Dizer o Direito

terça-feira, 25 de outubro de 2022

Quando a Fazenda Pública vence a demanda, os honorários advocatícios de sucumbência, integram o patrimônio da entidade estatal ou constituem direito autônomo do procurador judicial?

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

A empresa Alfa Ltda. ajuizou ação contra o Município de São Paulo.

O pedido foi julgado improcedente e a empresa autora foi condenada a pagar R$ 100 mil de honorários advocatícios de sucumbência. Houve o trânsito em julgado.

Como a empresa não pagou voluntariamente a verba relativa aos honorários, o Município de São Paulo iniciou cumprimento de sentença requerendo a intimação da Alfa Ltda para o pagamento da quantia.

A empresa ofereceu impugnação ao cumprimento de sentença alegando que tem um crédito líquido, certo e exigível com o Município no valor de R$ 120 mil e que, portanto, requer a compensação das dívidas, nos termos dos arts. 368 e 369 do Código Civil:

Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.

Art. 369. A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.

 

Decisão do magistrado: não cabe a compensação

O juiz rejeitou a impugnação alegando não seria possível a compensação porque os créditos não seriam recíprocos:

• a empresa possui realmente um crédito para receber do Município;

• ocorre que o valor que está sendo executado neste cumprimento de sentença não pertence ao Município, e sim aos Procuradores do Município. Logo, a empresa não pode querer utilizar uma verba que pertence aos Procuradores para abater uma dívida que é do Município.

 

Decisão do TJ/SP: cabe a compensação

A empresa recorreu contra a decisão do magistrado.

O TJ/SP deu provimento ao recurso e deferiu a compensação de créditos.

O TJ argumentou o seguinte:

• no caso de um advogado e um cliente privado, realmente, os honorários de sucumbência continuem direito autônomo do causídico;

• no entanto, quando envolve o Poder Público é diferente;

• quando a Fazenda Pública é vencedora na demanda, os honorários advocatícios de sucumbência integram o patrimônio público, não sendo possível dizer que constituam direito autônomo do procurador;

• o art. 1º da Lei Municipal nº 9.402/81 determina que os honorários advocatícios devidos à Fazenda Municipal serão destinados a Secretaria de Negócios Jurídicos para distribuição aos integrantes da Carreira de Procurador, em atividade ou nela aposentados, e aperfeiçoamento intelectual dos integrantes da Carreira de Procurador. Isso significa que a receita é do Município que, depois, repassa aos Procuradores.

 

Recurso especial do Município

O Município interpôs recurso especial contra a decisão do TJ/SP alegando que, depois do CPC/2015, ficou expressamente consignado que os honorários de sucumbência pertencem aos advogados públicos:

Art. 85 (...) § 19. Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei.

 

O STJ concordou com os argumentos do Juiz ou do TJ/SP?

Com o TJ/SP.

A jurisprudência consolidada do STJ é no sentido de que os honorários advocatícios de sucumbência, quando vencedora a Fazenda Pública, integram o patrimônio da entidade estatal, não constituindo direito autônomo do procurador judicial, o que viabiliza sua compensação. Esse entendimento persiste mesmo após a edição do CPC/2015. Nesse sentido:

A jurisprudência do STJ é assente em admitir a possibilidade de compensação de parte do precatório com a verba honorária devida ao ente público em impugnação de cumprimento de sentença julgada procedente, pois os honorários de sucumbência não constituem direito autônomo do procurador judicial, visto que integram o patrimônio público da entidade, sendo possível a compensação com o crédito previsto no título.

STJ. 2ª Turma. AgInt nos EDcl no REsp 1907197/SC, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 17/05/2021.

 

A jurisprudência desta Corte adota a compreensão de que os honorários advocatícios de sucumbência, quando vencedora a Administração Pública direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ou as Autarquias, as Fundações instituídas pelo Poder Público, as Empresas Públicas, ou as Sociedades de Economia Mista, não constituem direito autônomo do Procurador judicial, porque integram o patrimônio público da entidade.

STJ. 1ª Turma. AgInt no AREsp 1.038.431/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 29/04/2019.

 

Em suma:

Os honorários advocatícios de sucumbência, quando vencedora a Fazenda Pública, integram o patrimônio da entidade estatal, não constituindo direito autônomo do procurador judicial.

STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 1.834.717-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/05/2022 (Info 743).



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