Ação de petição de herança
Ação de petição de herança é
aquela proposta por alguém que quer ser reconhecido como herdeiro do falecido
e, como via de consequência, ter direito à herança (no todo ou em parte).
Petição = pedido. Logo, petição de herança significa pedir a herança.
Trata-se de ação para que um
herdeiro preterido possa reivindicar a totalidade ou parte do acervo
hereditário, sendo movida contra o detentor da herança, com o objetivo de que seja
realizada nova partilha dos bens.
Ex1: mulher vivia em união
estável com o morto, mas isso não estava oficializado e os filhos do defunto
não a reconhecem como sua companheira. Ela poderá ajuizar ação de
reconhecimento de união estável post
mortem cumulada com petição de herança.
Ex2: filho não reconhecido pelo
morto poderá ajuizar ação de reconhecimento de paternidade post mortem cumulada com petição de herança.
Previsão
A petição de herança está prevista nos arts. 1.824 a 1.828
do CC:
Art. 1.824. O herdeiro pode, em ação de
petição de herança, demandar o reconhecimento de seu direito sucessório, para
obter a restituição da herança, ou de parte dela, contra quem, na qualidade de
herdeiro, ou mesmo sem título, a possua.
Prazo prescricional
A pretensão de petição de herança prescreve no prazo de 10
anos, nos termos do art. 205 do CC, já que não existe um prazo específico
fixado no Código:
Art. 205. A prescrição ocorre em dez
anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.
Imagine a seguinte situação
hipotética:
Em 2002, João, viúvo, faleceu e
deixou dois filhos: Antônio e Bento.
Com a morte, foi aberto
inventário e realizou-se a partilha dos bens de João entre os dois herdeiros
acima mencionados.
Ocorre que havia uma história que
poucos sabiam. João teve mais um filho (Carlos), que não foi registrado em seu
nome.
Em
2012, Maria, mãe de Carlos, decide contar a verdade para seu filho e o
incentiva a procurar seus direitos.
Diante disso, Carlos ajuíza ação
de investigação de paternidade post
mortem pedindo que seja reconhecido como filho de João. Havia várias provas
desse fato e a sentença foi procedente e transitou em julgado em 2014.
Em
2015, Carlos propôs ação de petição de herança contra Antônio e Bento pedindo a
sua parte na herança.
Os réus suscitaram a ocorrência
de prescrição, argumentando que a ação de petição de herança prescreve em 10
anos, contados da abertura da sucessão (morte).
Como a abertura da sucessão
ocorreu em 2002, João tinha até o ano de 2012 para propor a demanda.
O argumento dos réus é aceito
pelo STJ? O prazo prescricional para propor ação de petição de herança conta-se
da abertura da sucessão?
O STJ estava
dividido:
• 3ª Turma: NÃO
O prazo
prescricional só começa a ser contado com o trânsito em julgado da decisão que
reconheceu a paternidade.
Na hipótese em que ação de investigação de paternidade post
mortem tenha sido ajuizada após o trânsito em julgado da decisão de partilha de
bens deixados pelo de cujus, o termo inicial do prazo prescricional para o
ajuizamento de ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da
decisão que reconheceu a paternidade, e não o trânsito em julgado da sentença
que julgou a ação de inventário.
STJ. 3ª Turma. REsp 1475759-DF, Rel. Min. João Otávio de
Noronha, julgado em 17/5/2016 (Info 583).
• 4ª Turma: SIM
O prazo
prescricional começa a ser contado com a abertura da sucessão (data da morte do
autor da herança), ou, em se tratando de herdeiro absolutamente incapaz, da
data em que completa 16 anos.
O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de petição
de herança conta-se da abertura da sucessão, ou, em se tratando de herdeiro
absolutamente incapaz, da data em que completa 16 (dezesseis) anos, momento em
que, em ambas as hipóteses, nasce para o herdeiro, ainda que não legalmente
reconhecido, o direito de reivindicar os direitos sucessórios (actio nata).
STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 479648/MS, Rel. Min. Raul Araújo,
julgado em 10/12/2019.
Ao
julgar embargos de divergência, o STJ pacificou o tema. Qual das duas posições
prevaleceu?
A posição da 4ª
Turma:
O prazo prescricional para propor ação de petição de herança
conta-se da abertura da sucessão.
STJ. 2ª
Seção. EAREsp 1.260.418/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 26/10/2022 (Info 757).
O princípio da actio nata (actione non nata non
praescribitur - ação não nascida não prescreve), aplicado nos acórdãos
confrontados, encontra-se disciplinado no art. 189 do CC/2002:
Art. 189. Violado o direito, nasce para
o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que
aludem os arts. 205 e 206.
Segundo esse dispositivo, o prazo
prescricional correrá a partir do momento em que for possível, em tese, propor
a ação, qual seja, a data em que afrontado o direito. Essa norma não exige que
o titular do direito tenha ciência da respectiva lesão.
Atualmente admite-se que a regra
geral, que adota a vertente objetiva na aplicação do princípio da actio nata,
comporta exceções, em decorrência ora de lei específica ora de circunstâncias
extremamente relevantes verificadas no caso concreto.
No presente caso, efetivamente
inexistem circunstâncias específicas que impliquem afastamento da regra geral
(corrente objetiva), sobretudo diante das demais normas que disciplinam a
sucessão, aplicáveis mesmo nos casos em que a condição de herdeiro ainda não
tenha sido reconhecida oficialmente.
Destaca-se que, pelo princípio da
saisine, a herança transmite-se no momento da abertura da sucessão (art. 1.784
do CC/2002).
Ademais, havendo questionamento
de alta indagação acerca da condição de herdeiro, tal matéria será remetida às
instâncias ordinárias, reservando-se o respectivo quinhão até a solução do caso
(art. 627, § 3º, e art. 628, § 2º, do CPC/2015).
Portanto, aberta a sucessão, o
herdeiro, independentemente do reconhecimento oficial de tal condição, poderá
imediatamente postular seus direitos hereditários nas vias ordinárias,
cabendo-lhe as seguintes opções:
a) propor ação de investigação de
paternidade cumulada com petição de herança;
b) propor concomitantemente, mas
em processos distintos, ação de investigação de paternidade e ação de petição
de herança. Em tal caso, ambas poderão tramitar simultaneamente, ou se poderá
suspender a petição de herança até o julgamento da investigatória;
c) propor ação de petição de
herança, na qual deverão ser discutidas, na esfera das causas de pedir, a
efetiva paternidade do falecido e a violação do direito hereditário. Tal opção,
na prática, revela causas de pedir e pedidos semelhantes aos deduzidos na
alternativa “a”.
Enfim, a defesa do direito
hereditário pode ser exercida de imediato, logo após a abertura da sucessão, prevalecendo
o entendimento firmado nos paradigmas da Quarta Turma.
A ausência de prévia propositura
de ação de investigação de paternidade, imprescritível, e de seu julgamento
definitivo não constitui óbice para o ajuizamento de ação de petição de herança
e para o início da contagem do prazo prescricional. A definição da paternidade
e da afronta ao direito hereditário, na verdade, apenas interfere na
procedência da ação de petição de herança.