quinta-feira, 24 de novembro de 2022
Quais são as possíveis consequências em caso de recurso manifestamente protelatório no processo penal?
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João é réu em um processo penal.
Ele interpôs recurso ao STJ,
tendo sido desprovido.
Contra esse acórdão, o réu opôs
embargos de declaração.
O STJ rejeitou os embargos.
Foram opostos novos embargos de
declaração no qual o embargante se limita a repetir os termos do recurso anterior,
os quais já foram analisados e rejeitados.
O Ministério Público, nas contrarrazões, pediu nova rejeição
dos embargos com a imposição de multa por litigância de má-fé, nos termos do
art. 1.026, § 2º do CPC c/c o art. 3º do CPP:
Art. 1.026. Os embargos de
declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a
interposição de recurso.
(...)
§ 2º Quando manifestamente
protelatórios os embargos de declaração, o juiz ou o tribunal, em decisão
fundamentada, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a
dois por cento sobre o valor atualizado da causa.
Neste caso, considerando que
ficou caracterizado nítido intuito protelatório, o STJ tem aplicado multa ao embargante?
NÃO.
Nos limites estabelecidos pela
legislação processual pátria, os embargos de declaração destinam-se a suprir
omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou ambiguidade e corrigir
eventuais erros materiais existentes no julgado combatido.
A insistência do embargante,
diante das sucessivas oposições de embargos de declaração contra acórdão
impugnado, revela não só o exagerado inconformismo, bem como o desrespeito ao
Poder Judiciário e o seu nítido caráter protelatório, constituindo abuso de
direito, em razão da violação dos deveres de lealdade processual e
comportamento ético no processo, bem como do desvirtuamento do próprio
postulado da ampla defesa.
A despeito disso, o STJ não tem
aplicado multa por litigância de má-fé sob o argumento de que isso não é viável
na esfera penal.
Baixa dos autos mesmo sem
publicação do acórdão
Mesmo não sendo cabível a multa,
o STJ, como consequência para esse comportamento da parte, considera que esses
segundos embargos não interromperam o prazo recursal e, por essa razão,
considera que houve trânsito em julgado da condenação, determinado a baixa dos
autos à origem, independentemente da publicação do acórdão recorrido.
Em suma:
Não obstante na esfera penal não ser viável a fixação
de multa por litigância de má-fé, é possível, até mesmo antes do trânsito em
julgado da condenação, a baixa dos autos à origem, independentemente da
publicação do acórdão recorrido.
STJ. Corte
Especial. EDcl nos EDcl no AgRg no RE nos EDcl no AgRg no AREsp 1.442.541/AC, Rel.
Min. Jorge Mussi, julgado em 12/4/2022 (Info 750).
Ainda sobre o tema:
(...) 1. Os presentes recursos consubstanciam mera repetição dos
argumentos anteriormente expendidos em agravos regimentais aos quais a Quinta
Turma, à unanimidade, negaram provimento, tendo os agravantes novamente
recorrido da decisão da Presidência desta Corte, que não conhecera dos agravos
em recurso especial, o que impõe o não conhecimento dos recursos ante a preclusão
consumativa e ausência dialeticidade.
2. Ainda que na esfera penal não seja comum a fixação de multa
por litigância de má-fé, a insistência dos agravantes, por meio de sucessivos
recursos, sem haja vício algum nas decisões e acórdãos recorridos, revela não
só o exagerado inconformismo, mas também o desrespeito ao Poder Judiciário
diante do seu nítido caráter protelatório, constituindo espécie de abuso de
direito.
3. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça
pacificou-se no sentido de que, diante da reiterada oposição de recursos
meramente protelatórios pela parte, deve ser determinada a baixa dos autos à
origem, independentemente da publicação do acórdão recorrido e da certificação
do trânsito em julgado.
4. Agravos internos não conhecidos, com determinação de baixa
dos autos à origem, independentemente da publicação deste acórdão e da eventual
interposição de outros recursos, certificando-se o trânsito em julgado.
(AgRg nos EAREsp n. 1.916.804/SC, relatora Ministra Maria Isabel
Gallotti, Corte Especial, julgado em 9/8/2022, DJe de 15/8/2022)