terça-feira, 22 de novembro de 2022
Não é necessário que a decisão que defere a busca e apreensão faça o detalhamento de todos documentos ou objetos que deverão ser coletados
Imagine a seguinte situação
hipotética:
João estava sendo investigado em
um inquérito policial. A partir de representação da autoridade policial, o juiz
decretou a medida de busca e apreensão em sua residência.
Na decisão que decretou a medida
e no mandado havia expressa autorização para que fossem apreendidos aparelhos
celulares, equipamentos eletrônicos, como tablets, notebooks e pen drives, além
de armas de fogo.
A despeito disso, os policiais
apreenderam também papéis e agendas, que não estavam mencionados expressamente
no mandado.
Após a diligência, a defesa de
João impetrou habeas corpus arguindo a ilicitude da apreensão dos papeis e das
agendas considerando que não são bens que não foram discriminados expressamente
no mandado nem na decisão judicial.
O Tribunal de Justiça denegou a ordem com base na seguinte
argumentação:
“Não houve
ilegalidade no cumprimento do mandado.
O mandado
expedido faz menção a alguns objetos que poderiam ter interesse para a
elucidação dos fatos (aparelhos celulares, equipamentos eletrônicos como
tablets e notebooks, além de busca pessoal e apreensão de arma de fogo), mas
não se trata obviamente de listagem exaustiva, mesmo porque o magistrado que
decretou a busca e apreensão não teria como saber de antemão quais objetos
poderiam ser encontrados no local da diligência probatória que poderiam ter
algum interesse para a apuração dos fatos.
Como se tinha conhecimento
prévio de quais objetos específicos ou documentos poderiam ser encontrados na
residência do investigado, o rol apresentado no mandado de busca e apreensão
era meramente exemplificativo, incumbindo às autoridades que executariam a
diligência a apreensão dos objetos que pudessem trazer algum tipo de
esclarecimento ou informação sobre a imputação investigada. Aliás, a própria
decisão do magistrado, ao autorizar a busca e apreensão, menciona expressamente
que o caso se amoldaria à previsão dos dispositivos do art. 240, §1º, “e”, “f”
e “h”, do Código de Processo Penal, sendo, portanto, necessária a apreensão dos
objetos para a colheita de elementos probatórios que interessariam ao
esclarecimento dos fatos.”
Ainda inconformada, a defesa
recorreu ao STJ.
O pedido da defesa foi
acolhido? Houve nulidade na apreensão dos bens não listados expressamente no
mandado?
NÃO.
A decisão que decretou a medida indicou, em sua
fundamentação, as alíneas “e”, “f” e “h” do § 1º do art. 240 do CPP, o que revela que houve a efetiva
autorização para recolhimento de papéis e agendas. Veja o que dizem esses
dispositivos:
Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.
§ 1º Proceder-se-á à busca
domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para:
(...)
e) descobrir objetos necessários
à prova de infração ou à defesa do réu;
f) apreender cartas, abertas ou
não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o
conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;
(...)
h) colher qualquer elemento de
convicção.
Importante, ainda, destacar que “não
há no ordenamento jurídico pátrio qualquer exigência de que a manifestação
judicial que defere a cautelar de busca e apreensão esmiúce quais documentos ou
objetos devam ser coletados, até mesmo porque tal pormenorização só é possível
de ser implementada após a verificação do que foi encontrado no local em que
cumprida a medida” (STJ. 5ª Turma. AgRg nos EDcl no RHC 145.665/RO, Rel. Min. Jesuíno
Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), julgado em 28/9/2021).
Assim, “a pormenorização dos bens
somente é possível após o cumprimento da diligência, não sendo admissível
exigir um verdadeiro exercício de futurologia por parte do Magistrado” (STJ. 5ª
Turma. RHC 59.661/PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 3/11/2015).
O art. 243 do CPP disciplina os requisitos do mandado de
busca e apreensão:
Art. 243. O mandado de busca deverá:
I - indicar, o mais precisamente
possível, a casa em que será realizada a diligência e o nome do respectivo proprietário
ou morador; ou, no caso de busca pessoal, o nome da pessoa que terá de sofrê-la
ou os sinais que a identifiquem;
II - mencionar o motivo e os fins
da diligência;
III - ser subscrito pelo escrivão
e assinado pela autoridade que o fizer expedir.
Conforme se observa acima, não há
exigência de se fazer um detalhamento do que pode ou não ser arrecadado. Logo,
constata-se que isso não é um requisito do mandado.
Vale ressaltar, ainda, que o art.
240 do CPP apresenta um rol exemplificativo dos casos em que a medida pode ser
determinada, no qual se encontra a hipótese de arrecadação de objetos
necessários à prova da infração ou à defesa do réu, não havendo qualquer
ressalva (STJ. 6ª Turma. RHC 141.737/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
julgado em 27/4/2021).
Em suma:
STJ. 5ª
Turma. AgRg no HC 727.709/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em
16/08/2022 (Info 750).