Dizer o Direito

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Independentemente do desfecho da ação anulatória de registro civil, não há que se falar em impossibilidade jurídica de pedido investigatório de paternidade

 

Imagine a seguinte situação hipotética:

Regina e João tiveram um relacionamento amoroso. A mulher ficou grávida e deu à luz à Andrea, em 1984.

João não aceitou registrar Andrea como sua filha e se mudou para outra cidade.

Muitos anos depois, Paulo registrou Andrea como sua filha, mesmo sem a existência do vínculo biológico entre eles.

Em 1999, Andrea descobriu o paradeiro de João e ajuizou, contra ele, ação de investigação de paternidade.

O réu contestou a ação alegando, dentre outros argumentos, que o pedido seria juridicamente impossível porque Andrea já seria registrada como filha de Paulo.

Andrea respondeu que já ingressou com ação pedindo a anulação do registro civil considerando a ausência de vínculo com Paulo.

João contra argumentou afirmando que seria necessário aguardar o trânsito em julgado da ação anulatória para que se pudesse decidir a ação de investigação de paternidade.

 

Esse argumento de João é acolhido pelo STJ?

NÃO.

 

A ação de investigação de paternidade ajuizada pelo(a) pretenso(a) filho(a) contra o suposto pai é uma manifestação concreta dos direitos à filiação, à identidade genética e à busca da ancestralidade, que fazem parte dos chamados “direitos da personalidade”.

Os direitos da personalidade são inalienáveis, vitalícios, intransmissíveis, extrapatrimoniais, irrenunciáveis, imprescritíveis e oponíveis erga omnes.

Assim, é absolutamente lícito a autora perseguir seu indisponível e personalíssimo direito à busca da sua ancestralidade, consubstanciado no reconhecimento do seu estado de filiação, que pode ser realizado sem restrições independentemente da pré-existência ou superveniência de eventual vínculo registral, podendo perfeitamente coexistirem as respectivas demandas, que são plenamente compatíveis.

O STJ entende que a existência de vínculo com o pai registral não é obstáculo ao exercício do direito de busca da origem genética, ou seja, de reconhecimento da paternidade.


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