Presídios federais
A quase totalidade dos presídios
existentes no Brasil é estadual. Com isso, mesmo as pessoas presas por conta de
processos que tramitam na Justiça Federal, em regra, ficam custodiadas em
presídios estaduais.
Na
atualidade, existem cinco presídios federais:
•
Penitenciária Federal de Catanduvas (PR);
•
Penitenciária Federal de Campo Grande (MS);
•
Penitenciária Federal de Porto Velho (RO);
•
Penitenciária Federal de Mossoró (RN);
•
Penitenciária Federal de Brasília (DF).
Cada penitenciária dessas possui um juiz federal corregedor,
responsável pela unidade e com competências previstas em lei. Confira o que diz
o art. 2º da Lei nº 11.671/2008:
Art. 2º A atividade jurisdicional de
execução penal nos estabelecimentos penais federais será desenvolvida pelo
juízo federal da seção ou subseção judiciária em que estiver localizado o
estabelecimento penal federal de segurança máxima ao qual for recolhido o
preso.
Parágrafo único. O juízo federal de
execução penal será competente para as ações de natureza penal que tenham por objeto
fatos ou incidentes relacionados à execução da pena ou infrações penais
ocorridas no estabelecimento penal federal.
Base legal
A transferência e inclusão de
presos em estabelecimentos penais federais são reguladas pela Lei nº 11.671/2008.
Além disso, podem ser citados
outros instrumentos infralegais importantes:
• Decreto nº 6.877/2009;
• Decreto nº 6.049/2007;
• Resolução nº 557-CJF.
Segurança máxima
Os
estabelecimentos penais federais são considerados, pela lei, como de segurança
máxima.
Quem pode ser recolhido em
presídio federal?
Poderão ser incluídos em presídio
federal:
• presos provisórios ou
condenados;
• presos estaduais ou federais.
Preso por “crime federal” ou
“crime estadual”
O presídio federal pode receber
tanto presos acusados e condenados por crimes de competência da Justiça Federal
como da Justiça Estadual.
Desse modo, o critério para
abrigar presos em estabelecimentos prisionais federais não é a competência para
julgamento dos fatos por eles praticados, mas sim a necessidade de uma custódia
de segurança máxima por razões ligadas à segurança pública ou do próprio preso.
Motivos que autorizam o
recolhimento do preso em presídio federal
A lei é muito vaga quanto a isso
(art. 3º), afirmando que serão recolhidos em presídios federais aqueles cuja
medida se justifique por conta do interesse:
• da segurança pública; ou
• do próprio preso.
Art. 3º Serão incluídos em
estabelecimentos penais federais de segurança máxima aqueles para quem a medida
se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio preso, condenado
ou provisório. (Redação dada Lei nº 13.964/2019)
Segundo o art. 3º do Decreto nº
6.877/2009, para a inclusão ou transferência, o preso deverá possuir, ao menos,
uma das seguintes características:
• ter desempenhado função de
liderança ou participado de forma relevante em organização criminosa;
• ter praticado crime que coloque
em risco a sua integridade física no ambiente prisional de origem;
• estar submetido ao Regime
Disciplinar Diferenciado — RDD;
• ser membro de quadrilha ou
bando, envolvido na prática reiterada de crimes com violência ou grave ameaça;
• ser réu colaborador ou delator
premiado, desde que essa condição represente risco à sua integridade física no
ambiente prisional de origem; ou
• estar envolvido em incidentes
de fuga, de violência ou de grave indisciplina no sistema prisional de origem.
Prazo de permanência no
presídio federal
3 anos. Confira o que diz a Lei:
Art. 10. (...)
§ 1º O período de permanência
será de até 3 (três) anos, renovável por iguais períodos, quando solicitado
motivadamente pelo juízo de origem, observados os requisitos da transferência,
e se persistirem os motivos que a determinaram.
Quem tem legitimidade para pedir
a inclusão do preso no Sistema Penitenciário Federal?
• Autoridade administrativa
(exs.: delegado de polícia, secretário de segurança pública, secretário de
justiça etc.);
• Ministério Público;
• o próprio preso.
A quem é endereçado o pedido de
transferência para o presídio federal?
O requerimento de transferência
deve ser endereçado ao juízo responsável pelo preso (juízo federal ou juízo
estadual, a depender do caso), e nunca diretamente ao juiz federal corregedor
da penitenciária federal.
A competência para decidir se
haverá a transferência, conforme veremos mais abaixo, é uma decisão tanto do
juízo de origem como do juízo federal corregedor do presídio.
Oitiva prévia
Após o requerimento ser recebido,
é formado um processo de transferência.
O juiz deverá determinar, de
imediato, que sejam ouvidas, no prazo de 5 (cinco) dias cada:
• a autoridade administrativa;
• o MP;
• a defesa; e
• o Departamento Penitenciário
Nacional — DEPEN (a quem é facultado indicar o estabelecimento penal federal
mais adequado).
Na hipótese de
imprescindibilidade de diligências complementares, o juiz federal ouvirá, no
prazo de 5 (cinco) dias, o Ministério Público Federal e a defesa e, em seguida,
decidirá acerca da transferência no mesmo prazo.
É possível a transferência ou
manutenção do preso em presídio federal mesmo sem a oitiva da defesa?
SIM. A Lei nº 11.671/2008 prevê
que, havendo extrema necessidade, o juiz poderá autorizar a imediata
transferência do preso e, após o preso estar incluído no sistema penitenciário
federal, ouvir as partes interessadas e decidir pela manutenção ou revogação da
medida adotada.
Desse modo, em caso de situações
emergenciais, o contraditório será diferido.
Nesse sentido já decidiu o STF:
A transferência de preso para presídio federal de segurança
máxima sem a sua prévia oitiva, desde que fundamentada em fatos
caracterizadores de situação emergencial, não configura ofensa aos princípios
do devido processo legal, da ampla defesa, da individualização da pena e da
dignidade da pessoa humana.
STF. 1ª Turma. HC 115539/RO, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em
3/9/2013 (Info 718).
É também a posição do STJ:
Súmula 639-STJ: Não fere o contraditório e o devido processo
decisão que, sem ouvida prévia da defesa, determine transferência ou
permanência de custodiado em estabelecimento penitenciário federal.
De quem é a competência para
decidir se um preso deve ou não ser incluído no Sistema Penitenciário Federal?
Inicialmente, o juízo de origem
(federal ou estadual), isto é, o juízo responsável pelo preso, faz um juízo de admissibilidade
sobre o requerimento de transferência.
• Se nesse juízo de
admissibilidade, o pedido for indeferido: encerra-se o processo de
transferência. Há possibilidade de recurso.
• Se houver concordância com o
pedido: o próprio juízo de origem formulará requerimento ao juízo federal
competente pelo presídio federal, encaminhando os autos do processo de
transferência.
O juiz federal corregedor do
presídio federal irá, então, decidir, de forma fundamentada, se aceita ou não o
preso.
Desse modo, a inclusão dependerá
de duas decisões:
• do juízo de origem (estadual ou
federal, a depender do caso);
• do juízo federal corregedor do
presídio.
O que o juízo federal
corregedor do presídio analisa para decidir se haverá ou não a inclusão do
preso?
Apenas a regularidade formal da
solicitação.
Segundo entende o STJ:
Ao Juízo Federal não compete realizar juízo de valor sobre as
razões de fato emanadas pelo Juízo solicitante, sendo-lhe atribuído pelo art.
4.º da Lei n.º 11.671/2008, tão somente, o exame da regularidade formal da
solicitação.
STJ. 3ª Seção. CC 168.595/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em
11/03/2020.
Prevalece, no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento no
sentido de que, acaso devidamente motivado pelo Juízo estadual o pedido de
manutenção do preso em presídio federal, não cabe ao Magistrado Federal exercer
juízo de valor sobre a fundamentação apresentada, mas apenas aferir a
legalidade da medida.
STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 169.736/RJ, Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca, julgado em 12/02/2020.
Não cabe ao Juízo Federal discutir as razões do Juízo Estadual,
quando solicita a transferência de preso para estabelecimento prisional de
segurança máxima, assim quando pede a renovação do prazo de permanência,
porquanto este é o único habilitado a declarar a excepcionalidade da medida.
STJ. 3ª Seção. AgRg no CC 160.401/PR, Rel. Min. Antonio Saldanha
Palheiro, julgado em 10/04/2019.
O que acontece se o juízo federal
corregedor do presídio não admitir a transferência do preso?
Rejeitada a transferência, o
juízo de origem poderá suscitar o conflito de competência perante o tribunal
competente, que o apreciará em caráter prioritário.
Enquanto não decidido o conflito
de competência e sendo caso de renovação, o preso permanecerá no estabelecimento
penal federal.
No julgamento dos conflitos de
competência, a lei afirma que o tribunal competente (no caso, o STJ) deverá
negar a transferência em caso de o presídio federal já estar com lotação
máxima.
Quem julga esse conflito
de competência?
Se o juízo de origem for |
Quem julgará o conflito? |
Juiz estadual |
STJ |
Juiz federal vinculado a um TRF
diferente do juiz federal corregedor do presídio. Ex.: quem
solicitou foi o juiz federal do Rio de Janeiro (TRF2) e quem rejeitou foi o
juiz federal de Porto Velho (TRF1). |
STJ |
Juiz federal vinculado ao mesmo TRF do
juiz federal Corregedor do presídio. Ex.: quem
solicitou foi o juiz federal de Manaus (TRF1) e quem rejeitou foi o juiz
federal de Porto Velho (TRF1). |
TRF respectivo (no exemplo dado será o TRF1) |
Feita essa revisão, veja agora o
caso concreto enfrentado pelo STJ (com adaptações):
Heider cumpria pena em um presídio no
Estado do Pará.
A Superintendência do Sistema
Penitenciário do Estado requereu a transferência do apenado para um presídio
federal alegando que ele seria um dos líderes de uma organização criminosa.
O Juízo de Direito da Vara de Execuções
Penais de Belém, ao fazer o juízo de admissibilidade, concordou com as razões
expostas e formulou requerimento para inclusão do apenando no Sistema
Penitenciário Federal.
O Juízo da 5ª Vara de Execuções Penais
Federais de Campo Grande (MS) concordou com o pedido e aceitou o preso no
presídio federal pelo prazo inicial de 360 dias.
Assim, Heider ingressou no Sistema
Penitenciário Federal em 23/6/2019, na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS),
local onde se encontra custodiado.
Expirado o período de permanência, o
Juízo federal determinou o retorno do apenado ao sistema penitenciário
estadual, ante a inexistência de decisão do magistrado estadual autorizando a
prorrogação da permanência do apenado.
Cientificado da decisão, o Juízo
estadual suscitou o conflito, consignando que remanescem íntegros os
fundamentos que subsidiaram o ingresso do apenado em caráter emergencial.
Assim, o magistrado estadual pediu a manutenção de Heider no presídio federal
sob o argumento de que se trata de membro com posição de alta relevância na organização
criminosa, condição que o caracteriza como interno de alta periculosidade e, ao
mesmo tempo, coloca o sistema penitenciário paraense em situação de risco caso
seu retorno seja confirmado.
O que decidiu o STJ?
O STJ determinou a manutenção do
apenado no Sistema Penitenciário Federal.
Se devidamente motivado pelo
Juízo local o pedido de manutenção do apenado, em presídio federal, não cabe ao
Juízo Corregedor Federal exercer juízo de valor sobre a fundamentação
apresentada, mas, apenas, aferir a legalidade da medida (STJ. 3ª Seção. CC
154.679/RJ, Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 24/10/2017).
No caso concreto, o requerimento
de prorrogação estava fundado em elementos concretos, notadamente a liderança
exercida pelo custodiado em organização criminosa e o risco que seu retorno
representaria ao sistema penitenciário estadual, ante a existência de indícios
de que atuou ativamente na articulação de ataques intra e extramuros.
Assim, tendo o Juízo estadual
reiterado as razões e fundamentos que deram causa à transferência do preso para
presídio federal de segurança máxima - razões essas que se encontram de acordo
com o teor da Lei nº 11.671/2008, em especial o seu art. 3º -, e não tendo
apresentado o Juízo federal óbice legal ou objetivo para o não acatamento do
pedido, deve ser declarada a competência do Juízo federal, bem como prorrogada
a permanência do preso no Sistema Penitenciário Federal.
Em suma:
STJ. 3ª Seção.
CC 190.601-PA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/09/2022 (Info
751).