Execução de alimentos
Existem dois regimes de cumprimento da
decisão que determina o pagamento de alimentos:
a) rito da prisão civil;
b) rito comum.
a) Rito da prisão civil:
Previsto no caput e nos §§ 1º a 7º do
art. 528 do CPC.
O juiz, a requerimento do exequente,
manda intimar o executado pessoalmente para, em 3 dias, pagar o débito, provar
que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo.
Se o executado não pagar ou se a
justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o
pronunciamento judicial, decretará a prisão civil do devedor pelo prazo de 1 a
3 meses.
A prisão será cumprida em regime
fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.
O cumprimento da pena não exime o
executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas.
Paga a prestação alimentícia, o juiz
suspenderá o cumprimento da ordem de prisão.
b) Rito comum:
Trata-se do cumprimento de sentença no
qual se buscará bens do devedor que possam ser utilizados para satisfação da
dívida. É como se fosse a execução de uma dívida comum.
Esse rito é adotado em duas situações:
1) quando o próprio credor escolher esse rito, renunciando à
possibilidade de pedir a prisão civil:
Art. 528 (...)
§ 8º O exequente pode optar por
promover o cumprimento da sentença ou decisão desde logo, nos termos do
disposto neste Livro, Título II, Capítulo III, caso em que não será admissível
a prisão do executado, e, recaindo a penhora em dinheiro, a concessão de efeito
suspensivo à impugnação não obsta a que o exequente levante mensalmente a
importância da prestação.
2) quando o débito alimentar se referir a prestações
vencidas há mais de 3 meses. Isso porque somente se pode pedir a prisão civil
de prestações alimentícias vencidas há menos de 3 meses:
Art. 528 (...)
§ 7º O débito alimentar que autoriza a
prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações
anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do
processo.
Súmula 309-STJ: O débito alimentar que autoriza a prisão civil
do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento
da execução e as que se vencerem no curso do processo.
É possível a cumulação dos
procedimentos de execução de alimentos?
SIM. É a posição atual do STJ:
Na cobrança de obrigação alimentar, é cabível a cumulação das
medidas executivas de coerção pessoal e de expropriação no âmbito do mesmo
procedimento executivo, desde que não haja prejuízo ao devedor nem ocorra
qualquer tumulto processual.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.930.593/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 9/8/2022 (Info 744).
É admissível a cumulação, em um mesmo processo, de
cumprimento de sentença de obrigação de pagar alimentos atuais, sob a técnica
da prisão civil, e alimentos pretéritos, sob a técnica da penhora e da
expropriação.
STJ. 3ª
Turma. REsp 2.004.516/RO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/10/2022 (Info
756).
Para a cobrança das três
últimas parcelas: é possível a técnica da prisão civil
Em se tratando de cumprimento de
sentença condenatória ao pagamento dos alimentos no qual se pleiteiam as três
últimas parcelas antes do requerimento e as que se vencerem no curso dessa fase
procedimental, é lícito ao credor optar pela cobrança mediante a adoção da
técnica da prisão civil ou da técnica da penhora e expropriação.
Para a cobrança das
parcelas vencidas há mais tempo: só é possível a técnica de penhora
Em relação às parcelas vencidas
mais de três meses antes do requerimento, contudo, essa fase procedimental se
desenvolverá, necessariamente, mediante a adoção da técnica de penhora e
expropriação.
Tradicionalmente,
defendia-se que haveria uma incompatibilidade entre as técnicas
A existência de uma suposta
incompatibilidade procedimental era usualmente apontada como óbice à
possibilidade de cobrança de débitos alimentares pretéritos e atuais no mesmo
processo.
Fundamentos que sustentariam essa
incompatibilidade:
a)
haveria ofensa ao art. 780 do CPC/2015, que
exigiria identidade procedimental como condição para a cumulação de execuções;
b)
o art. 531, § 2º, do CPC/2015, apenas diria
respeito ao sincretismo processual, mas não autorizaria a cumulação dos ritos
que seriam substancialmente diferentes;
c)
o art. 528, § 8º, do CPC/2015, indicaria que o
cumprimento de sentença sob a técnica da penhora e expropriação, ao impedir a
prisão civil, também imporia a cisão procedimental; e
d)
haveria risco de tumulto processual e prejuízos
à celeridade.
Não há regra que proíbe nem
que autorize expressamente a cumulação das técnicas em um só processo
O STJ afirmou que, na legislação
processual em vigor, não há regra que proíba, mas também não há regra que
autorize o cumprimento das obrigações alimentares pretéritas e atuais de modo
conjunto e no mesmo processo.
O art. 531, § 2º, do CPC/2015, que trata especificamente do
cumprimento da sentença condenatória ao pagamento de alimentos, estabelece que
o cumprimento definitivo ocorrerá no mesmo processo em que proferida a sentença
e não faz nenhuma distinção a respeito da atualidade ou não do débito, de modo
que essa é a regra mais adequada para suprir a lacuna do legislador no trato da
questão controvertida:
Art. 531. O disposto neste
Capítulo aplica-se aos alimentos definitivos ou provisórios.
(...)
§ 2º O cumprimento definitivo da
obrigação de prestar alimentos será processado nos mesmos autos em que tenha
sido proferida a sentença.
Art. 780 do CPC
O art. 780 do CPC prevê o seguinte:
Art. 780. O exequente pode
cumular várias execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, quando o
executado for o mesmo e desde que para todas elas seja competente o mesmo juízo
e idêntico o procedimento.
Esse dispositivo não é um impedimento
à possibilidade de cobrança, no mesmo processo, de dívidas alimentares que se
submetem a técnicas diferentes.
Em primeiro lugar, porque
essa regra está situada, topologicamente, no Livro II da Parte Especial do CPC/2015,
destinado a disciplinar o processo de execução de título extrajudicial, cujas
disposições se aplicam à fase de cumprimento de sentença apenas no que couber
(art. 771, caput), isto é, desde que não haja regra mais adequada no próprio
Livro I da Parte Especial (que contempla o processo de conhecimento e a fase de
cumprimento de sentença).
Nesse contexto, o art. 531, § 2º,
do CPC/15, que trata especificamente do cumprimento da sentença condenatória ao
pagamento de alimentos, estabelece que o cumprimento definitivo ocorrerá no
mesmo processo em que proferida a sentença e não faz absolutamente nenhuma
distinção a respeito da atualidade ou não do débito, de modo que essa é a regra
mais adequada para suprir a lacuna do legislador no trato da questão
controvertida.
Em segundo lugar, ainda
sob o ponto de vista topológico, o art. 780 do CPC/2015 está situado no
Capítulo II do Livro II da Parte Especial, que trata especificamente das partes
na execução de título executivo extrajudicial, de modo que é correto afirmar
que se destina, precipuamente, à fixação das situações legitimantes que
definirão os polos ativo e passivo da execução de título extrajudicial, mas não
ao procedimento executivo ou, mais precisamente, às técnicas aplicáveis à
execução.
Em terceiro lugar, porque o
art. 780 do CPC/2015 proíbe a cumulação de execuções fundadas em títulos de
diferentes naturezas e espécies, mas desde que para elas existam diferentes
procedimentos. Todavia, essa não é a hipótese em análise, que trata de
obrigação da mesma espécie e natureza (pagar alimentos fixados ou homologados
por sentença), motivo pelo qual somente se pode concluir pela inaplicabilidade
do art. 780 do CPC/2015 para o presente caso.
Em caso de cumulação de
técnicas não há uma nova relação jurídico-processual sendo iniciada
Embora seja lícita, razoável e
justificada a opção do legislador pela necessidade de unidade procedimental na
hipótese de cumulação de execuções de título extrajudicial, uma vez que se
trata de relação jurídico-processual nova, autônoma e que se inaugura por
petição inicial, não há que se falar em inauguração de uma nova relação
jurídico-processual.
O cumprimento de sentença é
apenas uma fase procedimental do processo de conhecimento, de modo que o
controle acerca da compatibilidade procedimental (incluída aí a formulação de
pretensões cumuladas que poderão resultar execuções igualmente cumuladas) é
realizado por ocasião do recebimento da petição inicial, observado o art. 327,
§§ 1º a 3º, do CPC/2015.
Se é admissível que haja, no
mesmo processo e conjuntamente, o cumprimento de sentença que contenha
obrigações de diferentes naturezas e espécies, ainda que existam técnicas
executivas diferenciadas para cada espécie de obrigação e que impliquem em
adaptações procedimentais decorrentes de suas respectivas implementações, com
muito mais razão deve ser admissível o cumprimento de sentença que contenha
obrigação da mesma natureza e espécie no mesmo processo, como na hipótese em
que se pretenda a cobrança de alimentos pretéritos e atuais.
§ 8º do art. 528
Outro argumento sempre invocado para se proibir a cumulação
das técnicas era o § 8º do art. 528:
Art. 528 (...)
§ 8º O exequente pode optar por
promover o cumprimento da sentença ou decisão desde logo, nos termos do
disposto neste Livro, Título II, Capítulo III, caso em que não será admissível
a prisão do executado, e, recaindo a penhora em dinheiro, a concessão de efeito
suspensivo à impugnação não obsta a que o exequente levante mensalmente a
importância da prestação.
O STJ disse, contudo, que esse
dispositivo não é pertinente para a resolução da questão controvertida.
O § 8º do art. 528 somente afirma
que, no cumprimento de sentença processado sob a técnica da penhora e da
expropriação, não será admitido o uso da técnica coercitiva da prisão civil.
Isso não significa dizer, contudo, que, na hipótese de cumprimento de sentença parte
sob a técnica da coerção pessoal e parte sob a técnica da penhora e
expropriação, deverá haver, obrigatoriamente, a cisão do cumprimento de
sentença em dois processos autônomos em virtude das diferentes técnicas
executivas adotadas.
Haveria risco de tumulto
processual e prejuízos à celeridade.
Também
era comum que se afastasse a possibilidade de, em um único cumprimento da
sentença, contemplar as técnicas executivas da prisão civil para alimentos
atuais e da penhora e expropriação para alimentos pretéritos sob o fundamento
de que haveria risco de tumulto processual e de prejuízos à celeridade.
Esse fundamento é alegado de
forma genérica, lacônica e abstrata, na medida em que não se especificam, precisa
e empiricamente, quais seriam os tumultos ou os prejuízos que decorreriam da
adoção, no mesmo processo, das técnicas executivas da prisão civil e da penhora
e expropriação.
Sem prejuízo, poder-se-ia
cogitar, por exemplo, de eventuais dúvidas decorrentes de uma possível ausência
de especificação sobre a que título determinado valor estaria sendo cobrado ou
quitado, isto é, se referente aos alimentos pretéritos ou atuais,
particularmente preocupante diante das consequências distintas para a hipótese
de inadimplemento.
Nesse contexto, para que seja
admitida a cobrança, no mesmo processo, de alimentos pretéritos pela técnica da
penhora e da expropriação e alimentos atuais, três providências parecem ser
adequadas para afastar, por completo, a possibilidade de eventuais tumultos
processuais.
Ao credor que porventura optar
pela execução cumulada de alimentos pretéritos e atuais no mesmo processo,
caberá especificar, detalhadamente, no requerimento do cumprimento de sentença
e em suas demais manifestações, se a parcela cobrada se refere aos alimentos
pretéritos, sobre os quais incidirá a técnica da penhora e expropriação, ou se
se refere aos alimentos atuais, sobre os quais incidirá a técnica da prisão
civil.
Ao julgador, caberá especificar,
no mandado de intimação que será endereçado ao devedor, quais parcelas ou
valores são referentes aos alimentos pretéritos e que, na hipótese de
inadimplemento, ensejarão penhora e expropriação, e quais parcelas ou valores
são referentes aos alimentos atuais e que, na hipótese de inadimplemento,
resultarão na prisão civil do devedor.
Ao devedor, por sua vez, caberá,
sobretudo nas hipóteses em que houver apenas a quitação parcial da dívida,
especificar se o pagamento se refere aos alimentos pretéritos, que elidirão a possibilidade
de penhora e expropriação, ou se se refere aos alimentos atuais, que impedirão
a decretação de sua prisão civil, sob pena de ser lícito ao credor recebê-los
na modalidade que melhor lhe convier.
Em conclusão
Diante da ausência de vedação
legal expressa, não se afigura razoável e adequado impor ao credor,
obrigatoriamente, a cisão da fase de cumprimento da sentença na hipótese em que
pretenda a satisfação de alimentos pretéritos e atuais, exigindo-lhe a instauração
de dois incidentes processuais, ambos com a necessidade de intimação pessoal do
devedor, quando a satisfação do crédito é perfeitamente possível no mesmo
processo.
Caso concreto, com adaptações,
enfrentado pela 3ª Turma do STJ no REsp 2.004.516/RO:
O pai fez acordo se comprometendo
a pagar à filha 20% do salário-mínimo a título de alimentos. Esse acordo foi homologado
por sentença proferida em 04/09/2019.
Diante do inadimplemento do
devedor, foi iniciada a fase de cumprimento de sentença em 02/03/2020.
A filha pediu o pagamento de um
mês (novembro/2019) sob a técnica da penhora e expropriação e os últimos três
meses (dezembro/2019, janeiro/2020 e fevereiro/2020) sob a técnica da coerção
pessoal (prisão civil).
O juiz e o TJ negaram a cumulação
das técnicas, mas a decisão foi revertida pelo STJ.