Imagine a seguinte situação
hipotética:
João ajuizou ação contra Pedro e
Paulo.
O juiz julgou o pedido
procedente.
Os réus, com advogados de
escritórios diferentes, interpuseram apelação.
O TJ negou provimento às
apelações.
Pedro foi intimado do acórdão do
TJ em 16/2/2018.
Vale ressaltar que o sistema
eletrônico do TJ efetuou a intimação e calculou o prazo de 30 dias úteis (art.
229 do CPC) para a interposição de recurso, fixando a data final para 4/4/2018.
Pedro interpôs o recurso neste
exato dia (04/04/2018).
Ocorre que essa informação estava
errada. O termo final do prazo era dia 02/04/2018. Isso significa que Pedro,
induzido em erro pelo sistema eletrônico do TJ, interpôs o recurso especial
intempestivamente.
Diante dessa peculiaridade, é possível considerar que
o recurso foi tempestivo?
SIM.
Se houve um erro do sistema eletrônico do Tribunal na
indicação do término do prazo recursal e, em razão disso, a parte interpôs o
recurso intempestivamente, essa circunstância pode ser utilizada como justa
causa para prorrogação do prazo, aplicando-se a regra prevista no art. 223 do
CPC/2015:
Art. 223. Decorrido o prazo,
extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato processual,
independentemente de declaração judicial, ficando assegurado, porém, à parte
provar que não o realizou por justa causa.
§ 1º Considera-se justa causa o evento
alheio à vontade da parte e que a impediu de praticar o ato por si ou por
mandatário.
§ 2º Verificada a justa causa, o juiz
permitirá à parte a prática do ato no prazo que lhe assinar.
Embora seja ônus do advogado a
prática dos atos processuais segundo as formas e prazos previstos em lei, o CPC
abre a possibilidade de a parte indicar motivo justo para o seu eventual
descumprimento, a fim de mitigar a exigência.
Considerando o avanço das
ferramentas tecnológicas e a larga utilização da internet para divulgação de
dados processuais, eventuais falhas do próprio Poder Judiciário na prestação
dessas informações não podem prejudicar as partes.
Dessa forma, a falha induzida por
informação equivocada prestada por sistema eletrônico de tribunal deve ser
levada em consideração, em homenagem aos princípios da boa-fé e da confiança,
para a aferição da tempestividade do recurso.
Ainda que os dados
disponibilizados pela internet sejam “meramente informativos” e não substituam
a publicação oficial (fundamento dos precedentes em contrário), isso não impede
que se reconheça ter havido justa causa no descumprimento do prazo recursal
pelo litigante, induzido por erro cometido pelo próprio Tribunal.
Em suma:
O erro do sistema eletrônico do Tribunal de origem na
indicação do término do prazo recursal é apto a configurar justa causa para
afastar a intempestividade do recurso.
STJ. Corte
Especial. EAREsp 1.759.860-PI, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 16/03/2022
(Info 730).
Em reforço ao que foi exposto acima, vale a pena lembrar a
regra do art. 197 do CPC:
Art. 197. Os tribunais divulgarão as
informações constantes de seu sistema de automação em página própria na rede
mundial de computadores, gozando a divulgação de presunção de veracidade e
confiabilidade.
Parágrafo único. Nos casos de problema
técnico do sistema e de erro ou omissão do auxiliar da justiça responsável pelo
registro dos andamentos, poderá ser configurada a justa causa prevista no art.
223, caput e § 1º.