Imagine a seguinte situação
hipotética:
João ajuizou ação contra Pedro,
tendo o pedido sido julgado improcedente.
O autor interpôs apelação, mas o
Tribunal de Justiça manteve a sentença.
Ainda inconformado, João interpôs
recurso especial contra o acórdão do TJ.
O prazo para interpor recurso
especial é de 15 dias úteis.
João interpôs o recurso especial
no último dia do prazo.
Na conferência para verificar se João
interpôs o recurso tempestivamente, pode-se cair em uma armadilha e achar que
ele perdeu o prazo. Isso porque no período entre a intimação do acórdão e a
interposição do recurso, um dos dias foi Corpus Christi, que é um feriado (ou
seja, dia não útil).
Assim, se a pessoa que está
conferindo a tempestividade não desconsiderar esse dia, achará que João perdeu
o prazo e que interpôs o REsp no 16º dia útil. No entanto, conforme expliquei,
um desses dias era feriado (Corpus Christi) e, dessa forma, esse dia tem que
ser excluído da contagem do prazo.
Repetindo: tirando sábados e
domingos, João interpôs o recurso no 16º dia. Ocorre que um desses dias foi
feriado de Corpus Christi. Logo, esse dia tem que ser excluído da contagem
(porque não é dia útil). Isso significa que João interpôs o recurso no 15º dia
útil e, portanto, o REsp é tempestivo.
O que aconteceu, no caso
concreto?
A Presidência do STJ entendeu que
o recurso especial seria intempestivo.
O problema foi justamente o feriado.
O Ministro afirmou que João não comprovou, de maneira
adequada, no momento de interposição, a ocorrência do feriado de Corpus Christi.
O Ministro utilizou, como fundamento, para a sua decisão, o art. 1.003, § 6º do
CPC, que diz:
Art. 1.003 (...)
§ 6º O recorrente comprovará a
ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso.
João não se conformou e interpôs
agravo interno invocando dois argumentos:
1º) Corpus Christi não é um
feriado local, mas sim nacional. O art. 1.003, § 6º somente exige a comprovação
dos feriados locais.
2º) mesmo assim, eu comprovei que
era feriado juntando cópia do calendário do Tribunal de Justiça (que está
disponível na internet) e no qual consta que no dia xx foi feriado de Corpus
Chirsti.
Os argumentos de João foram
acolhidos pelo STJ?
NÃO.
1º) Corpus Christi é
considerado feriado local
A Quarta-Feira de Cinzas, os dias que precedem a Sexta-Feira da
Paixão e o de Corpus Christi não são feriados forenses, previstos em lei
federal, para os tribunais de justiça estaduais, motivo pelo qual, caso essas datas
sejam feriados locais, deve ser colacionado o ato normativo local com essa
previsão, por meio de documento idôneo, no momento de interposição do recurso.
STJ. Corte Especial. AgInt nos EAREsp 1569432/RJ, Rel. Min. Luis
Felipe Salomão, julgado em 22/02/2022.
O dia do servidor público (28 de outubro), a segunda-feira de
carnaval, a quarta-feira de cinzas, os dias que precedem a sexta-feira da
paixão e, também, o dia de Corpus Christi não são feriados nacionais, em razão
de não haver previsão em lei federal. Logo, é dever da parte comprovar a suspensão
do expediente forense quando da interposição do recurso, por documento idôneo.
STJ. 4ª Turma. AgInt nos EDcl
no AREsp 1857694/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 11/04/2022.
2º) Cópia de calendário do
Tribunal de origem é documento idôneo para comprovar feriado local?
Para o STJ: NÃO
A cópia de calendário editado pelo tribunal de origem ou a
simples relação de feriados extraída da internet não são hábeis a ensejar a
comprovação da existência de feriado local, pois é necessária a juntada de
cópia de lei ou de ato administrativo exarado pela Corte local comprovando a
ausência de expediente forense na data em questão.
STJ. 3ª Turma. AgInt nos EDcl
no REsp 1.941.861/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/6/2022.
Obs: o STF possui um julgado
afirmando que sim.
O calendário disponível no sítio do Tribunal de Justiça que
mostra os feriados na localidade é documento idôneo para comprovar a ocorrência
de feriado local no ato de interposição do recurso, nos termos do art. 1.003, §
6º, do CPC/2015.
STF. 1ª Turma.
RMS 36114/AM, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 22/10/2019 (Info 957).
Em suma:
STJ.
4ª Turma. AREsp 1.779.552-GO, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 26/04/2022 (Info 735).