Execução fiscal
Execução fiscal é a ação judicial
proposta pela Fazenda Pública (União, Estados, DF, Municípios e suas
respectivas autarquias e fundações) para cobrar do devedor créditos
(tributários ou não tributários) inscritos em dívida ativa.
A execução fiscal é regida pela
Lei nº 6.830/80 (LEF) e, subsidiariamente, pelo CPC.
Redirecionamento
Quando a
Fazenda Pública ajuíza uma execução fiscal contra a empresa e não consegue
localizar bens penhoráveis, o CTN prevê a possibilidade de o Fisco REDIRECIONAR
a execução incluindo no polo passivo como executadas algumas pessoas físicas
que tenham relação com a empresa, desde que fique demonstrado que elas
praticaram atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos. É o que prevê o art. 135 do CTN:
Art. 135. São pessoalmente
responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatutos:
I - as pessoas referidas no artigo
anterior;
II - os mandatários, prepostos e
empregados;
III - os diretores, gerentes ou
representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Assim, os sócios, como regra
geral, não respondem pessoalmente (com seu patrimônio pessoal) pelas dívidas da
sociedade empresária. Isso porque vigora o princípio da autonomia jurídica da
pessoa jurídica em relação aos seus sócios. A pessoa jurídica possui
personalidade e patrimônio autônomos, que não se confundem com a personalidade
e patrimônio de seus sócios. No entanto, a autonomia patrimonial não é um direito
absoluto. Desse modo, se o sócio praticou atos com excesso de poderes ou
infração de lei, contrato social ou estatutos (art. 135, III), ele utilizou o
instituto da personalidade jurídica de forma fraudulenta ou abusiva, podendo,
portanto, ser responsabilizado pessoalmente pelos débitos.
Vale ressaltar, no entanto, que o
simples fato de a pessoa jurídica estar em débito com o Fisco não autoriza que
o sócio pague pela dívida com seu patrimônio pessoal. É necessário – repito –
que ele tenha praticado atos com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatutos (art. 135, III).
É a tese fixada no Tema 97:
A simples falta de pagamento do tributo não configura, por si
só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do
sócio, prevista no art. 135 do CTN. É indispensável, para tanto, que tenha
agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao
estatuto da empresa.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.101.728/SP, Rel. Ministro Teori Zavascki,
DJe de 23/03/2009 – Tema 97.
A fim de que não houvesse dúvidas
quanto a isso, o STJ, em 24/03/2010, aprovou o seguinte enunciado:
Súmula 430-STJ: O inadimplemento da obrigação tributária pela
sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.
A dissolução irregular da
empresa caracteriza infração à lei
Uma das situações mais comuns em
que ocorre o redirecionamento da execução fiscal é quando a empresa é
dissolvida irregularmente. Se isso acontece, a jurisprudência entende que houve
infração à lei (art. 135 do CTN), já que o procedimento para a extinção de
sociedades empresárias é disciplinado em lei, devendo ser cumprida uma série de
formalidades, de sorte que se essa dissolução ocorre de forma irregular, a
legislação está sendo desrespeitada.
Assim, a dissolução irregular
constitui, por si só, ato de infração à lei e autoriza o redirecionamento (para
a cobrança da dívida ativa tributária e da não tributária).
Se a empresa deixa de
funcionar no seu domicílio fiscal e não comunica aos órgãos competentes,
presume-se que foi dissolvida irregularmente
Domicílio tributário (ou fiscal)
é o lugar, cadastrado na repartição tributária, onde o sujeito passivo poderá
ser encontrado pelo Fisco. Dessa feita, se a Administração Tributária tiver que
enviar uma notificação fiscal para aquele contribuinte, deverá encaminhar para
o endereço constante como seu domicílio fiscal.
As regras para a definição do
domicílio tributário estão previstas no art. 127 do CTN.
Se a empresa deixa de funcionar
no seu domicílio fiscal, presume-se que ela deixou de existir (foi dissolvida).
E o pior: foi dissolvida de forma irregular, o que caracteriza infração à lei e
permite o redirecionamento da execução.
Assim, por exemplo, em uma
execução fiscal, caso não se consiga fazer a citação da empresa porque ela não
mais está funcionando no endereço indicado como seu domicílio fiscal, será possível
concluir que ela foi dissolvida irregularmente, ensejando o redirecionamento da
execução, conforme entendimento sumulado do STJ:
Súmula 435-STJ: Presume-se dissolvida irregularmente a empresa
que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos
competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o
sócio-gerente.
Segundo explica o Min. Mauro
Campbell Marques ao comentar a origem da súmula, “o sócio-gerente tem o dever
de manter atualizados os registros empresariais e comerciais, em especial
quanto à localização da empresa e a sua dissolução. Ocorre aí uma presunção da
ocorrência de ilícito. Este ilícito é justamente a não obediência ao rito
próprio para a dissolução empresarial (...)” (REsp 1.371.128-RS).
No mesmo
sentido, veja a lição do Juiz Federal Mateus Pontalti:
“Como se
observa do enunciado, se a pessoa jurídica não for encontrada no endereço que
informou ao fisco como sendo o do local em que exerce suas atividades, há uma
presunção de que ocorreu a sua dissolução irregular. Isso ocorre com frequência
em execuções fiscais movidas pelas fazendas públicas. O Oficial de Justiça
dirige-se até a sede do estabelecimento e não encontra a pessoa jurídica. Nesse
caso, o fisco pode pedir o redirecionamento da execução fiscal contra os
sócios-gerentes ou administradores, utilizando-se como fundamento o artigo 135,
inciso III, do CTN, e a Súmula 435 do STJ.” (PONTALTI, Mateus. Manual de
Direito Tributário. 2ª ed., Salvador: Juspodivm, 2021, p. 361-362).
Imagine
agora a seguinte situação hipotética:
A empresa
Móveis Henrique Ltda. foi dissolvida, em 2020, sem cumprir as formalidades
exigidas pela legislação. Houve, portanto, dissolução irregular.
Em 2021, o
Fisco ajuizou execução fiscal contra a empresa.
Como ela havia encerrado suas
atividades, não foi localizada no endereço informado à Junta Comercial,
presumindo-se então a dissolução irregular
(Súmula 435-STJ).
Diante disso, a
exequente pediu para que a execução fiscal fosse redirecionada para cobrar a
dívida de João, que, no momento em que ocorreu a dissolução irregular da sociedade
(em 2020), era o sócio administrador da empresa.
Defesa de
João
João apresentou
embargos à execução alegando que ele entrou no quadro societário em 2018 e que
esse débito que está sendo cobrado refere-se a um fato gerador ocorrido em 2016.
Logo, o redirecionamento não pode recair contra ele, já que, no momento do fato
gerador, ele não era sócio.
O
argumento invocado por João deve ser aceito? O que importa é a data do fato
gerador ou a data da dissolução irregular?
O argumento não
deve ser aceito. Se o redirecionamento é fundado na dissolução irregular, o que
importa é saber quem tinha poderes de administração na data da dissolução
irregular.
Assim, o sócio-gerente da época da dissolução
irregular responde pelos débitos da empresa, mesmo que ele não fosse o gerente
da pessoa jurídica executada no momento do fato gerador do tributo inadimplido
Três correntes
Ocorreu a dissolução irregular da
empresa. Qual sócio deverá responder pelos tributos?
Havia três correntes sobre o
tema:
1ª corrente: deveria responder o
indivíduo que fosse sócio-gerente na época da dissolução irregular da pessoa
jurídica executada e que também fosse o sócio-gerente na época do fato gerador
do tributo inadimplido (teria que ser o sócio-gerente nos dois momentos);
2ª corrente: deveria responder o indivíduo
que fosse o sócio-gerente na época da dissolução irregular, embora não gerisse
a pessoa jurídica executada na época do fato gerador do tributo inadimplido
(critério do momento da dissolução irregular);
3ª
corrente: deveria responder o indivíduo que fosse sócio-gerente na época do
fato gerador, embora não gerisse mais a pessoa jurídica no momento da
dissolução irregular (critério do momento do fato gerador).
O STJ adotou a 2ª corrente
(critério do momento da dissolução irregular).
Para que haja a responsabilização
pessoal do sócio-gerente exige-se que ele tivesse poderes de administração no
momento da dissolução irregular ou da prática de ato que faça presumir a
dissolução irregular.
O fundamento para isso está na conjugação
do art. 135, III, do CTN com a Súmula 435 do STJ. De fato, na medida em que a
hipótese que desencadeia a responsabilidade tributária é a infração à lei,
evidenciada pela dissolução irregular da pessoa jurídica executada, revela-se
indiferente o fato de o sócio-gerente responsável pela dissolução irregular não
estar na administração da pessoa jurídica à época do fato gerador do tributo
inadimplido.
O que foi explicado acima
vale também para administradores não sócios
Vale esclarecer que o explicado acima
aplica-se, mutatis mutandis, aos terceiros não sócios, com poderes de
gerência, na medida em que o art. 135, III, do CTN atribui responsabilidade
tributária aos administradores das pessoas jurídicas de direito privado, por
atos praticados com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou
aos estatutos.
Em suma:
STJ. 1ª Seção. REsp 1.645.333-SP,
Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 25/05/2022 (Recurso Repetitivo – Tema
981).
DOD Plus – tema correlato
O sócio só pode ser
atingido pelo redirecionamento fundado na dissolução irregular se ele era
administrador no momento dessa dissolução; se havia saído antes, em regra, não
poderá ser responsabilizado
O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na
dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua
ocorrência, não pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio que,
embora exercessem poderes de gerência ao tempo do fato gerador, sem incorrer em
prática de atos com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou
aos estatutos, dela regularmente se retirou e não deu causa à sua posterior
dissolução irregular, conforme art. 135, III do CTN.
STJ. 1ª Seção. REsp 1.377.019-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães,
julgado em 24/11/2021 (Recurso Repetitivo - Tema 962) (Info 719).