultimada a partilha de bens, que
atribuirá a um dos ex-consortes patrimônio suficiente para dele extrair rendimentos
que assegurem a conservação do seu padrão de vida.” (Manual de Direito Civil
Contemporâneo. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020, p. 1322)
Os alimentos compensatórios, conforme os ensinamentos de
Rolf Madaleno (Manual de Direito das Famílias e das Sucessões, 3ª edição, Ana
Carolina Brochado Teixeira e Gustavo Pereira Leite Ribeiro - coordenadores, Rio
de Janeiro: Processo, 2017, p. 425), possuem o escopo de:
“(...) indenizar
por algum tempo ou não o desequilíbrio econômico causado pela brusca perda do padrão
socioeconômico do cônjuge ou convivente desprovido de maiores riquezas
materiais, sem pretender a igualdade econômica do ex-casal, mas justamente a
pensão compensatória procura reduzir os efeitos deletérios provocados pela
repentina indigência social causada pela ausência de recursos e de ingressos
que deixaram de aportar com a dissolução da união estável ou com o divórcio.
(...)
A pensão
compensatória não tem natureza alimentícia de manutenção permanente do cônjuge
ou convivente, mas carrega uma função de inquestionável finalidade
indenizatória, para equilibrar a alteração econômica do cônjuge ou convivente
financeiramente abalado pelo divórcio ou pela dissolução da convivência
informal, até esta disparidade reencontrar o seu ponto de igualdade e serem
desfeitas as desvantagens sociais causadas pela separação.”
Igualmente defende Maria Berenice
Dias (Manual de Direito das Famílias, Revista dos Tribunais, 12ª edição, 2017,
p. 621), pontuando que tais alimentos “não têm por finalidade suprir as necessidades
de subsistência do credor, mas corrigir ou atenuar grave desequilíbrio
econômico-financeiro ou abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge
desprovido de bens e de meação”.
Os chamados alimentos compensatórios, ou prestação
compensatória, não têm por finalidade suprir as necessidades de subsistência do
credor, tal como ocorre com a pensão alimentícia regulada pelo art. 1.694 do
CC/2002, senão corrigir ou atenuar grave desequilíbrio econômico-financeiro ou
abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge desprovido de bens e de meação.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.290.313/AL, Rel. Min. Antonio Carlos
Ferreira, julgado em 12/11/2013.
Voltando ao caso concreto:
Depois de algum tempo, João não
mais pagou os alimentos, tornando-se inadimplente.
Regina ingressou com cumprimento de sentença e pediu a
prisão civil do devedor, nos termos do art. 528, § 3º, do CPC:
Art. 528 (...)
§ 3º Se o executado não pagar ou se a
justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o
pronunciamento judicial na forma do § 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de
1 (um) a 3 (três) meses.
Cabe a prisão civil de
João?
NÃO.
Nos termos do art. 5º, LXVII, da
Constituição Federal, somente quando houver o inadimplemento inescusável e
voluntário por parte do responsável pelo pagamento de prestação alimentícia,
afigura-se possível e cabível a sua prisão civil.
A prisão por dívida de alimentos
é medida drástica e excepcional, que somente é admitida excepcionalmente,
quando imprescindível à subsistência do alimentando, não estando atrelada a uma
possível punição por inadimplemento, ou mesmo à forma de remição da dívida
alimentar, tendo como escopo coagir o devedor a pagar os alimentos devidos a
fim de preservar a sobrevivência do alimentando.
O inadimplemento dos alimentos
destinados à manutenção do padrão de vida do ex-cônjuge, que sofreu drástica
redução em razão da ruptura da sociedade conjugal - alimentos compensatórios -
não justifica a execução pelo rito da prisão, em razão de sua natureza
indenizatória, e não propriamente alimentar (STJ. 3ª Turma. RHC 117.996/RS,
Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 2/6/2020).
Em suma:
O inadimplemento de alimentos compensatórios,
destinados à manutenção do padrão de vida de ex-cônjuge em razão da ruptura da
sociedade conjugal, não justifica a execução pelo rito da prisão, dada a
natureza indenizatória e não propriamente alimentar.
STJ. 4ª Turma. HC 744.673/SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em
13/09/2022 (Info 757).
Além disso, o STJ possui o entendimento
de que:
Quando o credor de débito alimentar for maior e capaz, e a
dívida se prolongar no tempo, atingindo altos valores, exigir o pagamento de
todo o montante, sob pena de prisão civil, é excesso gravoso que refoge aos
estreitos e justificados objetivos da prisão civil por dívida alimentar, para
desbordar e se transmudar em sanção por inadimplemento.
STJ. 3ª Turma.
HC 392.521/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/06/2017.