Dizer o Direito

quarta-feira, 8 de junho de 2022

Policiais podem fazer revista pessoal unicamente pelo fato de acharem que o suspeito demonstrou nervosismo ao avistá-los?

Imagine a seguinte situação hipotética:

Policiais militares estavam fazendo ronda em determinado bairro.

João, que estava na frente de um local conhecido por ser uma boca-de-fumo, ao avistar os policiais, demonstrou nervosismo.

Diante disso, os policiais realizaram revista pessoal em João e encontraram no bolso de sua bermuda 19 porções de “crack” (6,61g) embaladas individualmente.

João foi preso em flagrante e denunciado por tráfico de drogas.

A Defensoria Pública alegou a nulidade da apreensão e da prisão sob o argumento de que os policiais não possuíam qualquer fundamentação idônea e concreta para realizarem a abordagem e a busca pessoal.

Logo, a busca pessoal teria sido ilegal porque não havia “fundada suspeita” contra o réu.

 

O STJ acolheu a tese da defesa?

SIM. O art. 244 do Código de Processo Penal, ao tratar sobre a busca pessoa, afirma que:

Art. 244.  A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.

 

Desse modo, a execução da busca pessoal sem mandado, como medida autônoma, depende da presença de fundada suspeita da posse de objetos que constituam corpo de delito.

Como a lei exige fundada suspeita, não é suficiente “a mera conjectura ou desconfiança sobre tal posse”, sendo necessário que a suspeita esteja “amparada por circunstâncias objetivas que permitam uma grave probabilidade de que sejam encontradas as coisas mencionadas pela lei” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães; TORON, Alberto Zacharias; BADARÓ, Gustavo Henrique (org.) Código de processo penal comentado. 4ª ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2021).

 

No caso dos autos, a busca pessoal realizada pelos policiais foi justificada apenas com base no fato de que o acusado, que estava em local conhecido como ponto de venda drogas, ao avistar a viatura policial, demonstrou nervosismo. No entanto, a percepção de nervosismo por parte do agente policial - ainda que posteriormente confirmada pela apreensão de objetos ilícitos - é dotada de excesso de subjetivismo e, por isso, não é suficiente para caracterizar a fundada suspeita, que exige mais do que mera desconfiança por parte dos agentes públicos.

 

Em suma:

A percepção de nervosismo do averiguado por parte de agentes públicos é dotada de excesso de subjetivismo e, por isso, não é suficiente para caracterizar a fundada suspeita para fins de busca pessoal.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.961.459-SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 05/04/2022 (Info 732).

  

No mesmo sentido:

Na hipótese, não houve a indicação de nenhum dado concreto e objetivo sobre a existência de justa causa para autorizar a busca pessoal, visto que a simples existência de denúncia anônima sobre o deslocamento de pessoas para o local dos fatos no intuito de exercerem a venda de drogas, bem como o fato de que o suspeito aparentava suposto nervosismo diante da aproximação dos policias (parâmetro subjetivo dos agentes policiais), não constituem fundamento idôneo para autorizar a busca pessoal, o que impõe o reconhecimento da ilicitude da prova obtida com a medida invasiva, bem como das provas dela derivadas.

STJ. 5ª Turma. AgRg no AgRg no HC n. 706.522/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 22/2/2022.

 

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