Imagine a seguinte situação
hipotética:
João estava sendo executado.
Como ele não pagou a dívida, o
juiz determinou a penhora de seus bens.
Os únicos bens que se encontrou
em nome de João foi: um apartamento onde mora com a esposa (e que se constitui
em bem de família) e uma vaga de garagem localizada no condomínio onde ele mora
(Condomínio Jardim Feliz).
Explicando melhor: a garagem,
neste caso, possui uma matrícula própria desvinculada do apartamento de João. Assim,
no registro de imóveis existem duas matrículas de bens imóveis em nome de João:
uma para o apartamento e outra para a vaga de garagem.
Neste caso, é possível a
penhora da vaga de garagem ou ela também estará protegida pela lei do bem de
família?
Será possível a penhora da vaga
de garagem porque, neste caso, ela tem matrícula própria. Nesse sentido:
Súmula 449-STJ: A vaga de garagem que possui matrícula própria
no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora.
Diante disso, a vaga de garagem
foi penhorada e o juiz determinou a sua alienação em hasta pública, sem fazer
qualquer limitação quanto a possíveis adquirentes.
O
Condomínio disse que a convenção não autoriza que terceiros sejam proprietários
das vagas do condomínio.
Logo,
pediu ao juiz que expedisse novo edital dizendo que somente os condôminos poderiam
participar do leilão da vaga da garagem.
O Condomínio
fundamentou seu pedido na parte final do art. 1.331, § 1º do Código Civil:
Art.
1.331 (...)
§
1º As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos,
escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no
solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo
ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que
não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo
autorização expressa na convenção de condomínio.
O
juiz não acolheu o pedido argumentando que essa vedação contida na parte final
do art. 1.331, § 1º do CC não se aplicaria em caso de alienação judicial. A
proibição somente valeria para alienações voluntárias (negócios jurídicos).
O
STJ concordou com a argumentação do magistrado?
NÃO.
De
acordo com o art. 2º da Lei nº 4.591/64 (Lei dos Condomínios em Edificações),
as vagas de garagem devem ser tratadas “como objeto de propriedade exclusiva”,
vinculadas “à unidade habitacional a que corresponder”, podendo ser
transferidas “a outro condômino”, sendo, contudo, “vedada sua transferência a
pessoas estranhas ao condomínio”.
Além
disso, o § 1º do art. 1.331, do Código Civil, afirma expressamente que “os
abrigos para veículos” (vagas de garagem) “não poderão ser alienados ou
alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na
convenção de condomínio”.
O
objetivo da lei foi o de dar maior segurança aos condomínios. Diante disso,
entende-se que a vedação de alienação dos abrigos para veículos a pessoas
estranhas ao condomínio, estipulada no art. 1.331, § 1º, do Código Civil, deve
prevalecer também nas alienações judiciais. Logo, em tais casos, a hasta
pública deverá ocorrer no universo limitado dos demais condôminos.
Em suma:
STJ. 2ª
Turma. REsp 2.008.627-RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 13/09/2022 (Info
749).