Microssistemas dos Juizados Especiais
Quando
falamos em “sistema dos Juizados Especiais”, podemos identificar a existência
de três microssistemas, cada um deles destinado a julgar determinados tipos de
causas, possuindo regras específicas de procedimento. Veja:
1) Juizados Especiais
Cíveis e Criminais estaduais Compete ao Juizado Especial Criminal
processar e julgar infrações penais de menor potencial ofensivo que sejam de
competência da Justiça Estadual. Compete ao Juizado Especial Cível processar
e julgar causas cíveis de menor complexidade que sejam de competência da
Justiça Estadual. Ficam
excluídas deste microssistema as causas cíveis de interesse da Fazenda
Pública. |
Lei nº
9.099/95 |
2) Juizados Especiais
Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Compete ao Juizado Especial Federal
Criminal processar e julgar as infrações de menor potencial ofensivo que
sejam de competência da Justiça Federal. Compete ao Juizado Especial Federal
Cível processar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor
de 60 salários mínimos, bem como executar as suas sentenças. Neste
microssistema, é permitida a participação da União, autarquias, fundações e
empresas públicas federais, desde que na condição de rés. |
Lei nº
10.259/2001 |
3)
Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do
Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios. Compete ao Juizado Especial da
Fazenda Pública processar e julgar as causas cíveis de interesse dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60
salários mínimos. Neste microssistema, são julgadas as
causas de até 60 salários mínimos, de competência da Justiça Estadual, e que
tenham como réus os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e os
Municípios, bem como autarquias, fundações e empresas públicas a eles
vinculadas. |
Lei nº
12.153/2009 |
Imagine agora a seguinte situação
hipotética:
João ingressou com ação de
repetição de indébito, no Juizado Especial da Fazenda Pública, contra uma
autarquia estadual pedindo a devolução de tarifas de água e esgoto cobradas
indevidamente.
O pedido foi julgado improcedente,
sob o argumento de que a pretensão estaria prescrita já que o prazo seria de 5
anos.
O autor interpôs recurso inominado
endereçado à Turma Recursal sustentando que o prazo seria de 10 anos, de acordo
com o disposto no art. 205 do Código Civil e na Súmula 412 do STJ:
Súmula 412-STJ: A ação de repetição de indébito de tarifas de
água e esgoto sujeita-se ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil.
Código Civil
Art. 205. A prescrição ocorre em
dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.
A turma Recursal da Fazenda
Pública negou provimento ao recurso, mantendo a sentença.
Diante disso, João apresentou incidente de uniformização de
interpretação de lei, com base no art. 18, § 3º da Lei nº 12.153/2009,
argumentando que a decisão da Turma Recursal contrariou súmula do STJ:
Art. 18. Caberá pedido de
uniformização de interpretação de lei quando houver divergência entre decisões
proferidas por Turmas Recursais sobre questões de direito material.
(...)
§ 3º Quando as Turmas de
diferentes Estados derem a lei federal interpretações divergentes, ou quando a decisão proferida estiver em
contrariedade com súmula do Superior Tribunal de Justiça, o pedido será por
este (obs: STJ) julgado.
Como o processo tramitava na
Turma Recursal, o pedido de uniformização foi apresentado para o Presidente da
Turma, com requerimento de que ele remetesse esse pedido (e os autos) para o
STJ a fim de que, ali, fosse julgado.
Ocorre que a Turma Recursal decidiu
não remeter ao STJ o pedido de uniformização porque a situação não se
enquadraria na previsão legal.
Considerando esse cenário, João
ingressou com uma reclamação diretamente no STJ alegando que a Turma Recursal
usurpou competência do Tribunal. Isso porque a competência para julgar o
incidente de uniformização é do STJ (art. 18, § 3º, da Lei nº 12.153/2009) e
não cabia à Turma Recursal realizar juízo de admissibilidade.
O STJ concordou com os
argumentos de João?
SIM.
A Lei nº 12.153/2009, que trata
dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, disciplina um sistema próprio de
uniformização jurisprudencial, mediante o denominado Pedido de Uniformização de
Interpretação de Lei, o qual poderá ser processado e julgado tanto pelo Poder
Judiciário local quanto pelo STJ, a depender da divergência apontada. Veja:
1) Se a situação envolver uma divergência entre acórdãos de
Turmas Recursais de um mesmo Estado: o pedido de uniformização será julgado
pelo Poder Judiciário local, que irá reunir as Turmas Recursais, sob a
presidência de um Desembargador indicado pelo Tribunal de Justiça. É o que
prevê o art. 18, § 1º da Lei nº 12.153/2009:
Art. 18. Caberá pedido de
uniformização de interpretação de lei quando houver divergência entre decisões
proferidas por Turmas Recursais sobre questões de direito material.
§ 1º O pedido fundado em
divergência entre Turmas do mesmo Estado será julgado em reunião conjunta das
Turmas em conflito, sob a presidência de desembargador indicado pelo Tribunal
de Justiça.
(...)
2) Por outro lado, o pedido de
uniformização será julgado pelo STJ se a situação envolver:
2.1) divergência entre Turmas
Recursais de Estados diferentes; ou
2.2) quando o acórdão recorrido
estiver em desacordo com súmula do STJ.
É o que estabelece o § 3º do art. 18 da Lei nº 12.153/2009:
Art. 18. Caberá pedido de
uniformização de interpretação de lei quando houver divergência entre decisões
proferidas por Turmas Recursais sobre questões de direito material.
(...)
§ 3º Quando as Turmas de
diferentes Estados derem a lei federal interpretações divergentes, ou quando a
decisão proferida estiver em contrariedade com súmula do Superior Tribunal de
Justiça, o pedido será por este julgado.
No caso do pedido de
uniformização baseado no § 3º do art. 18, não existe a previsão de juízo prévio
de admissibilidade pela Turma Recursal. O que a Turma irá fazer será apenas receber
o pedido, intimar a parte contrária para responder e, depois disso, remeter os
autos ao STJ.
Logo, não agiu corretamente a Turma
Recursal ao fazer um juízo negativo de admissibilidade, impedindo que o pedido
de uniformização fosse remetido ao Tribunal competente para julgá-lo (STJ).
Em suma:
STJ.
1ª Seção. Rcl 42.409-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 22/06/2022 (Info
743).